Revista nº 5 - Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
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Página42 Diogo Duarte Campos | Pedro Melo<br />
R E V I S T A D E D I R E I T O P Ú B L I C O E R E G U L A Ç Ã O<br />
Ou seja, apenas quando a fuga para o direito privado 34 tenha por fim um intuito fraudu-<br />
lento, isto é, apenas quando exista um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro abuso <strong>da</strong> forma jurídico-priva<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
actuação <strong>da</strong> administração é que o Tribunal <strong>de</strong> Contas tem competência para aferir os<br />
actos e contratos <strong>da</strong> enti<strong>da</strong><strong>de</strong> em causa.<br />
No caso concreto, parece-nos particularmente difícil sugerir sequer que tenha havido na<br />
transformação <strong>da</strong> EP (aliás, já anteriormente EPE) um qualquer intuito fraudulento<br />
materializado na “subtracção <strong>de</strong> actos e contratos à fiscalização prévia do Tribunal <strong>de</strong><br />
Contas”. A sua transformação insere-se, antes, no reor<strong>de</strong>namento do sector rodoviário<br />
nacional, tendo em vista a sua sustentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> financeira e até eventual abertura a<br />
capitais privados 35 .<br />
A reforma em causa culminou na <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> concessionar to<strong>da</strong> a re<strong>de</strong> rodoviária a uma<br />
enti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> cariz empresarial, a qual terá o po<strong>de</strong>r / <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> gerir to<strong>da</strong> a referi<strong>da</strong> re<strong>de</strong>.<br />
Ora, a referi<strong>da</strong> <strong>de</strong>cisão concessória que implicou ajustes em vários contratos <strong>de</strong> conces-<br />
são e a criação <strong>de</strong> uma nova enti<strong>da</strong><strong>de</strong> reguladora - o Instituto <strong>de</strong> Infra-estruturas Rodo-<br />
viárias, IP – po<strong>de</strong>rá, obviamente, ser discutível do ponto <strong>de</strong> vista político, mas do ponto<br />
<strong>de</strong> vista jurídico não é mais do que uma opção totalmente legítima do legislador, aliás,<br />
<strong>de</strong> longo prazo.<br />
Nestes termos, não há, neste caso concreto, o mínimo indício <strong>de</strong> qualquer abuso <strong>da</strong>s<br />
formas jurídicas-priva<strong>da</strong>s e, muito menos, <strong>de</strong> qualquer activi<strong>da</strong><strong>de</strong> fraudulenta.<br />
4. A Aplicação <strong>da</strong> Teoria <strong>da</strong> Imprevisão à fase pré-contratual<br />
Seguindo o mo<strong>de</strong>lo, já tradicional entre nós na adjudicação <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong> concessão<br />
<strong>de</strong> obras públicas, em todos os procedimentos relativos aos cinco contratos <strong>de</strong> subcon-<br />
cessão referidos previa-se um concurso dividido em duas fases: num primeiro momento<br />
todos os concorrentes po<strong>de</strong>riam apresentar proposta e, num segundo momento, seriam<br />
enceta<strong>da</strong>s negociações com os dois concorrentes mais bem classificados, os quais, a<br />
final, <strong>de</strong>veriam apresentar uma nova proposta, a <strong>de</strong>nomina<strong>da</strong> BAFO (“Best and Final<br />
Offer”).<br />
Embora com algumas diferenças temporais, po<strong>de</strong>-se dizer que as primeiras propostas<br />
em todos os concursos foram apresenta<strong>da</strong>s em momento anterior à crise económica <strong>de</strong><br />
2008/2009, tendo as respectivas propostas BAFO sido apresenta<strong>da</strong>s em plena crise pelo<br />
34 Detalha<strong>da</strong>mente estu<strong>da</strong><strong>da</strong>, entre nós, por MARIA JOÃO ESTORNINHO, “A Fuga para o <strong>Direito</strong> Privado”,<br />
Almedina, <strong>Coimbra</strong>, 1999, em especial, pp. 79 e 80.<br />
35 Cfr. o preâmbulo do DL n.º 380/2007, <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> Novembro.