Do amanhecer ao pr-do-sol - Igreja Metodista de Vila Isabel
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mostrou a verda<strong>de</strong>. O ar<strong>do</strong>roso comerciante, a fim <strong>de</strong><br />
manter-se e à sua gente, <strong>pr</strong>ecisou abrir um escritório<br />
imobiliário para ven<strong>de</strong>r terras em regiões novas <strong>do</strong><br />
esta<strong>do</strong>.<br />
Fomos para Lins, mas os nossos <strong>pr</strong>oblemas<br />
continuaram, embora sob outros matizes. Por exemplo,<br />
nossa nova condição social revelou-se constrange<strong>do</strong>ra<br />
logo no início. Estávamos pobres e necessitávamos viver<br />
mo<strong>de</strong>stamente on<strong>de</strong> até há pouco <strong>de</strong>sfrutáramos <strong>de</strong><br />
posição invejável. Para começar, alugamos um casebre<br />
<strong>de</strong> chão bati<strong>do</strong> no quintal <strong>do</strong> sr. José Lopes, nosso velho<br />
amigo, a fim <strong>de</strong> gozarmos maior liberda<strong>de</strong> e dá-la<br />
também à família <strong>do</strong> tio Júlio, que nos acolhera<br />
bon<strong>do</strong>samente.<br />
Entrementes, minha mãe e minha avó combinaram<br />
lavar as roupas <strong>de</strong> hóspe<strong>de</strong>s da pensão Lusitana,<br />
pertencente <strong>ao</strong> sr. Manoel Valgran<strong>de</strong>, situada à rua<br />
Campos Sales, <strong>de</strong>fronte <strong>ao</strong> Colégio Americano. Eu ia<br />
buscar as roupas na segunda-feira e as <strong>de</strong>volvia antes <strong>do</strong><br />
sába<strong>do</strong>.<br />
Quanto à nossa pobreza, é testemunha o meio litro <strong>de</strong><br />
leite que com<strong>pr</strong>ávamos às vezes, além <strong>do</strong> insignificante<br />
pãozinho adquiri<strong>do</strong> na fábrica <strong>pr</strong>óxima. Usávamos a<br />
roupa <strong>do</strong> corpo enquanto limpa, porquanto uma das duas<br />
mulheres lhes ministrava a lavagem, durante a noite, e<br />
assim sucessivamente, dia após dia até se tornarem<br />
ina<strong>pr</strong>oveitadas. Não <strong>de</strong>sejávamos causar espécie a quem<br />
quer que fosse, nem ser envergonha<strong>do</strong>s. Nisto, minha<br />
mãe era bastante exigente.<br />
Também não podíamos pagar os serviços <strong>do</strong> alfaiate<br />
ou da costureira, incumbin<strong>do</strong>-se minha mãe <strong>de</strong>ssa tarefa.<br />
Ela dava jeito no vestuário da família remendan<strong>do</strong> ou<br />
costuran<strong>do</strong> as peças e copian<strong>do</strong> as novas pelas velhas.<br />
Po<strong>de</strong>mos aplicar-lhe as ex<strong>pr</strong>essões <strong>do</strong> livro <strong>de</strong><br />
Provérbios quan<strong>do</strong> se refere à mulher que não teme o<br />
inverno porque, à noite, conserva acesa a sua luz,<br />
cuidan<strong>do</strong> <strong>do</strong>s agasalhos <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s <strong>ao</strong>s familiares. “E<br />
não temerá, por causa da neve, porque toda sua casa<br />
anda forrada <strong>de</strong> roupa <strong>do</strong>brada. A força e a glória são os<br />
seus vesti<strong>do</strong>s, e ri-se <strong>do</strong> dia futuro” (Pv 31. 21-25).<br />
Face a tais contingências, eu e Manoel fomos<br />
obriga<strong>do</strong>s a <strong>pr</strong>ocurar em<strong>pr</strong>ego. Sabe<strong>do</strong>r <strong>de</strong> nossas<br />
dificulda<strong>de</strong>s <strong>do</strong>mésticas, meu <strong>pr</strong>imo Augusto, resi<strong>de</strong>nte<br />
em Promissão, chamou-me para trabalhar na Farmácia<br />
Central, <strong>do</strong>s senhores Hoepner e Silveira. Sua mulher,<br />
Patrocínia, responsabilizaria-se pela lavagem <strong>de</strong> minhas<br />
roupas. Eu teria que fazer a limpeza da botica, lavar<br />
vidros, ajudar no <strong>pr</strong>eparo <strong>de</strong> certos medicamentos,<br />
especialmente xaropes, além <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r no transcurso<br />
da noite a quem viesse à <strong>pr</strong>ocura <strong>de</strong> algum remédio.<br />
Havia muitos fregueses japoneses, <strong>de</strong> sorte que me<br />
interessei pela linguagem que falavam e assim a<strong>pr</strong>endi<br />
palavras <strong>do</strong> vocabulário nipônico. Ao fim <strong>de</strong> algum tempo,<br />
enjoei daquela ativida<strong>de</strong> por reter-me <strong>pr</strong>eso dia e noite,<br />
inclusive <strong>ao</strong>s <strong>do</strong>mingos. Como a<strong>do</strong>lescente, eu <strong>de</strong>sejava<br />
ir <strong>ao</strong> cinema, pelo menos naquele dia; porém quan<strong>do</strong><br />
chegava a hora, o patrão se recusava a confirmar a<br />
licença.<br />
Re<strong>sol</strong>vi, por conseguinte, abalar-me para a minha<br />
querida Albuquerque Lins e <strong>pr</strong>ocurar nova ocupação. Fui,<br />
então, encaminha<strong>do</strong> <strong>ao</strong> Clube <strong>do</strong> Parti<strong>do</strong> Republicano,<br />
localiza<strong>do</strong> à avenida Sete <strong>de</strong> Setembro, na altura da atual<br />
Casa <strong>do</strong>s Três Macha<strong>do</strong>s. O horário <strong>de</strong> trabalho<br />
estendia-se das 12 às 21 horas, portanto, sem me<br />
permitir voltar <strong>ao</strong>s estu<strong>do</strong>s. Isso acontecia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que eu<br />
saíra <strong>de</strong> Portugal. Tinha por obrigação agora, além das