chama-nos da selva O cinema de Apichatpong Weerasethakul
chama-nos da selva O cinema de Apichatpong Weerasethakul
chama-nos da selva O cinema de Apichatpong Weerasethakul
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
“O Vício em Lisboa” é “estabelecer<br />
que tipo <strong>de</strong> prostituição exist[ia]”.<br />
Po<strong>de</strong>mos ficar a saber que “as prostitutas<br />
eram matricula<strong>da</strong>s, iam à inspecção<br />
sanitária”, etc.<br />
Na altura, recor<strong>da</strong> o professor, havia<br />
“muita literatura proto-científica<br />
sobre isto”, o que tem <strong>de</strong> ser enquadrado<br />
à luz <strong>da</strong> época: “É preciso não<br />
esquecer que D. Luís morreu <strong>de</strong> sífilis,<br />
D. Manuel também sofreu <strong>da</strong> doença,<br />
etc”.<br />
É também por esta época (meio do<br />
século XIX), lembra, que “começam<br />
a aparecer livros sobre a homossexuali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
(masculina ou feminina), a<br />
masturbação”, entre outros assuntos<br />
prementes. Como é visível nas duas<br />
obras mais narrativas que iniciam a<br />
colecção, estes temas no final do século<br />
XIX já an<strong>da</strong>vam na boca <strong>de</strong> to<strong>da</strong><br />
a gente.<br />
O “Vício” é o único dos três livros<br />
que, à época, era legal. Grosso modo<br />
as edições pornográficas eram clan<strong>de</strong>stinas<br />
– citando Ventura, “a pornografia<br />
não era proibi<strong>da</strong>, mas não era<br />
aceite”. (Esta é uma <strong>da</strong>s razões para<br />
as edições serem anónimas.)<br />
Ao historiador não restam dúvi<strong>da</strong>s<br />
que a pornografia “era muito vendi<strong>da</strong>:<br />
“Havia literalmente <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />
edições. Em França havia edições<br />
impressas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o século XVI. Em<br />
Portugal só começaram no século<br />
XVIII [as impressas]”. Ventura, escusando<br />
a fazer afirmações <strong>de</strong> carácter<br />
científico, arrisca dizer “que se publicava<br />
tanto <strong>de</strong>stes livros como <strong>de</strong><br />
qualquer outra edição comum”, sendo<br />
a maior parte <strong>de</strong>les era traduzi<strong>da</strong>,<br />
em particular do francês.<br />
Envolvi<strong>da</strong> no circuito comercial <strong>da</strong><br />
literatura pornográfica estava “uma<br />
classe média alta, que lia e fazia as<br />
traduções”. Nem po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong> outra<br />
forma, tendo em conta que na época<br />
havia 90 por cento <strong>de</strong> analfabetos e<br />
que estes livros não estavam nas bibliotecas.<br />
Pelo que os leitores <strong>de</strong>stes<br />
livros seriam os mesmos dos outros.<br />
Este <strong>da</strong>do é verificável quando<br />
atentamos <strong>nos</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros autores<br />
dos livros: “Entre Lençóis” sai <strong>da</strong> pena<br />
<strong>de</strong> Cândido <strong>de</strong> Figueiredo, filólogo<br />
<strong>de</strong> renome, autor do “Novo Dicionário<br />
<strong>da</strong> Língua Portuguesa”, fun<strong>da</strong>dor<br />
<strong>da</strong> Socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Geografia <strong>de</strong> Lisboa<br />
e sócio <strong>da</strong> Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras.<br />
No caso do “Pauzinho” os <strong>de</strong>senhos<br />
pertencem a Rafael Bor<strong>da</strong>lo Pinheiro<br />
embora não se saiba a quem<br />
pertencem os textos.<br />
Há outros exemplos <strong>de</strong> ilustres que<br />
se <strong>de</strong>dicaram à escrita procriativa,<br />
como Alfredo Gallis, o autor mais prolífero<br />
<strong>da</strong> época: em termos literários<br />
“não faz parte do cânone” e a sua<br />
obra – <strong>da</strong> qual não consta “um único<br />
palavrão” – foi “proposita<strong>da</strong>mente”<br />
esqueci<strong>da</strong>.<br />
Gallis, autor <strong>de</strong> títulos como “O<br />
Marido Virgem” ou “As Doze Mulheres<br />
<strong>de</strong> Adão”, era funcionário público,<br />
administrador do Concelho do<br />
Barreiro, “um indivíduo conhecido<br />
na época”: “É uma figura extraordinária,<br />
que escreveu um ciclo <strong>de</strong> romances<br />
– doze ou treze, pelo me<strong>nos</strong><br />
– com o título ‘Tuberculose Social’,<br />
em que abor<strong>da</strong>va temas como a prostituição,<br />
o jogo, etc”. É o autor <strong>de</strong> “O<br />
Sr Ganime<strong>de</strong>s”, “o primeiro livro sobre<br />
a homossexuali<strong>da</strong><strong>de</strong> feminina”.<br />
“Só ele merecia uma tese”, diz Ventura,<br />
em tom taxativo.<br />
Não se <strong>de</strong>ve partir do princípio que<br />
o dinheiro era o motor <strong>da</strong> activi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
pornógrafa – Ventura está “convencido<br />
que havia quem fizesse as traduções,<br />
a escrita e a edição por puro<br />
divertimento”, e dá o exemplo <strong>de</strong><br />
Cândido <strong>de</strong> Figueiredo: “Ele não precisava<br />
<strong>de</strong> dinheiro. O que escreveu<br />
servia-lhe como um alter-ego; era um<br />
<strong>de</strong>sdobramento e um divertimento”.<br />
Pós-liminares: o facto <strong>de</strong> serem edições<br />
<strong>de</strong> quali<strong>da</strong><strong>de</strong>, com procura, por<br />
vezes bem escritas e explícitas <strong>de</strong>monstra<br />
que o povo que lia isto era<br />
<strong>de</strong>safogado financeiramente e “liberto”;<br />
a pornografia era varia<strong>da</strong>, tanto<br />
havendo “folhetos com 20 páginas<br />
que se vê que foram feitos para obter<br />
um impacto imediato” como “literatura<br />
com 300 páginas”; o filão existiu<br />
“em paralelo ao <strong>da</strong> literatura oficial”<br />
mas foi sempre “<strong>de</strong>libera<strong>da</strong>mente”<br />
ignorado.<br />
O término <strong>de</strong>sta micro-história <strong>da</strong><br />
pornografia é quase caricatural: não<br />
sabemos mais por que “quando um<br />
coleccionador morria a sua família<br />
queimava este tipo <strong>de</strong> coisas”. Pelo<br />
que, diz Ventura, “só conhecemos a<br />
ponta do iceberg”. Fruamos a ponta,<br />
por tanto.<br />
Diz António Ventura,<br />
organizador <strong>da</strong> colecção, que<br />
envolvi<strong>da</strong> no circuito comercial<br />
<strong>da</strong> literatura pornográfica<br />
estava “uma classe média alta,<br />
que lia e fazia as traduções”<br />
SÃO LUIZ TEATRO MUNICIPAL<br />
RUA ANTÓNIO MARIA CARDOSO, 38; 1200-027 LISBOA<br />
GERAL@TEATROSAOLUIZ.PT; TEL: 213 257 640<br />
SÃO<br />
LUIZ<br />
ABR~11<br />
BILHETES À VENDA EM WWW.TEATROSAOLUIZ.PT,<br />
WWW.BILHETEIRAONLINE.PT E ADERENTES<br />
BILHETEIRA DAS 13H00 ÀS 20H00<br />
TEL: 213 257 650 / BILHETEIRA@TEATROSAOLUIZ.PT<br />
14 A 17 ABR<br />
QUINTA A SÁBADO ÀS 21H00<br />
DOMINGO ÀS 17H30<br />
SALA PRINCIPAL M/6<br />
TEXTO<br />
JOÃO MONGE<br />
MÚSICA<br />
ALFREDO MARCENEIRO<br />
MÚSICA INCIDENTAL, ARRANJOS<br />
E DIRECÇÃO MUSICAL<br />
JOSÉ PEIXOTO<br />
ENCENAÇÃO<br />
MARIA JOÃO LUÍS<br />
INTERPRETAÇÃO<br />
MANUELA AZEVEDO<br />
MARIA JOÃO LUÍS<br />
www.teatrosaoluiz.pt<br />
CO-PRODUÇÃO<br />
estrutura apoia<strong>da</strong> por<br />
APOIO À DIVULGAÇÃO<br />
to<strong>da</strong><br />
Ípsilon • Sexta-feira 1 Abril 2011 • 17