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chama-nos da selva O cinema de Apichatpong Weerasethakul

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inventivo que <strong>nos</strong> ren<strong>de</strong>mos a Mica<br />

Levi, a mentora do trio, mulher que é<br />

guitarrista punk e produtora hip hop<br />

e compositora vanguardista e, tudo<br />

reunido, autora <strong>de</strong> canções que,<br />

como poucas outras, absorvem e<br />

reflectem, com i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> vinca<strong>da</strong>, o<br />

pulsar contemporâneo.<br />

“Chopped & Screwed”, tal como as<br />

mixtapes que Mica Levi vai<br />

disponibilizando online, é mais um<br />

capítulo na construção <strong>de</strong> um corpo<br />

<strong>de</strong> obra multifacetado. Nasceu <strong>de</strong> um<br />

convite <strong>da</strong> London Sinfonietta para a<br />

apresentação <strong>de</strong> um trabalho<br />

conjunto. A primeira apresentação<br />

aconteceu em Maio <strong>de</strong> 2010 e<br />

“Chopped & Screwed” é o registo<br />

<strong>de</strong>sse concerto.<br />

Micachu e os Shapes, armados <strong>de</strong><br />

instrumentos inventados, como a<br />

espécie <strong>de</strong> sanfona em contraplacado<br />

cria<strong>da</strong> por Mica Levi, e a Sinfonietta,<br />

fugindo <strong>de</strong> lugares confortáveis,<br />

entregue a pizzicatos <strong>de</strong>moníacos e<br />

arrufos <strong>de</strong> atonali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Nove canções<br />

em cerca <strong>de</strong> meia hora, sem espaço<br />

para a bizarra e contagiante euforia<br />

<strong>de</strong> “Jewellery”. Música nocturna,<br />

tétrica a espaços, que sobrevive mais<br />

pela coerência e sentido <strong>de</strong> dinâmica<br />

do ambiente criado que pelas<br />

canções elas mesmas. Em “Unlucky”,<br />

parece-<strong>nos</strong> que os Looney Tunes<br />

musicados por Carl Stalling<br />

emergem, perversos, <strong>de</strong> uma<br />

qualquer cave on<strong>de</strong> os fecharam há<br />

déca<strong>da</strong>s. Em “Everything” a mancha<br />

sonora cria<strong>da</strong> evoca o prazer<br />

<strong>da</strong>nçante que <strong>de</strong>scobrimos em<br />

“Jewellery”. E há essa magnífica<br />

cenografia que é “Low dogg”, com as<br />

cor<strong>da</strong>s silvando, com os violoncelos<br />

em marcha psicótica e um órgão<br />

divagando, tentando atenuar a tensão<br />

que a letra não resolve: “every<strong>da</strong>y’s<br />

the same / stays the same”.<br />

“Chopped & Screwed” não causa<br />

espanto. A espaços soa algo insular,<br />

distante. Mas recompensa.<br />

Recompensa porque algo como a<br />

cita<strong>da</strong> “Low dogg” vale to<strong>da</strong> a viagem<br />

e, porque, mesmo no contexto muito<br />

específico <strong>da</strong> gravação com a<br />

Sinfonietta, Mica Levi revela-se,<br />

novamente, uma <strong>da</strong>s mentes mais<br />

interessantes <strong>da</strong> música popular<br />

urbana dos <strong>nos</strong>sos dias. M.L.<br />

Iron & Wine<br />

Kiss Each Other Clean<br />

Warner; distri. Coop<br />

mmmmn<br />

É extraordinária a<br />

entra<strong>da</strong> <strong>de</strong> “Kiss<br />

Each Other Clean”:<br />

“Walking far from<br />

home” não só está<br />

prenhe <strong>de</strong><br />

simbologia epifânica como emula as<br />

ascensões características <strong>da</strong> música<br />

religiosa. É uma simples linha<br />

melódica circular, à qual vão sendo<br />

adicionados coros, pia<strong>nos</strong>, órgãos,<br />

tarolas com <strong>de</strong>lay, efeitos <strong>de</strong> guitarra,<br />

um sem número <strong>de</strong> elementos que<br />

O melhor disco <strong>de</strong> Sam<br />

Beam e se não for dos<br />

melhores que 2011 vai<br />

conhecer será certamente<br />

dos mais belos<br />

vão engran<strong>de</strong>cendo a canção até que<br />

esta – que ao início era um simples<br />

lalala a zumbir no ouvido – enche as<br />

veias, inun<strong>da</strong> os pulmões e instala<br />

aqui que há tanto <strong>nos</strong> falta e é quase<br />

feio sentir: fé. Não obrigatoriamente<br />

no Senhor que Beam nomeia, mas<br />

em qualquer coisa. Dizer que a<br />

fasquia <strong>de</strong>sce com “Me and Lazarus”<br />

é <strong>de</strong>magogia: construí<strong>da</strong> em redor <strong>de</strong><br />

uma bela linha <strong>de</strong> baixo, e com<br />

metais e zunir <strong>de</strong> guitarra acústica<br />

pelo meio, seria excelente acen<strong>da</strong>lha<br />

para começar a ignição do disco não<br />

fora este abrir logo em estado <strong>de</strong><br />

incêndio. E porque não consta que<br />

uma gran<strong>de</strong> abertura tenha <strong>de</strong> se ater<br />

a um mero par <strong>de</strong> canções, segue-se<br />

“Tree by the river”, gospel ligeiro<br />

com xilofones, pan<strong>de</strong>iretas, a-has,<br />

que <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>riva no refrão para uma<br />

folk rica, antes <strong>de</strong> uma figura <strong>de</strong><br />

guitarra eléctrica se juntar ao coro<br />

num momento <strong>de</strong> mãos-ao-alto-istoé-um-colosso-<strong>de</strong>-canção.<br />

Daqui para<br />

o fim há <strong>de</strong> tudo para todos os gostos:<br />

canções finca<strong>da</strong>s em linhas <strong>de</strong> baixo<br />

sombrias, wurlitzers a <strong>de</strong>bitar<br />

groove, folk sinfónica her<strong>de</strong>ira <strong>da</strong><br />

(enorme) Ju<strong>de</strong>e Sill (notório na<br />

<strong>de</strong>sci<strong>da</strong> antes do refrão <strong>de</strong> “Brother<br />

in love”, com o seu registo <strong>de</strong> quem<br />

prefere tropeçar a olhar para os céus<br />

que caminhar recto a tactear o chão),<br />

flautas e muitos coros, brinca<strong>de</strong>iras<br />

ao xilofone vagamente in<strong>de</strong>scritíveis<br />

e até algo <strong>de</strong> jazzístico e <strong>de</strong><br />

psicadélico. Mais que tudo, um elogio<br />

<strong>da</strong> melodia enquanto estrutura que<br />

suporta tudo. O melhor disco <strong>de</strong> Sam<br />

Beam e se não for dos melhores que<br />

2011 vai conhecer será certamente<br />

dos mais belos. João Bonifácio<br />

Munch Munch<br />

Double Visions<br />

Upset The Rhythm; distri. Flur<br />

mmmmn<br />

Quando o álbum<br />

começa, ouve-se um<br />

vibrafone, um piano<br />

e vozes subindo ao<br />

agudo <strong>da</strong> escala.<br />

Tudo muito<br />

oceânico, muito sereno. Isso, porém,<br />

são apenas os primeiros dois<br />

minutos. Porque os Munch Munch,<br />

eles que dizem procurar na música o<br />

“escapismo”, a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />

sonho, portanto, revelam-se <strong>de</strong>pois<br />

disso. Depois, ouvem-se teclados<br />

fervilhantes em turbilhão e vozes que<br />

são guia por viagem alucina<strong>da</strong> espaço<br />

fora. Vozes que têm o tom grave <strong>de</strong><br />

conto <strong>de</strong> terror ou que são grito <strong>de</strong><br />

ritualista urbano que ouviu Wyatt e<br />

os Grizzly Bear e os Animal Collective<br />

e os Floyd. Música que preten<strong>de</strong><br />

<strong>da</strong>nçar como ban<strong>da</strong> rock e explorar<br />

como pesquisador sonoro: por isso<br />

rugem tarolas sobre visões<br />

quimicamente altera<strong>da</strong>s dos tempos<br />

<strong>de</strong> Madchester e dos Inspiral Carpets.<br />

Por isso, ouvimo-los numa canção<br />

como “Autumn mask”, saltitando<br />

sobre o arpeggio <strong>da</strong>s teclas, e<br />

<strong>de</strong>scobrimos que <strong>nos</strong> surpreen<strong>de</strong>m<br />

<strong>da</strong> melhor forma possível –<br />

sonhadores fervorosos, ocupados a<br />

<strong>de</strong>smontar e remontar pe<strong>da</strong>ços <strong>de</strong><br />

canções com um entusiasmo<br />

contagiante. “Wolfman’s wife” é<br />

terror <strong>de</strong> conto popular<br />

transformado em filme sci-fi, “Bold<br />

man of the sea” começa planando em<br />

sintetizadores, muito Floydiana,<br />

antes <strong>de</strong> explodir em percussão<br />

irrequieta e vozes em falsete – não<br />

sabemos para on<strong>de</strong> <strong>nos</strong> levam, mas<br />

<strong>da</strong>nçamos com eles - e “Night corner”<br />

é a actualização Soft Machine que os<br />

Klaxons (com quem os Munch Munch<br />

são por vezes comparados) não<br />

querem ou não conseguiram ser. Um<br />

primeiro disco tão frenético quanto<br />

promissor que <strong>nos</strong> <strong>de</strong>ixa a sensação<br />

que o futuro dos Munch Munch será<br />

ain<strong>da</strong> melhor. Assim continuem<br />

explorando, viajando, com o mesmo<br />

fervor que ouvimos em “Double<br />

Visions”. M.L.<br />

Munch Munch: continuem explorando...<br />

Ípsilon • Sexta-feira 1 Abril 2011 • 39

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