13.03.2015 Views

chama-nos da selva O cinema de Apichatpong Weerasethakul

chama-nos da selva O cinema de Apichatpong Weerasethakul

chama-nos da selva O cinema de Apichatpong Weerasethakul

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

A golpa<strong>da</strong><br />

(só que meio sem querer)<br />

Os Golpes fizeram um disco só para os fãs, “G”, mas o sucesso <strong>de</strong> “Vá lá senhora” não permitiu<br />

que o exclusivo se mantivesse. Em tempo <strong>de</strong> protestos populares, a reivindicação <strong>de</strong>u frutos:<br />

“G” chega segun<strong>da</strong>-feira às lojas. Gonçalo Frota<br />

24 • Sexta-feira 1 Abril 2011 • Ípsilon<br />

“Vá lá senhora” ampliou<br />

<strong>de</strong>scomunalmente o auditório<br />

d’Os Golpes, que agora são<br />

reconhecidos pelo senhor<br />

<strong>da</strong> pastelaria e pela senhora<br />

do cabeleireiro<br />

“Durante a déca<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> 90 e parte <strong>de</strong>sta<br />

última, houve<br />

o <strong>de</strong>slumbramento<br />

provinciano <strong>de</strong> querer<br />

fazer músicas para se<br />

ouvir em Piccadilly ou<br />

em Nova Iorque; o que<br />

tem expressão é fazer<br />

uma canção para<br />

o vizinho do lado”<br />

Manuel Fúria<br />

Quando se provoca a História, ela<br />

provoca <strong>de</strong> volta. Há uns a<strong>nos</strong>, Os<br />

Golpes surgiram evocando todo um<br />

imaginário que, noutros tempos, causou<br />

problemas aos Heróis do Mar:<br />

uma iconografia forte, patriótica, que<br />

<strong>de</strong>ixou a ban<strong>da</strong> <strong>de</strong> Pedro Ayres Magalhães<br />

e Rui Pregal <strong>da</strong> Cunha <strong>de</strong>baixo<br />

<strong>de</strong> um fogo cerrado <strong>de</strong> acusações<br />

<strong>de</strong> fascismo. Os Golpes escaparam a<br />

esta cobrança pós-25 <strong>de</strong> Abril. Mas a<br />

recuperação dos símbolos nacionais<br />

– o vocalista Manuel Fúria diz querer<br />

matar a vergonha que lhes está associa<strong>da</strong><br />

–, as far<strong>da</strong>s, as músicas com o<br />

apelo à festa e à <strong>da</strong>nça lembram inevitavelmente<br />

o que os Heróis do Mar<br />

an<strong>da</strong>ram a anunciar há 30 a<strong>nos</strong>.<br />

Tal como os Heróis, há outra vergonha<br />

que Os Golpes querem matar,<br />

a <strong>da</strong> pop nacional. Na ressaca <strong>da</strong> Revolução<br />

dos Cravos e com o canto <strong>de</strong><br />

intervenção esgotado na sua função,<br />

vieram punks, new waves, hard-rocks,<br />

pops electrónicas, importou-se<br />

<strong>de</strong> tudo sofregamente, na ânsia <strong>de</strong><br />

fazer igual ao que se via e ouvia lá<br />

fora, com medo do que o país “escondia”.<br />

Fúria diag<strong>nos</strong>tica: “Durante a<br />

déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 90 e parte <strong>de</strong>sta última,<br />

houve o <strong>de</strong>slumbramento provinciano<br />

<strong>de</strong> querer fazer músicas para se<br />

ouvir em Piccadilly ou em Nova Iorque;<br />

o que tem expressão é fazer uma<br />

canção para o vizinho do lado”.<br />

Os Golpes foram atrás e não olharam<br />

apenas para o lado. E foi nessa<br />

altura que a História lhes enviou um<br />

recado, lembrando que sempre se<br />

repete. Se os Heróis do Mar alcançaram<br />

os seus maiores êxitos com os<br />

maxi-singles <strong>de</strong> “Paixão” e “Amor”,<br />

com Os Golpes não po<strong>de</strong>ria ser diferente.<br />

“Nós trazemos a intenção <strong>de</strong> animar<br />

as pessoas: oferecemos a <strong>nos</strong>sa<br />

alma na música, na festa e no espectáculo<br />

que <strong>da</strong>mos, e achamos que<br />

vimos trazer muita vi<strong>da</strong>, mas também<br />

anunciamos uma espécie <strong>de</strong> morte:<br />

a <strong>da</strong> vergonha”, sentencia Manuel<br />

Fúria. A morte <strong>de</strong>ssa vergonha levou<br />

precisamente a que Os Golpes, comparados<br />

fatalmente com os Heróis<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que “Cruz Vermelha Sobre<br />

Fundo Branco” foi lançado em 2009,<br />

<strong>chama</strong>ssem <strong>de</strong>savergonha<strong>da</strong>mente<br />

Rui Pregal <strong>da</strong> Cunha para se lhes juntar<br />

em “Vá lá senhora”. Evitar essa<br />

colaboração e a versão <strong>de</strong> “Paixão”<br />

em “G”, diz o guitarrista Pedro <strong>da</strong><br />

Rosa, equivaleria a trair a ver<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

mais elementar d’Os Golpes. “Em vez<br />

<strong>de</strong> renegarmos as coisas boas do passado,<br />

é mais fácil <strong>de</strong>ixar que tudo<br />

aconteça naturalmente. E é-<strong>nos</strong> natural<br />

tocar o ‘Paixão’. To<strong>da</strong> a gente<br />

sente que é uma influência que temos<br />

<strong>de</strong> abraçar”.<br />

E foi assim que “G”, gravado para<br />

oferecer aos fãs num par <strong>de</strong> concertos,<br />

se viu aumentado com a versão<br />

<strong>de</strong> “Paixão” (dos Heróis do Mar) e um<br />

original. A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> tocar “Paixão”<br />

surgiu apenas porque, na preparação<br />

dos concertos, conta Luís dos Golpes<br />

(dos bigo<strong>de</strong>s), a ban<strong>da</strong> não quis “<strong>de</strong>sperdiçar<br />

um monstro dos palcos [Rui<br />

Pregal] só com uma música”. E o original,<br />

“A Brasileira”, não é mais do<br />

que o instrumental com que abriam<br />

os espectáculos após obras <strong>de</strong> ampliação.<br />

Bailes <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia<br />

(só que na ci<strong>da</strong><strong>de</strong>)<br />

“Vá lá senhora” <strong>nos</strong> ecrãs <strong>de</strong> televisão,<br />

<strong>nos</strong> rádios dos carros, nas cabeças<br />

<strong>da</strong>s gentes. E Os Golpes assaltados<br />

por pedidos insistentes em busca <strong>de</strong><br />

um disco que não havia, que fora totalmente<br />

distribuído aos fãs <strong>nos</strong> concertos<br />

<strong>de</strong> lançamento. O paradoxo aí<br />

estava, em letras garrafais: um lançamento<br />

exclusivo, <strong>de</strong> circulação limita<strong>da</strong>,<br />

tornava-os audição obrigatória,<br />

alargava-lhes o público. O interesse<br />

<strong>de</strong>spertado foi tanto que acabou por<br />

VANDA NORONHA<br />

esgotar o álbum <strong>de</strong> estreia nas lojas.<br />

A se<strong>de</strong> por músicas d’Os Golpes saciava-se<br />

com tudo o que houvesse à<br />

mão. O que, na ocasião, queria apenas<br />

dizer “Cruz Vermelha…”. Essa<br />

populari<strong>da</strong><strong>de</strong> inespera<strong>da</strong> fez-se sentir,<br />

por vezes, <strong>de</strong> forma bem real. Foi<br />

então que perceberam que já eram<br />

vistos como quem faz vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> música<br />

e não toca apenas para sacar umas<br />

cervejas à borla e piscar o olho às miú<strong>da</strong>s<br />

<strong>da</strong> primeira fila. Manuel Fúria<br />

começou a ser abor<strong>da</strong>do por pessoas<br />

do seu dia-a-dia, que afinal já não falavam<br />

só <strong>de</strong> galões ou <strong>de</strong> patilhas: “O<br />

senhor <strong>da</strong> pastelaria e a senhora do<br />

cabeleireiro, pessoas que me conheciam<br />

como alguém <strong>da</strong> vizinhança,<br />

associaram-me à música e começaram<br />

a perguntar on<strong>de</strong> podiam comprar<br />

o disco”.<br />

O sucesso foi tal que <strong>de</strong>u em medo.<br />

Até então, Os Golpes achavam que a<br />

conquista <strong>nos</strong> concertos se fazia “pessoa<br />

a pessoa, música a música”. Agora,<br />

contraria Luís, são eles os conquistados,<br />

<strong>de</strong>sarmados pela novi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Manuel já não ter <strong>de</strong> pedir para as<br />

pessoas se levantarem. Quando perceberam<br />

que a maioria do público<br />

que tinham pela frente era atraí<strong>da</strong><br />

por uma canção em particular, recearam<br />

que o resto do alinhamento não<br />

fosse recebido com o mesmo entusiasmo.<br />

“Senti algum receio <strong>de</strong> que o<br />

‘Vá lá senhora’ fosse um cartão-<strong>de</strong>visita<br />

envenenado e que as pessoas,<br />

quando <strong>de</strong>scobrissem o resto do repertório,<br />

se sentissem um bocadinho<br />

traí<strong>da</strong>s, mas tem sido muito bem aceite”,<br />

conclui Luís.<br />

Constatação óbvia para Os Golpes:<br />

o alargamento do seu público aconteceu,<br />

em parte, junto <strong>de</strong> gente para<br />

quem o nome <strong>da</strong> editora AmorFúria<br />

não passará <strong>de</strong> duas palavras a atropelarem-se.<br />

Essa gente, <strong>de</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong> mais<br />

avança<strong>da</strong> – concretiza Manuel Fúria<br />

–, “não é tanto aquela que po<strong>de</strong> associar-<strong>nos</strong><br />

a um rock português mais<br />

antigo, mas que vibra com uma canção<br />

como o ‘Vá lá senhora’ <strong>da</strong> mesma<br />

maneira que vibra no baile <strong>da</strong> terra”.<br />

Regozijo evi<strong>de</strong>nte n’Os Golpes: “Aquilo<br />

[o tal single] lembra-lhes ou evoca<br />

uma aura que tem a ver com festas<br />

populares”. Uma linguagem comum,<br />

na opinião <strong>de</strong> Pedro, aos Diabo na<br />

Cruz e a B Facha<strong>da</strong>. “As três sonori<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

remetem para esse Portugal<br />

que precisava <strong>de</strong> uma ponte para o<br />

agora e para o futuro”.<br />

O futuro d’Os Golpes, pelo me<strong>nos</strong><br />

o imediato, é isto: concertos, muitos,<br />

para aproveitar o momento; e, <strong>de</strong>pois,<br />

a preparação do segundo álbum,<br />

uma possível pedra<strong>da</strong> nas águas<br />

algo para<strong>da</strong>s <strong>da</strong> pop nacional. “Umas<br />

<strong>da</strong>s <strong>nos</strong>sas próximas batalhas”, vai<br />

avisando Fúria, “é as ban<strong>da</strong>s em Portugal<br />

po<strong>de</strong>rem começar a ser arrogantes<br />

sem serem mal interpreta<strong>da</strong>s”.<br />

Façam favor.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!