ECONOMIAc) Um derradeiro cenário mais abrangente, queincluía todas as relações comerciais transatlânticas,nomeadamente os obstáculos pautais enão-pautais existentes e decorrentes, verbi gratia,da subsistência de barreiras regulatórias aocomércio de bens, serviços, investimento e contratospúblicos. Aqui podiam equacionar-se duasalternativas: uma, mais conservadora e outramais ambiciosa tudo dependendo de saber atéonde se pretende ir na eliminação de obstáculospautais e não-pautais.O mandato conferido à Comissão Europeia e asnegociações em curso permitem compreender quese avançou por este derradeiro cenário – mais ambicioso– apesar de sabermos que certos serviçosforam, a priori, excluídos do âmbito das negociaçõesem curso o que pode prejudicar o posicionamentonegocial das partes.As negociações em curso visam alcançar trêsobjectivos essenciais:(i) melhoria do acesso recíproco ao mercado debens, serviços, investimentos e contratos públicos,a todos os níveis de governo que se traduzna:a. Eliminação ou redução das taxas alfandegárias;b. Abertura recíproca dos mercados de serviços;c. Liberalização e protecção do investimento;d. Efectiva abertura dos contratos públicos emtodos os níveis de governo;(ii) redução das barreiras não-pautais e aperfeiçoamentoda compatibilidade dos regimes regulamentaresque se traduz na:a. Eliminação de barreiras ao comércio;b. Definição comum de regras devendo os eventuaisobstáculos que subsistam ser legítimos,não-discriminatórios e proporcionais;c. Manutenção de um acordo “vivo” que permitaa progressiva eliminação de obstáculosnão-pautais e a convergência regulatória transatlânticadepois da celebração deste;(iii) desenvolvimento de regras comuns paraenfrentar as oportunidades e os desafios globaispartilhados de comércio visando:a. Manutenção de níveis elevados de defesa dosdireitos de propriedade intelectual;b. Assegurar ao comércio e desenvolvimentoníveis elevados de sustentabilidade ambientale social;Note-se que nenhuma destas questões aparece,de forma ingénua, nas negociações.Todos os pontos anteriormente referidos acolhem,de alguma forma, litígios surgidos entre a UE (oualgum dos seus Estados-membros) e os EUA dirimidosno seio da Organização Mundial do Comércio(OMC).Questões como as barreiras alfandegárias (quederam origem a um paradoxal e conhecido casodas bananas, entre os EUA e a UE, envolvendo zonasque quase não produzem bananas…); barreirasregulatórias (fito-sanitárias, como sucedeu com ocaso tuna-dolphin); barreiras à prestação de serviçosou a questão dos organismos geneticamentemodificados fazem recordar que litígios passadosservem de lições para escrever tratados futuros.É legítimo, por conseguinte, afirmar que o novoTratado visa prevenir litígios transatlânticos sabendo-seque, apesar de aliados, os EUA e a UE foram,no passado, litigantes recíprocos perante a OMC.UN PHOTO/JOHN ISAACO problema do dumping social surge como entrave a uma efectiva liberalização do comércio internacional.42Paralelo n. o 8 | INVERNO 2013/2014
ECONOMIA“(…) o novo Tratado pode simbolizar umaantecâmara de evolução desejada para a OMCno contexto da liberalização do comérciointernacional.”Neste domínio, o novo Tratado pode simbolizar umaantecâmara de evolução desejada para a OMC no contextoda liberalização do comércio internacional.Uma das maiores dificuldades que os negociadoresirão enfrentar diz respeito à eliminação de obstáculosnão-pautais.Porquê?Desde logo porque os obstáculos pautais são defácil percepção – estamos a falar de taxas alfandegáriaspor todos conhecidas – sendo, consequentemente,de mais fácil negociação.Sucede até que as taxas alfandegárias transatlânticassão, em geral, relativamente baixas, apesar denão serem negligenciáveis.A OMC estima que as taxas alfandegárias praticadaspelos EUA sejam, em média, de 3,5% e as da UniãoEuropeia, em média, de 5,2%.‘ Estas taxas, sendo eliminadas ou atenuadaspelo Tratado em negociação, permitirão reforçara competividade das exportações portuguesaspara os EUA com evidente vantagempara as empresas nacionais.’Não obstante, existe ainda algum proteccionismoem determinados sectores económicos protegidos.Por exemplo, do lado da União Europeia são aplicadastaxas alfandegárias elevadas a produtos agrícolas,camiões (22%), calçado (17%), produtosaudiovisuais (14%) e vestuário (12%).Do lado americano subsistem taxas alfandegáriaselevadas em produtos agrícolas processados (tabaco– 350%); têxteis (40%); vestuário (32%) e calçado(56%).Estas taxas representam um valor residual no comérciobilateral (2% no caso das importações provenientesdos Estados Unidos para a Europa e 0,8 %no caso das importações provenientes da UniãoEuropeia para os EUA).Apesar de alguns autores não destacarem a relevânciadestes obstáculos pautais no contexto das negociações,é legítimo considerar que serão relevantespara Portugal uma vez que estão em causa partedos produtos tipicamente exportados para os EUA.Atente-se, em particular, aos têxteis, vestuário ecalçado, relativamente aos quais a abertura de umnovo mercado pode revelar-se decisiva para o incrementodas exportações portuguesas.É certo que a estrutura das exportações de Portugalpara os EUA sofreu alterações nos últimos anos.Se, na década de 90 do século passado, se exportavasobretudo calçado, roupa de cama, cortiça,moldes, tecidos e vinhos (dados AICEP), em 2011as principais exportações passaram a ser combustíveisminerais, máquinas e aparelhos, cortiça ematérias têxteis (pesando um total de 56% dosbens exportados para os EUA).Registe-se ainda a exportação de novos produtosde Portugal para os EUA que, em 2011, representavamum peso de 26%: químicos, pastas e papel;veículos e minerais.O que significa que, apesar da alteração do paradigmados bens exportados, muitos deles sofremainda penalizações alfandegárias que prejudicamas nossas exportações.“As taxas alfandegárias, sendo eliminadas ouatenuadas pelo Tratado em negociação, permitirãoreforçar a competividade das exportaçõesportuguesas para os EUA com evidente vantagempara as empresas nacionais permitindo até diluira desvantagem competitiva que se verificaactualmente em resultado da excessiva valorizaçãodo euro face ao dólar.”Estas taxas, sendo eliminadas ou atenuadas peloTratado em negociação, permitirão reforçar a competividadedas exportações portuguesas para os EUAcom evidente vantagem para as empresas nacionaispermitindo até diluir a desvantagem competitivaque se verifica actualmente em resultado da excessivavalorização do euro face ao dólar.Deixemos agora de lado os obstáculos pautais eolhemos então para os obstáculos não-pautais.Estes nem sempre são conhecidos, o que podecausar alguma dificuldade.Não está em causa, por exemplo, o problema dodumping social que surge como entrave a uma efectivaliberalização do comércio internacional e quetêm sido suscitado no contexto das relações comerciaisentre a União Europeia e alguns países asiáticos,em particular com a China.Esse problema, felizmente, não se coloca nestasnegociações como aliás reconheceu recentementeo Parlamento Europeu.Mas há outros entraves não-pautais que subsisteme que representam um obstáculo ao comércio internacional.Esses obstáculos podem ser de diversa ordem.Refiro-me, inter alia, a obstáculos legais ou regulamentares– face, por exemplo, a excessos ou insuficiênciasde intervenção regulatória relacionadas,nomeadamente, com o comércio de serviços aprocedimentos aduaneiros, standards e normas técnicasou sanitárias, restrições regulamentares oudificuldades no reconhecimento mútuo que operamna retaguarda da fronteira.“A redução de obstáculos não-pautais constituiráparte do sucesso da liberalização do comércioem curso.”A redução de obstáculos não-pautais constituirá,por conseguinte, parte do sucesso da liberalizaçãodo comércio em curso.Paralelo n. o 8 | INVERNO 2013/2014 43