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edição de 3 de agosto de 2020

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opinião<br />

Pixabay<br />

Realida<strong>de</strong><br />

cruel<br />

BRITTO JR<br />

“E na<br />

distribuição<br />

dE rEnda, a<br />

situação é<br />

ainda pior,<br />

nEgros são<br />

75% EntrE os<br />

mais pobrEs”<br />

Infelizmente é preciso que situações<br />

grotescas aconteçam para que o mundo<br />

grite e proteste contra essa disfunção<br />

sistêmica do preconceito, principalmente<br />

quando ela atinge a sua forma mais primitiva<br />

e animal, a violência física com efeitos<br />

letais.<br />

Porém, diariamente, existem muitos<br />

outros tipos <strong>de</strong> situações, não menos graves,<br />

que, sabemos, algumas vezes fazemos<br />

parte e muitas vezes nos omitimos a<br />

resolver com pequenas atitu<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ntro do<br />

alcance <strong>de</strong> cada um.<br />

Nesses casos, o resultado não é a violência<br />

física, não mata ninguém explicitamente,<br />

mas produz uma tortura moral<br />

também letal.<br />

Não alcança a gran<strong>de</strong> mídia,<br />

mas atinge a consciência<br />

<strong>de</strong> muitas pessoas.<br />

Não é tangível e fácil <strong>de</strong> medir,<br />

ao contrario, é abstrata, sútil<br />

e inteligentemente silenciosa.<br />

É cultural, transmissível e<br />

se espalha na velocida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

um vírus.<br />

Conveniente pra quem se<br />

omite, <strong>de</strong>vastadora para quem<br />

sofre diariamente, repetidamente<br />

e injustamente.<br />

Gritar e protestar é importante, mas<br />

muitas vezes o efeito se restringe a um<br />

curto movimento midiático, como um<br />

analgésico, alivia a dor, mas não tem o<br />

efeito prático e prolongado <strong>de</strong> uma vacina.<br />

Como todo vírus, existem muitos tipos,<br />

com dores, causas e efeitos colaterais diferentes.<br />

E o pior, muitos têm, transmitem, mas<br />

não são autodiagnosticados, pois se percebem<br />

assintomáticos.<br />

Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro <strong>de</strong><br />

Geografia e Estatística), essa realida<strong>de</strong> é<br />

matematicamente cruel.<br />

Enquanto a população negra representa<br />

56,10%, eles correspondiam a cerca <strong>de</strong><br />

dois terços das pessoas que não tinham<br />

emprego, ou seja, 64,2%. Além disso, na<br />

classe <strong>de</strong> rendimento mais elevado, apenas<br />

11,9% das pessoas ocupadas em cargos<br />

gerenciais são pretas ou pardas.<br />

E na distribuição <strong>de</strong> renda, a situação é<br />

ainda pior, negros são 75% entre os mais<br />

pobres.<br />

Muitos criticam o sistema <strong>de</strong> cotas em<br />

universida<strong>de</strong>s públicas, mas, diante <strong>de</strong><br />

um <strong>de</strong>sequilíbrio vergonhosamente crônico,<br />

<strong>de</strong>veria ser o ponto <strong>de</strong> partida para<br />

um movimento muito mais abrangente e<br />

consciente da socieda<strong>de</strong> como um todo.<br />

Nāo <strong>de</strong>veria ser apenas uma regra imposta,<br />

mas uma autorregulamentação alinhada<br />

com as missões e valores <strong>de</strong> muitas<br />

empresas que prezam por valores mais<br />

humanos e a favor da diversificação<br />

real.<br />

Mas quais são essas situações<br />

que algumas vezes fazemos parte,<br />

vemos diariamente e transmitimos<br />

silenciosamente <strong>de</strong> uma geração<br />

para a outra?<br />

Muitas, porém cabe a cada um<br />

pensar sobre o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> alcance<br />

<strong>de</strong> cada interessado em mudar essa<br />

realida<strong>de</strong>.<br />

No meu alcance, por exemplo,<br />

uma das perguntas que me faço<br />

com intensida<strong>de</strong> é se quando planejo,<br />

<strong>de</strong>cido ou indico algum profissional, eu<br />

penso prover oportunida<strong>de</strong> em equilíbrio<br />

<strong>de</strong>ssa diversida<strong>de</strong> e realida<strong>de</strong> tão distorcida?<br />

Isso tem me fortalecido a tomar <strong>de</strong>cisões<br />

práticas <strong>de</strong> implementar programas<br />

<strong>de</strong> conscientização e incentivo, sem críticas,<br />

falso moralismo ou julgamentos, mas<br />

com a melhor estratégia, que é a motivação<br />

e a ação.<br />

Faça as próprias perguntas e encontre<br />

novas atitu<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> você.<br />

Com certeza, cada um vai encontrar o<br />

próprio remédio para esse vírus e ajudar<br />

pouco ou muito nessa transformação.<br />

Essa é a missão <strong>de</strong>ste texto, refletir e fazer<br />

você refletir.<br />

Britto Jr. é sócio e CEO da Score Group<br />

brittojr@scoregroup.com.br<br />

24 3 <strong>de</strong> <strong>agosto</strong> <strong>de</strong> <strong>2020</strong> - jornal propmark

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