13.04.2013 Views

HOMERO NUM MANUSCRITO INÉDITO i

HOMERO NUM MANUSCRITO INÉDITO i

HOMERO NUM MANUSCRITO INÉDITO i

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

<strong>HOMERO</strong> <strong>NUM</strong> <strong>MANUSCRITO</strong> <strong>INÉDITO</strong> 379<br />

dividi-lo nos seguintes cinco fragmentos, a que correspondem outros<br />

tantos motivos: as flechas de Apolo, a ofensa de Agamémnon, a súplica<br />

de Crises, o flagelo da peste e as vítimas do castigo.<br />

1. As Flechas de Apolo<br />

Durante nove dias, de pé, sobre nuvens cor de ouro e bronze, com o arco<br />

de prata na sua armadura, Febus Apolo arremessava flechas sobre o vasto acampamento<br />

dos Acaios, defronte dos muros de Tróia — pesados e negros, no resplendor<br />

da lua, e coroados de escudo de bronze.<br />

Os elementos sublinhados são a tradução literal dos seus correspondentes,<br />

feita a partir da tradução do Leconte de Lisle. Com<br />

efeito, o sintagma preposicional «durante nove dias» deriva do conjunto<br />

«depuis neuf jours»; a proposição «Febus Apolo arremessava<br />

flechas sobre o vasto acampamento dos Acaios» 8 resulta da associação<br />

de microstruturas, como «Phoebos Apollon» (p. 2), «lança... des<br />

flèches» (p. 3), «vers le vaste» (p. 15), «camp» (p. 175) e «des Akhaiens»<br />

(p. 15).<br />

Como estamos a ver, este primeiro período gramatical, centrado no<br />

motivo das flechas, constitui um mini-quadro descritivo, que nos repre-<br />

s Este lexema, «Acaios», constitui só por si uma espécie de bilhete de identidade<br />

ou deíctico da matriz intertextual de que derivou o texto de Eça de Queirós.<br />

Não se encontra em qualquer outro autor português, nem em qualquer léxico anterior<br />

ou contemporâneo de Eça de Queirós e, quanto aos posteriores, apenas o vimos<br />

dicionarizado pelo lexicógrafo José Pedro Machado (1948, 1967 e 1981). Quanto<br />

aos léxicos estrangeiros, também em nenhum deles se encontra lexema algum de<br />

que ele possa ter provindo. E, falando de escritores, apenas o empregou precisamente<br />

o referido Leconte de Lisle, que levou até às últimas consequências a remodelação<br />

ortográfica dos nomes próprios, imposta pelo aprofundamento dos conhecimentos<br />

mitológicos, religiosos e científicos da Antiguidade Greco-Latina. Assim,<br />

chegou mesmo ao ponto de transcrever o etnónimo helénico ''Ayaioi por «Akhaiens»,<br />

em detrimento da forma «Achéens», já inserida no sistema linguístico francês. Ousadias<br />

como esta concitaram contra ele, nos meios científicos e literários, acesas polémicas<br />

expressas em comentários para todos os gostos. Pois foi desse bizarro invento<br />

filológico, empregado ad nauseam por Leconte de Lisle nas suas traduções da Ilíada<br />

(609 ocorrências) e da Odisseia (126) que Eça de Queirós formou, com impecável<br />

rigor etimológico, o vocábulo «Acaios» (textualmente, no manuscrito: «Achaios»),<br />

cuja massa fónica o torna preferível a «Aqueus» e digno de figurar nos dicionários<br />

de português, até porque não se trata de um simples hápax legómenon inédito, pois<br />

já se encontra num outro texto de Eça de Queirós publicado em 1896, consagrado<br />

à memória de Antero de Quental, «Um Génio que Era um Santo» (1896: 497), redigido<br />

com toda a certeza pela mesma altura do presente manuscrito e derivado, sem<br />

dúvida, do mesmo hipotexto.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!