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Edição Especial do Centenário - Associação Brasileira de Imprensa

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VICTOR CIVITA, UM APAIXONADO POR REVISTAS<br />

64<br />

Mas primeiro chegaram na Inglaterra. Sylvana estava<br />

grávida <strong>de</strong> seu segun<strong>do</strong> filho, Richard, que<br />

nasceria logo em seguida em Londres. Mas também<br />

não ficaram muito tempo por lá. Foram para a França<br />

e embarcaram para os Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s no Rex, o<br />

navio italiano mais famoso da época.<br />

A família permaneceria na América por <strong>de</strong>z anos.<br />

Victor <strong>de</strong>stacava-se em vendas, mas não estava<br />

satisfeito. Em 1949, passa<strong>do</strong> o pesa<strong>de</strong>lo da guerra,<br />

to<strong>do</strong>s foram passar férias na Itália durante o verão<br />

– meio <strong>do</strong> ano no Hemisfério Norte. Victor reencontrou<br />

César. O irmão estava estabeleci<strong>do</strong> na Argentina<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo <strong>do</strong>s anos 40. Era <strong>do</strong>no <strong>de</strong> uma<br />

certa Editorial Abril, cujo símbolo era uma árvore,<br />

e lançara uma revistinha em quadrinhos chamada<br />

El Pato Donald. Na Itália, César trabalhara na Monda<strong>do</strong>ri,<br />

uma das maiores editoras <strong>do</strong> país, com as<br />

revistas Disney. Quan<strong>do</strong> o tempo fechou e a guerra<br />

surgiu no horizonte, procurou Walt Disney nos<br />

Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s e obteve sua licença para publicar<br />

as revistas na América <strong>do</strong> Sul. Estabeleceu-se em<br />

Buenos Aires, mas, agora, o populismo peronista o<br />

preocupava. Por isso, pensava em expandir os negócios;<br />

o Brasil parecia uma terra promissora.<br />

“VOSTRO PADRE È IMPAZZITO”<br />

Enquanto a esposa e os filhos voltavam para os<br />

Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, Victor foi com o irmão para a<br />

Argentina. De lá seguiu para o Rio <strong>de</strong> Janeiro e<br />

<strong>de</strong>pois São Paulo. Quan<strong>do</strong> falou em montar uma<br />

editora na capital paulista, ninguém o levou a sério.<br />

Apesar da dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer filho escrever<br />

objetivamente a respeito <strong>de</strong> seu pai, acredito po<strong>de</strong>r<br />

dizer — sem exagero — que VC (como o chamávamos<br />

na Abril) foi uma daquelas figuras que alteram<br />

os caminhos que percorrem. Sua coragem, sua ousadia,<br />

seu entusiasmo permanente e seu espírito empreen<strong>de</strong><strong>do</strong>r<br />

levaram à criação <strong>de</strong> revistas e obras culturais<br />

que revolucionaram a ativida<strong>de</strong> editorial e enriqueceram<br />

a vida <strong>de</strong> várias gerações <strong>de</strong> brasileiros.<br />

Victor Civita tinha como sagra<strong>do</strong> o respeito ao<br />

leitor e uma sensibilida<strong>de</strong> inigualável para compreen<strong>de</strong>r o que o público<br />

queria e precisava para se informar, se entreter e se educar. Essas contribuições<br />

— mais sua preocupação permanente com a integrida<strong>de</strong>, o bom<br />

gosto e a excelência — acabaram por transformar a história das publicações<br />

no Brasil. Acima <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>, ele tinha a convicção<br />

<strong>de</strong> que a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão e<br />

uma imprensa in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e forte são<br />

alicerces fundamentais da <strong>de</strong>mocracia.<br />

Além <strong>de</strong> ser uma força da natureza,<br />

um empreen<strong>de</strong><strong>do</strong>r visionário, um editor<br />

<strong>de</strong> extraordinária sensibilida<strong>de</strong>, Victor<br />

Civita também foi um gran<strong>de</strong> pai. Pois<br />

além <strong>de</strong> nos ensinar pelo seu exemplo,<br />

<strong>de</strong>u espaço e oportunida<strong>de</strong> para<br />

que seus filhos pu<strong>de</strong>ssem também<br />

ousar, arriscar, errar, construir e<br />

perseguir seus próprios sonhos.<br />

Das principais coisas que<br />

aprendi com ele – sem ele nun-<br />

Victor Civita com sua<br />

esposa Sylvana e seus<br />

filhos Roberto (ao centro)<br />

e Richard, em sua sala no<br />

segun<strong>do</strong> en<strong>de</strong>reço da<br />

Editora Abril, na Rua João<br />

A<strong>do</strong>lfo, em São Paulo.<br />

Jornal da ABI<br />

Achavam que o homem estava brincan<strong>do</strong> ou ficara<br />

louco. A cida<strong>de</strong> tinha pouco mais <strong>de</strong> 2 milhões <strong>de</strong><br />

habitantes e apenas quatro revistas. Diziam-lhe<br />

que não tinha os jornalistas, os artistas<br />

gráficos, os recursos necessários<br />

ao setor.<br />

“Muita gente tentou me fazer<br />

<strong>de</strong>sistir, afirman<strong>do</strong> que os intelectuais<br />

e jornalistas estavam to<strong>do</strong>s no<br />

Rio. Eu respondia que não tinha<br />

importância, pois o dinheiro estava<br />

em São Paulo. To<strong>do</strong>s viriam para cá.<br />

E vieram, porque havia emprego e<br />

bem-remunera<strong>do</strong>”, contou Civita,<br />

anos <strong>de</strong>pois.<br />

Em setembro <strong>de</strong> 1949 Sylvana<br />

recebeu uma carta <strong>do</strong> mari<strong>do</strong>.<br />

“A or<strong>de</strong>m que dava era para que<br />

ven<strong>de</strong>sse seus pertences, embalasse<br />

algumas coisas e viesse imediatamente para o Brasil.<br />

Quan<strong>do</strong> leu a carta para os meninos, Roberto,<br />

então com 13 anos, e Richard, com 10, ela completou<br />

com uma conhecida afirmação: ‘Vostro padre è<br />

impazzito’. Sim, papai é divenuto pazzo. Per<strong>de</strong>u a razão.<br />

Amalucou”, conta Roberto Pompeu <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong>.<br />

Mesmo assim a família obe<strong>de</strong>ceu. Victor Civita<br />

instalou-se numa pequena sala na Rua Líbero Badaró,<br />

no Centro <strong>de</strong> São Paulo, contratou uma secretária<br />

e conseguiu um telefone. Foram morar no<br />

Hotel Esplanada, o mais nobre da cida<strong>de</strong>, atrás <strong>do</strong><br />

Teatro Municipal e próximo <strong>do</strong> escritório. Em 12<br />

SOBRE VC<br />

POR ROBERTO CIVITA<br />

Volume<br />

2<br />

<strong>Edição</strong> <strong>Especial</strong> <strong>do</strong> <strong>Centenário</strong><br />

<strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1950 saiu o primeiro número <strong>de</strong> O Pato<br />

Donald, um sucesso estron<strong>do</strong>so, que seria segui<strong>do</strong><br />

mais tar<strong>de</strong> por outros gibis como Mickey, Tio Patinhas,<br />

Zé Carioca, além <strong>de</strong> publicações<br />

infantis como Recreio, crian<strong>do</strong> em gerações<br />

<strong>de</strong> meninos e meninas o hábito<br />

da leitura, especialmente em tempos<br />

nos quais não havia internet, vi<strong>de</strong>ogame<br />

e a televisão ainda era insipiente.<br />

Para essa empreitada Civita possuía<br />

US$ 500 mil em recursos próprios,<br />

levantou empréstimos e se associou<br />

ao grupo Smith <strong>de</strong> Vasconcelos<br />

e a Gordiano Rossi, um mineiro<br />

filho <strong>de</strong> italianos, que seria seu parceiro<br />

nas primeiras décadas da Abril.<br />

Um ano mais tar<strong>de</strong> a Abril estava<br />

funcionan<strong>do</strong> em uma nova se<strong>de</strong>, na<br />

Rua João A<strong>do</strong>lfo. O crescimento, no entanto, estava<br />

ameaça<strong>do</strong>, pois não havia gráficas para revistas em<br />

São Paulo. Então, ele construiu uma. Também não<br />

havia distribui<strong>do</strong>ras, e ele criou uma. Nem sempre<br />

eram tarefas fáceis. Era preciso levantar centenas<br />

<strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> dólares para importar os equipamentos,<br />

visitar incansavelmente a burocracia <strong>do</strong>s órgãos<br />

públicos e fornece<strong>do</strong>res <strong>de</strong> luz, água e telefone. Geralmente,<br />

aprovavam seus pedi<strong>do</strong>s até para se livrar<br />

<strong>de</strong>le, já que não aceitava um “não” como resposta.<br />

Anos <strong>de</strong>pois, quan<strong>do</strong> precisou mo<strong>de</strong>rnizar a<br />

gráfica e foi procurar o Banco Nacional <strong>de</strong> Desen-<br />

ca ter para<strong>do</strong> para especificá-las – estão a necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> fazer bem feito qualquer coisa que se faça; <strong>do</strong><br />

trabalho ser importante em si; da diferença estar sempre<br />

nos <strong>de</strong>talhes; da fundamental necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tratar<br />

to<strong>do</strong>s – <strong>de</strong> presi<strong>de</strong>nte ao mais simples trabalha<strong>do</strong>r<br />

– com consi<strong>de</strong>ração e respeito; o hábito permanente<br />

<strong>de</strong> pensar gran<strong>de</strong>; <strong>de</strong> a palavra dada valer mais<br />

que qualquer contrato; <strong>de</strong> nunca aceitar um “não” e<br />

a convicção <strong>de</strong> que o que for bem feito – com qualida<strong>de</strong>,<br />

honestida<strong>de</strong>, inteligência e <strong>de</strong>dicação – trará<br />

bons resulta<strong>do</strong>s mesmo que este não tenha si<strong>do</strong> o objetivo.<br />

Continuamos - os atuais seis mil integrantes <strong>do</strong> Grupo Abril - empenha<strong>do</strong>s<br />

em honrar o lega<strong>do</strong> <strong>de</strong> Victor Civita, pratican<strong>do</strong> jornalismo responsável,<br />

produzin<strong>do</strong> entretenimento saudável e trabalhan<strong>do</strong> para melhorar<br />

a qualida<strong>de</strong> da educação brasileira.<br />

Sócio da ABI, Roberto Civita<br />

é Presi<strong>de</strong>nte da Editora Abril<br />

e editor <strong>de</strong> Veja.

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