Edição Especial do Centenário - Associação Brasileira de Imprensa
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OCTÁVIO FRIAS, O EMPRESÁRIO COM ALMA DE REPÓRTER<br />
72<br />
A situação <strong>de</strong> Frias contrastava com o ambiente<br />
em que vivia. “Aos <strong>do</strong>mingos minha família<br />
visitava os Street, no bairro <strong>do</strong>s Campos Elíseos.<br />
Aquelas oportunida<strong>de</strong>s me marcaram muito. Via<br />
três carros na garagem <strong>de</strong> meu tio e voltava para<br />
casa <strong>de</strong> bon<strong>de</strong>”, disse Frias em entrevista para o<br />
livro A Trajetória <strong>de</strong> Octavio Frias <strong>de</strong> Oliveira, perfil<br />
biográfico escrito pelo jornalista Engel Paschoal.<br />
Frias estu<strong>do</strong>u no Colégio São Luís, na Avenida<br />
Paulista, freqüenta<strong>do</strong> pela elite paulistana. Sofria<br />
com as crescentes dificulda<strong>de</strong>s financeiras <strong>do</strong> pai,<br />
os atrasos <strong>do</strong>s pagamentos das mensalida<strong>de</strong>s da<br />
escola e com o sapato fura<strong>do</strong>, que usava forra<strong>do</strong><br />
com jornal por <strong>de</strong>ntro para tapar o buraco.<br />
Aos 14 anos, cansa<strong>do</strong> da situação, usou como<br />
<strong>de</strong>sculpa o fato <strong>de</strong> não ter passa<strong>do</strong> nos exames para<br />
ir trabalhar. Gostava <strong>de</strong> História Universal, sonhava<br />
em ser advoga<strong>do</strong>, mas tomou a <strong>de</strong>cisão que<br />
pautaria sua vida: queria ganhar dinheiro. O começo<br />
não parecia indicar isso. Foi contrata<strong>do</strong> para<br />
ser office-boy na Companhia <strong>de</strong> Gás <strong>de</strong> São Paulo.<br />
Mas começou a ajudar em casa e sua <strong>de</strong>dicação<br />
logo chamou a atenção <strong>de</strong> seus chefes, que perceberam<br />
sua habilida<strong>de</strong> para operar as antigas máquinas<br />
<strong>de</strong> calcular Elliot Fischer e o promoveram<br />
a mecanógrafo. Quatro anos <strong>de</strong>pois, em 1930,<br />
ingressou na Secretaria da Fazenda <strong>do</strong> Governo <strong>de</strong><br />
São Paulo, tornan<strong>do</strong>-se funcionário público.<br />
Durante esses anos, começou a mostrar a aptidão<br />
para os negócios. Como recebia 600 mil réis por<br />
mês, vendia rádios à noite para aumentar a renda.<br />
“Eu batia na casa e oferecia um rádio, <strong>de</strong>ixava o aparelho<br />
lá <strong>de</strong> experiência e dias <strong>de</strong>pois voltava”, contou<br />
Frias, revelan<strong>do</strong> uma estratégia <strong>de</strong> marketing<br />
inova<strong>do</strong>ra para a época. Era a primeira, mas não a<br />
mais importante inovação. Em 1943, mesmo já<br />
ocupan<strong>do</strong> o cargo <strong>de</strong> Diretor <strong>do</strong> Departamento Estadual<br />
<strong>do</strong> Serviço Público e respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> pela Diretoria<br />
<strong>de</strong> Contabilida<strong>de</strong> e Planejamento, <strong>de</strong>ixou o<br />
serviço público para criar o Banco Nacional Imobiliário-BNI<br />
com o xará Octávio Roxo Loureiro.<br />
Entrava no ramo empresarial apenas, como<br />
costumava dizer, “com a cara e a coragem”. Mas<br />
também com boas idéias, como os con<strong>do</strong>mínios a<br />
preço <strong>de</strong> custo, que levou à construção <strong>de</strong> mais <strong>de</strong><br />
Octávio Frias<br />
estava acostuma<strong>do</strong><br />
a receber na se<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> seu jornal visitas<br />
ilustres como o<br />
Governa<strong>do</strong>r da<br />
Guanabara, Carlos<br />
Lacerda, em 1963;<br />
o Governa<strong>do</strong>r <strong>do</strong><br />
Maranhão, José<br />
Sarney, em 1967<br />
(foto abaixo) e o<br />
ex-Presi<strong>de</strong>nte<br />
Juscelino<br />
Kubitschek e seu<br />
amigo A<strong>do</strong>lpho<br />
Bloch, em 1974 (na<br />
página oposta).<br />
Jornal da ABI<br />
<strong>de</strong>z prédios, entre eles, o Edifício Copan, projeta<strong>do</strong><br />
por Oscar Niemeyer em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 50,<br />
e que se tornou um <strong>do</strong>s símbolos da cida<strong>de</strong>. Além<br />
<strong>do</strong> arquiteto, Frias fez amiza<strong>de</strong> com os pintores<br />
Cândi<strong>do</strong> Portinari e Di Cavalcânti, convida<strong>do</strong>s por<br />
ele para fazer alguns painéis nos prédios e teatros<br />
que construiu. O “canguru-mirim”, campanha <strong>de</strong><br />
estímulo à poupança infantil, foi outra ação <strong>do</strong> BNI<br />
que marcou época.<br />
ANIVERSÁRIO NA TRINCHEIRA<br />
Na carreira que construiu na imprensa, Frias<br />
ficou marca<strong>do</strong> pela <strong>de</strong>fesa intransigente <strong>de</strong> <strong>do</strong>is<br />
pressupostos: a pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> idéias e a in<strong>de</strong>pendência<br />
<strong>do</strong>s governos. Po<strong>de</strong> até ser que tenha si<strong>do</strong><br />
leva<strong>do</strong> a elas pelas circunstâncias políticas, mas<br />
suas origens para o empresário eram muito mais<br />
antigas. Frias alistou-se nas tropas da Revolução<br />
Constitucionalista <strong>de</strong> 1932. Permaneceu <strong>do</strong>is<br />
meses em Cunha, no Vale <strong>do</strong> Paraíba, passou seu<br />
aniversário numa trincheira, participou <strong>de</strong> esca-<br />
olume<br />
2<br />
dição special <strong>do</strong> entenário<br />
ramuças e presenciou a morte <strong>de</strong> diversos companheiros.<br />
Logo, percebeu que a ação militar contra<br />
o Governo Central era uma aventura que terminaria<br />
em fracasso. Também passou a revelar uma<br />
antipatia pela li<strong>de</strong>rança oligárquica <strong>do</strong> movimento.<br />
Findada a luta, passou a a<strong>do</strong>tar uma posição<br />
cética quanto à política. Tanto que, nos anos seguintes,<br />
manteve-se distante tanto <strong>do</strong> comunismo quanto<br />
<strong>do</strong> integralismo, as duas correntes i<strong>de</strong>ológicas que<br />
mais empolgavam a juventu<strong>de</strong>. Sua vocação era a<br />
empresa que assumira; por causa <strong>de</strong>la, foi diversas<br />
vezes aos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, on<strong>de</strong> foi fortemente<br />
influencia<strong>do</strong> pela cultura empresarial.<br />
Pelo BNI, Frias também teve seu primeiro contato<br />
com José Nabantino Ramos, então controla<strong>do</strong>r<br />
<strong>do</strong> Grupo Folha da Manhã. Nabantino pediu<br />
ajuda a Frias para capitalizar a empresa com a<br />
emissão <strong>de</strong> ações. Como Loureiro não se interessou,<br />
Frias criou a Transações Comerciais Ltda.-Transaco<br />
e foi um <strong>do</strong>s primeiros a ven<strong>de</strong>r títulos. O episódio<br />
representou apenas a primeira divergência entre os<br />
sócios. Frias consi<strong>de</strong>rava que Loureiro conduzia mal<br />
alguns negócios e <strong>de</strong>cidiu <strong>de</strong>ixar o banco.<br />
No dia seguinte ao rompimento, começavam<br />
outros tempos difíceis para Frias. Primeiro, caiu <strong>de</strong><br />
um cavalo e quase fraturou a espinha. Ficou seis<br />
meses engessa<strong>do</strong>. Depois, apenas algumas semanas<br />
após se recuperar, sofreu um <strong>de</strong>sastre automobilístico.<br />
O carro que dirigia entrou na traseira <strong>de</strong><br />
um caminhão para<strong>do</strong>, sem sinalização, na Via<br />
Dutra. Morreram Zuleika Lara <strong>de</strong> Oliveira, sua<br />
primeira mulher, e o irmão, José.<br />
Sem dinheiro, sem mulher e sem opções, já que<br />
não recebera nenhuma oferta <strong>de</strong> emprego, não lhe<br />
restava outra alternativa senão começar outra vez<br />
<strong>do</strong> zero. Frias dizia que as pessoas viravam a esquina<br />
para não cruzar com ele. Estava com a imagem<br />
queimada, ainda por causa <strong>do</strong>s maus negócios <strong>do</strong><br />
BNI. Ele lembra que andava na Rua da Consolação,<br />
com as mãos no bolso, quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>cidiu retomar<br />
as operações da Transaco. Começou a ven<strong>de</strong>r<br />
assinaturas justamente da Folha. Em apenas <strong>do</strong>is<br />
meses, já eram 6 mil novas assinaturas por mês, e<br />
Frias ficava com 30% <strong>do</strong>s valores. Nessa época, ele<br />
conheceu Dagmar <strong>de</strong> Arruda Camargo, sua futura<br />
esposa, com quem teria os filhos Otávio, Diretor<br />
<strong>de</strong> Redação da Folha, Maria Cristina, que escreve<br />
sobre economia no jornal, e Luís, Presi<strong>de</strong>nte<br />
<strong>do</strong> Grupo Folha, além da médica Maria Helena,<br />
filha <strong>do</strong> primeiro casamento <strong>de</strong> Dagmar. Beth, a<br />
filha que a<strong>do</strong>tara com Zuleika, foi morar com a<br />
irmã <strong>do</strong> empresário, Maria Carlota.<br />
FOTOS: FOLHA IMAGEM