Edição Especial do Centenário - Associação Brasileira de Imprensa
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OCTÁVIO FRIAS, O EMPRESÁRIO COM ALMA DE REPÓRTER<br />
74<br />
emissoras no Rio <strong>de</strong> Janeiro, Minas Gerais e Rio<br />
Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul. A empreitada não durou mais que<br />
<strong>do</strong>is anos, pois com a <strong>de</strong>sistência <strong>de</strong> Cal<strong>de</strong>ira os<br />
sócios <strong>de</strong>ixaram o projeto <strong>de</strong> la<strong>do</strong>. Enquanto isso,<br />
a Folha crescia em circulação e melhorava sua<br />
participação no merca<strong>do</strong> publicitário.<br />
MORANDO NA REDAÇÃO<br />
Após a morte <strong>de</strong> Frias, em abril <strong>de</strong> 2007, aos 94<br />
anos, muita gente se <strong>de</strong>rramou em elogios copiosos<br />
ao publisher <strong>do</strong> Grupo Folha. Situação diferente<br />
<strong>do</strong> que aconteceu no começo <strong>do</strong> regime militar,<br />
quan<strong>do</strong> seu jornal foi alvo <strong>de</strong> duras críticas. Como<br />
outros órgãos da gran<strong>de</strong> imprensa, a Folha apoiou<br />
o golpe <strong>de</strong> 1964. E entre 1968 e 1973, os anos mais<br />
duros da repressão, a<strong>do</strong>tou aquilo que chamou <strong>de</strong><br />
“imparcialida<strong>de</strong> acrítica”, não sofren<strong>do</strong> a mesma<br />
censura a que eram submeti<strong>do</strong>s outros veículos.<br />
Nesse perío<strong>do</strong>, alguns caminhões <strong>do</strong> jornal foram<br />
usa<strong>do</strong>s por equipes <strong>do</strong> Doi-Codi (Destacamento<br />
<strong>de</strong> Operações Internas-Centro <strong>de</strong> Operações <strong>de</strong><br />
Defesa Interna) para operações <strong>de</strong> repressão e o jornal<br />
tornou-se alvo <strong>de</strong> atenta<strong>do</strong>s da guerrilha.<br />
Frias e sua família passaram a ser<br />
ameaça<strong>do</strong>s <strong>de</strong> morte.<br />
“Queimaram três caminhões da Folha.<br />
Fomos morar no prédio <strong>do</strong> jornal, da<br />
morte <strong>do</strong> Lamarca, em setembro <strong>de</strong> 1971,<br />
a fevereiro <strong>de</strong> 1972”, revela Frias Filho.<br />
Apesar da amiza<strong>de</strong> entre Cal<strong>de</strong>ira e o<br />
então Secretário <strong>de</strong> Segurança Pública,<br />
Coronel Erasmo Dias, Frias Filho acredita<br />
que as ações com os caminhões <strong>do</strong> jornal<br />
foram feitas à revelia <strong>de</strong> seu pai e até<br />
<strong>do</strong> próprio Cal<strong>de</strong>ira.<br />
A partir <strong>de</strong> 1973, a Folha a<strong>do</strong>tou uma<br />
posição política mais in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e afirmativa.<br />
Com a situação financeira consolidada,<br />
era o momento <strong>de</strong> investir na Redação.<br />
Para tanto, contava com Cláudio<br />
Abramo, que reformulou o jornal e criou,<br />
entre outras coisas, a seção <strong>de</strong> opinião nas<br />
páginas 2 e 3. Enquanto a 2 trazia os editoriais<br />
<strong>do</strong> veículo, a 3 era reservada para a<br />
seção Tendências / Debates, publican<strong>do</strong><br />
textos contra e a favor <strong>do</strong> regime e abrin<strong>do</strong><br />
espaço mesmo para persegui<strong>do</strong>s.<br />
Apesar <strong>de</strong> ser força<strong>do</strong> a recuar em 1977,<br />
sob ameaça <strong>de</strong> fechamento <strong>do</strong> jornal e<br />
prisão <strong>do</strong> publisher, <strong>de</strong>pois da publicação <strong>de</strong><br />
uma crônica <strong>de</strong> Lourenço Diaféria, Herói.<br />
Morto. Nós, a qual fazia uma crítica velada<br />
aos militares, a Folha inaugurou um<br />
padrão que seria copia<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s os gran<strong>de</strong>s<br />
jornais. Apoia<strong>do</strong> por Frias, Abramo<br />
também reuniu um time <strong>de</strong> talentosos<br />
jornalistas e colunistas como Jânio <strong>de</strong> Freitas,<br />
Paulo Francis, Tarso <strong>de</strong> Castro, Gláuber<br />
Rocha, Flávio Rangel, Alberto Dines,<br />
Mino Carta, Osval<strong>do</strong> Peralva, Luiz Alberto<br />
Bahia e Fernan<strong>do</strong> Henrique Car<strong>do</strong>so.<br />
“Se houve erros nos primeiros anos, nos últimos<br />
a Folha cumpriu papel importante para que a abertura<br />
e a re<strong>de</strong>mocratização <strong>de</strong>ssem certo. Em agosto<br />
<strong>de</strong> 1977, relatório <strong>do</strong> Serviço Nacional <strong>de</strong> Informações<br />
dizia que o jornal tinha o esquema <strong>de</strong> infiltração<br />
mais bem monta<strong>do</strong> da gran<strong>de</strong> imprensa para<br />
isolar o Governo da mídia. Mesmo assim, Frias com<br />
sua filosofia pluralista e <strong>de</strong> isenção bancou a linha<br />
editorial”, diz o jornalista Engel Paschoal.<br />
Nos anos <strong>de</strong> 1983 e 1984, essa posição chegou ao<br />
ápice com o apoio da<strong>do</strong> ao Movimento Diretas Já.<br />
“Sem a posição <strong>do</strong> Frias não teria existi<strong>do</strong> o<br />
movimento nem as greves no ABC paulista alcançariam<br />
a mesma repercussão no final <strong>do</strong>s anos 70.<br />
Ele conseguiu fazer da Folha <strong>de</strong> S. Paulo uma pu-<br />
Jornal da ABI<br />
blicação quase obrigatória para aqueles que queriam<br />
ler uma imprensa isenta e crítica. Mesmo<br />
pautan<strong>do</strong>-se para não ser chapa-branca, reconhecia<br />
naquele tempo aquilo que o Governo fazia”, diz<br />
o Presi<strong>de</strong>nte Luiz Inácio Lula da Silva.<br />
Situação semelhante aconteceu durante o Governo<br />
Collor, já nos anos 90, quan<strong>do</strong> o jornal foi<br />
o primeiro a pedir o impeachment <strong>do</strong> Presi<strong>de</strong>nte,<br />
apesar <strong>de</strong> apoiar suas propostas <strong>de</strong> liberalização<br />
econômica.<br />
FUROS E POLÊMICAS<br />
Na década <strong>de</strong> 80, a Folha passou por mais uma<br />
gran<strong>de</strong> reestruturação. Com orientação <strong>de</strong> Frias, o<br />
jornal introduziu novos sistemas <strong>de</strong> produção, pla-<br />
olume<br />
2<br />
dição special <strong>do</strong> entenário<br />
FOLHA IMAGEM/EVELSON DE FREITAS<br />
FOLHA IMAGEM/PAULO GIANDALIA<br />
Durante a inauguração <strong>do</strong> Centro<br />
Tecnológico Gráfico da Folha em 1995, o<br />
Presi<strong>de</strong>nte Fernan<strong>do</strong> Henrique Car<strong>do</strong>so<br />
folheia uma edição especial que acabara <strong>de</strong><br />
ser impressa. Acima, Octávio Frias e seus<br />
filhos Luís e Otávio participam <strong>de</strong> um almoço<br />
<strong>de</strong> confraternização <strong>de</strong> fim <strong>de</strong> ano, em 1999.<br />
nejamento com metas <strong>de</strong>terminadas, treinamento,<br />
controle <strong>de</strong> custos, avaliação <strong>do</strong><br />
<strong>de</strong>sempenho da Redação e padronização<br />
<strong>do</strong>s textos. Novida<strong>de</strong>s no meio jornalístico,<br />
mas também razão para muitos <strong>de</strong>bates<br />
e polêmicas.<br />
De uma forma ou <strong>de</strong> outra, em 1986<br />
a Folha se tornaria o jornal brasileiro <strong>de</strong><br />
maior circulação, posição que mantém<br />
até hoje. Entusiasta da pesquisa <strong>de</strong> opinião,<br />
Frias ainda criou o instituto <strong>de</strong> pesquisas<br />
Datafolha e montou em 1995 o<br />
maior e mais avança<strong>do</strong> parque gráfico da<br />
América Latina, um projeto orça<strong>do</strong> em<br />
US$ 120 milhões.<br />
Em 1991, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> rompimento da<br />
socieda<strong>de</strong> que mantinha com Cal<strong>de</strong>ira,<br />
Frias tornou-se <strong>do</strong>no único <strong>do</strong> Grupo Folha,<br />
que além <strong>do</strong> jornal, <strong>do</strong> Datafolha e da<br />
indústria gráfica Plural ainda abrange os<br />
jornais Agora, campeão <strong>de</strong> vendas em bancas<br />
no Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo, o Valor Econômico,<br />
lança<strong>do</strong> em parceria com as Organizações<br />
Globo, o Alô Negócios, maior jornal<br />
<strong>de</strong> Curitiba, PR, em número <strong>de</strong> classifica<strong>do</strong>s,<br />
a editora <strong>de</strong> livros Publifolha, o Banco<br />
<strong>de</strong> Da<strong>do</strong>s da Folha, a agência Folhapress,<br />
a São Paulo Distribuição e Logística, em<br />
parceria com o Grupo Esta<strong>do</strong>, a Transfolha<br />
e o Universo Online-Uol, principal prove<strong>do</strong>r<br />
<strong>de</strong> conteú<strong>do</strong> e <strong>de</strong> acesso à internet no País.<br />
Apesar <strong>de</strong> insistir até o fim da vida que era<br />
empresário e não repórter, Frias dava seus furos <strong>de</strong><br />
vez em quan<strong>do</strong>. Em março <strong>de</strong> 1985, por exemplo,<br />
foi ele quem trouxe a notícia <strong>de</strong> que o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />
saú<strong>de</strong> <strong>do</strong> Presi<strong>de</strong>nte eleito Tancre<strong>do</strong> Neves era<br />
muito mais grave <strong>do</strong> que afirmavam médicos e<br />
autorida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> novo Governo. Mas muito mais<br />
bombásticas <strong>do</strong> que essas notícias eram as <strong>de</strong>clarações<br />
que costumava dar com toda a franqueza<br />
nas entrevistas que concedia. A última, em 2003,<br />
foi sobre o endividamento da mídia brasileira:<br />
“O que interessa ao Governo é a mídia <strong>de</strong> joelhos.<br />
Não uma mídia morta. Uma mídia in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />
não interessa a governo nenhum.”