PDF - Leitura Gulbenkian - Fundação Calouste Gulbenkian
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ternet tenha crianças a cantar, tenha canções, tenha o relato de crianças do<br />
Cuito sobre a sua própria guerra, tenha toda uma iconografia, tenha sons<br />
de uma canoa a atravessar um rio; portanto, há palavras e há narrativas que<br />
completam a própria narrativa que está no papel.<br />
Isto porque, voltando à noção de viagem e dos mecanismos de curiosidade,<br />
na literatura infantil, e em qualquer boa obra literária, às vezes é quase impossível<br />
distinguir o que é para um nível de conhecimento adulto ou não.<br />
É importante ter a noção de que viajar é percorrer um determinado mapa,<br />
uma determinada cartografia, não é aquele mapa de x graus norte, x graus<br />
este ou oeste, aquele mapa, diríamos, aquele mapa político; tem a ver com<br />
cartografias íntimas, pessoais, que nos põem em relação com o outro. E<br />
essa é uma cartografia feita de palavras e, portanto, a viagem não é, na<br />
Internet ou no terreno, um sítio, não é um site, neste aspecto. A viagem é<br />
muito mais um momento. A viagem é quando se dá um encontro e quando<br />
estamos abertos para esse encontro e isso acontece naquele momento,<br />
naquele instante.<br />
Não sei se é essa a experiência da Luísa. Por exemplo, até a experiência<br />
dos chats, até a experiência de consultar coisas na Internet, às vezes tentamos<br />
repeti-las e já não estão lá.<br />
Os postais que recebemos pela Internet em vez de recebermos pelo correio<br />
normal! Parece que a palavra fugiu! Mas a palavra existiu, mesmo que já<br />
não exista, mas nós sabemos que existiu porque, apesar de irmos ao sítio<br />
dessa palavra, que não está lá, nós lembramos o encontro que a tornou<br />
possível, portanto houve esse momento, houve esse instante em que nós<br />
interceptámos a nossa curiosidade, o nosso saber, a informação disponível<br />
com outra pessoa.<br />
Isto é, digamos, o mecanismo base da viagem e, por isso, em termos do<br />
que é produzido em papel, toda a história da literatura de viagens, da boa<br />
literatura de viagens, é riquíssima em termos de encontro do autor com o<br />
outro e quando isso não acontece, quando o autor é estanque a toda a interacção,<br />
a toda a comunicação, então produzimos coisas de um exotismo<br />
ou de um grande narcisismo.<br />
A importância da palavra para construir um espaço torna-se cada vez menos<br />
óbvia, precisamente para a nossa parte do mundo, que vivemos com<br />
este paradigma da rede de Internet e da ilusão do acesso a todo o tempo,<br />
XVI Encontro de Literatura para Crianças<br />
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