PDF - Leitura Gulbenkian - Fundação Calouste Gulbenkian
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fazer nada!<br />
É claro que há aqui um sentido imediato e que, no contexto da cultura<br />
grega, queria dizer “o espaço da ausência de uma ocupação manual para<br />
fazer uma outra coisa”.<br />
Mas, eu entendo isso talvez de uma outra forma que não é oposta, mas que<br />
a completa; “não fazer nada”, significa hoje, e talvez em qualquer momento,<br />
“silenciar os ruídos”, “calar este tumulto dos pragmatismos, das aparentes<br />
finalidades para tentar ouvir, ver e amar aquilo que se revela como amável,<br />
audível e visível”. Na verdade, para isso é preciso um grande ascetismo,<br />
porque calar os ruídos é muito difícil. Não apenas para o professor, mas<br />
para os alunos.<br />
Ora, o que me parece é que há, neste nosso debate, dois níveis distintos:<br />
um que assenta nesse aspecto muito pragmático, muito vivido, muito respeitável,<br />
por ser vivido, por ir ao encontro do que se experiencia; e outro<br />
que procura pensar ou dar a ver aquilo para o que deve tender a nossa<br />
viagem. Saber o que é, e como estabelecer o porto, para o qual a nossa<br />
viagem da descoberta com o outro se deve dirigir.<br />
Eu devo dizer que por mais respeito que eu tenha pelas dificuldades pessoais,<br />
concretas, que cada um de nós vai encontrando na escola primária,<br />
no liceu ou na faculdade, não consigo desligar isso dessa formulação principal,<br />
original, que é: qual o país para onde vamos?<br />
Por isso, há pouco, a minha intenção não era apenas dizer, à boa maneira<br />
grega, que lástima são os alunos da faculdade. Não! Também na faculdade<br />
há um exercício de descoberta intensa, de dar a ver. Também aí estamos a<br />
amar ou a dar a ver.<br />
Já que a Olga falou do Steiner, há uma expressão do Steiner, no início de<br />
um curso, que muito me tocou. Numa aula, o Steiner disse ao entrar: “sobre<br />
esta matéria eu sei infinitamente mais do que os senhores. Sei muito<br />
mais! O meu objectivo, é que, no final do ano, se invertam as posições”.<br />
E isso significa que há a assunção de uma responsabilidade, de um saber<br />
que compete ao professor. Sou um pouco heterodoxo quando se fala nos<br />
didactismos, na interactividade, soa nos meus ouvidos como uma espécie<br />
de capitulação perante o movimento.<br />
Quer dizer o que é preciso é: que se mexam, interajam. Penso que não há<br />
interacção maior do que a do aluno que está atentamente a ouvir aquilo que<br />
o professor diz e que é, se for bom, profundamente interpelativo e, nesse<br />
sentido, muitíssimo interactivo.<br />
Vi, há pouco tempo, num manual, que para se falar do aspecto coercivo<br />
da lei, se devia desenhar três quadradinhos de banda desenhada em<br />
que num está, uma Eva pudicamente tapada com três parras; no outro um<br />
Adão igualmente pudicamente tapado, mas só com uma parra, e num terceiro<br />
quadrado, um ancião de costas, com os braços abertos e um cajado<br />
XVI Encontro de Literatura para Crianças<br />
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