Revista Sinais Sociais N16 pdf - Sesc
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estou muito emocionada, achei o trabalho fantástico, você conseguiu<br />
fazer um espetáculo belíssimo sem nenhum ator ou bailarino.” A coreógrafa<br />
logo retrucou: “Eles são todos atores e bailarinos.” A moça logo<br />
retificou o que disse, explicando que se referia a bailarinos famosos,<br />
visto que alguns projetos colocavam a Ana Botafogo para dançar com<br />
as bailarinas. E seguiu se justificando. Tarde demais.<br />
Diário de campo (12 de março de 2003)<br />
3.2 AS AULAS DE DANÇA<br />
As aulas acontecem durante todo o dia, várias turmas entram e<br />
saem, ocupam os corredores e a cozinha, conversam, se arrumam ou<br />
se desarrumam, dependendo da aula a ser feita.<br />
Uma das aulas observadas foi a de dança contemporânea, ministrada<br />
por professor formado pela própria companhia. A inserção dos<br />
alunos no ensino da dança é uma característica destacada pelo professor:<br />
“Depois de toda a nossa vivência, nós devemos ser agentes multiplicadores.<br />
Não dá para ficar somente dançando e se apresentando.”<br />
Essa prática possui outros desdobramentos, pois esse mesmo professor<br />
também trabalha em outros projetos sociais e centros culturais.<br />
A fala do professor sugere algumas pistas, que se evidenciaram no<br />
decorrer da análise. A ideia de multiplicação revela um caráter de missão,<br />
isto é, de um dever a cumprir. Uma missão de transformação da<br />
realidade social, ou uma missão religiosa que envolve a disseminação<br />
de uma crença. Existe uma construção ideológica do esquema temporal,<br />
em que, como aponta Ansart (1978), o passado, o presente e o<br />
futuro se coordenam e proporcionam à ação presente uma plenitude<br />
de significados. A ideia de evolução, numa perspectiva de esquerda, se<br />
baseia num esquema de invalidação do passado, que sublinha toda a<br />
gênese da injustiça e da exploração social que se pretende erradicar. O<br />
que o professor quer é transformar a realidade social, criar alternativas<br />
contra o recrudescimento da miséria e da segregação racial e social.<br />
A dança, portanto, ainda não deixou de ser associada a aspectos<br />
funcionais. Por que “não dá para ficar somente dançando e se apresentando”?<br />
Mesmo que todo o processo seja temperado por momentos<br />
lúdicos e artísticos, isso é silenciado no discurso, ressurgindo, porém,<br />
no significado de sua prática no dia a dia.<br />
120 SINAIS SOCIAIS | RIO DE JANEIRO | v.5 nº16 | p. 108-141 | MAIO > AGOSTO 2011