Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
erro” (1929) nos <strong>de</strong>paramos com um <strong>Mário</strong> b<strong>em</strong> mais próximo do inconsciente<br />
freudiano, ainda que utilize, por momentos, o termo subconsciente.<br />
No meio da minha literatura, s<strong>em</strong>pre tão intencional, a crônica era um sueto, a<br />
válvula verda<strong>de</strong>ira por on<strong>de</strong> eu me <strong>de</strong>sfatigava <strong>de</strong> mim. Também é certo que<br />
jamais lhe <strong>de</strong>i maior interesse que o momento breve <strong>em</strong> que, com ela, brincava<br />
<strong>de</strong> escrever. 315<br />
Assim inicia <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> a “Advertência” ao seu livro <strong>de</strong> crônicas Os filhos da<br />
Candinha. É no encontro com este <strong>Mário</strong> menos intencional, mais <strong>de</strong>scansado <strong>de</strong> sua<br />
auto-crítica, que ir<strong>em</strong>os buscar uma relação com o inconsciente freudiano, através dos<br />
atos falhos.<br />
A crônica “Na sombra do erro” relata casos ocorridos com o próprio autor <strong>de</strong><br />
confusões, equívocos relacionados com a troca <strong>de</strong> nomes. Dessas “confusões<br />
permanentes” recorda a sua dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> distinguir entre a farinha <strong>de</strong> milho e a<br />
farinha <strong>de</strong> mandioca. “Des<strong>de</strong> minha mais tenra infância que minha mãe me ensinava a<br />
distinguir estas farinhas, mas até hoje um recalque inabalável as conserva s<strong>em</strong><br />
batismo <strong>em</strong> mim”. 316 É no pai que encontra o consolo por não po<strong>de</strong>r “falar a língua<br />
das farinhas”, pois este, que era “um hom<strong>em</strong> <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>”, passou a vida s<strong>em</strong> saber<br />
diferenciar qual era o lado mais doce da laranja, ainda que saboreasse a fruta todos os<br />
dias. Em seguida, o episódio que ganha relevo na crônica diz respeito a uma troca <strong>de</strong><br />
nomes e personalida<strong>de</strong>s. Conta que estava conversando com um amigo quando este se<br />
refere à nona sinfonia <strong>de</strong> Beethoven; interrompe-o, afirmando que a nona sinfonia é<br />
<strong>de</strong> Mozart. Nasce uma discussão entre os dois que <strong>de</strong>ixa nosso protagonista irritado<br />
“pela corag<strong>em</strong> do leiguinho me contradizer a mim, profissional da área”. 317 O amigo<br />
pronunciava Beethoven, ele ouvia e imaginava Beethoven, mas “meu espírito traduzia<br />
Mozart” e dizia Mozart, ainda que soubesse que qu<strong>em</strong> compôs a nona sinfonia fora<br />
Beethoven. Ao final, revela que durante vários dias foi terrível o seu sofrimento,<br />
imaginando que estaria ficando louco.<br />
É interessante que, <strong>em</strong>bora numa passag<strong>em</strong> relata ter “uma m<strong>em</strong>ória muito<br />
fraca”, o que po<strong>de</strong>ria justificar certos esquecimentos, logo <strong>em</strong> seguida apresentará o<br />
evento acima referido como “um dos inci<strong>de</strong>ntes mais aborrecidos que me suce<strong>de</strong>ram e<br />
315 <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Os filhos da Candinha, p. 09.<br />
316 Id<strong>em</strong>, p.105.<br />
317 Id<strong>em</strong>, p. 107.<br />
133