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Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

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obra está sendo traduzida <strong>em</strong> todas as línguas e foi, no ano passado, um dos maiores<br />

sucessos <strong>de</strong> livraria na Al<strong>em</strong>anha – o juiz Lindsey, qu<strong>em</strong> sabe está mais para Freud,<br />

como Freud para Comte e Comte para Kant. A história do pensamento mo<strong>de</strong>rno não é<br />

mais do que uma hecatombe <strong>de</strong> ídolos. Per<strong>de</strong>u-se a fé no pensamento: ficou apenas a<br />

superstição nos pensadores.<br />

E essa superstição freudiana, que hoje se espalha pelo mundo, como a mais<br />

excitante das infra-ciências dos nossos dias, contém <strong>em</strong> si própria o gérmen <strong>de</strong> sua<br />

futura dissolução.<br />

Basta seguir com um pouco <strong>de</strong> atenção essa série <strong>de</strong> libertações sucessivas<br />

para se ver como todo aquele que se insurge contra a verda<strong>de</strong> é negado pelos próprios<br />

partidários que provoca. E o resultado é esta imensa anarquia do pensamento<br />

cont<strong>em</strong>porâneo, esse libertarismo incondicional, essa redução <strong>de</strong> todas as coisas ao<br />

simples arbítrio individual. A marca do mundo cont<strong>em</strong>porâneo e muito especialmente<br />

do mundo do pensamento é uma marcha ao individualismo e, portanto, ao relativismo<br />

universal. Até que chega o momento das restaurações violentas do equilíbrio pela<br />

negação radical <strong>de</strong>sse mesmo individualismo relativista <strong>em</strong> matéria social e mesmo<br />

<strong>em</strong> matéria individual. Pois o ateísmo oficial russo ou mexicano é uma tentativa <strong>de</strong><br />

efração da consciência, uma <strong>de</strong>capitação <strong>em</strong> nome da liberda<strong>de</strong>, uma negação do<br />

indivíduo pelo amor excessivo ao indivíduo.<br />

E <strong>em</strong> qualquer <strong>de</strong>les tocamos vivamente aquela transição que apontamos entre<br />

a animalização do hom<strong>em</strong> no século XIX e a sua divinização no século XX, sendo<br />

esta a própria conseqüência daquela. O hom<strong>em</strong> fez da sua volta ao animal um motivo<br />

<strong>de</strong> orgulho e seu primeiro cuidado foi tomar o posto <strong>de</strong> Deus na hierarquia do<br />

universo, fazendo-se um <strong>de</strong>us. E daí aquilo que parecia um paradoxo e era apenas o<br />

fruto da mais superficial observação – a divinização do hom<strong>em</strong> pela sua animalização.<br />

Em Freud tocamos vivamente essa monstruosida<strong>de</strong> típica do hom<strong>em</strong>-século<br />

XX. Toda a sua atual pretensão metapsicológica, que suce<strong>de</strong>u às fases sucessivas <strong>de</strong><br />

medicina, <strong>de</strong> psiquiatria e <strong>de</strong> psicologia – é uma tentativa <strong>de</strong> passar do que há <strong>de</strong><br />

animal no hom<strong>em</strong> ao que há <strong>de</strong> divino. Até a poucos anos toda sua doutrina girava <strong>em</strong><br />

torno do Lust-prinzip, do princípio da concupiscência. Hoje <strong>em</strong> dia ele se coloca<br />

jenseits <strong>de</strong>s Lust-prinzip, para além do princípio <strong>de</strong> concupiscência, como o seu<br />

patrono, Nietszche se colocava para além do princípio do b<strong>em</strong> e do mal. E da mesma<br />

forma que Nietszche chegou por ele à sua doutrina do Uber-Mensh, Freud chegou<br />

hoje <strong>em</strong> dia à sua doutrina do Uber-Ich, que é atualmente sua gran<strong>de</strong> preocupação. E<br />

daí a atenção consi<strong>de</strong>rável que t<strong>em</strong> <strong>de</strong>dicado ao probl<strong>em</strong>a religioso.<br />

Não que haja propriamente gran<strong>de</strong> originalida<strong>de</strong> na sua posição <strong>em</strong> face <strong>de</strong>le.<br />

Mas foi por pren<strong>de</strong>r o seu próprio psicologismo à escola antropologista <strong>de</strong> psicologia<br />

religiosa do século XIX, que ele julgou passar do puro sexualismo <strong>de</strong> início ao seu<br />

atual pan-egotismo, à procura do “super-eu”. E há mesmo qu<strong>em</strong> julgue que só com<br />

isso é que sua doutrina adquire importância e significação para os nossos t<strong>em</strong>pos.<br />

“La theorie <strong>de</strong> Freud”, escreve um jov<strong>em</strong> pensador francês, <strong>em</strong> sua ensaio <strong>de</strong><br />

crítica vigorosa ao freudismo, - “ne s’inscrit pas parmi les grands systémes<br />

philosophiques; elle n’est qu’une psychologie perdue dans le mouv<strong>em</strong>ent matérialiste<br />

du XIX siécle. Une brêve mention l’eut saluée, si elle ne s’était d’autre part rattachée<br />

á l’école <strong>de</strong> philosophie religieuse qui, ouverte par Fontenelle et le prési<strong>de</strong>nt <strong>de</strong><br />

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