Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
permitiu. Therese ofereceu o rosto a Kevin Head. Os garotos olharam para a c<strong>as</strong>a através d<strong>as</strong><br />
janel<strong>as</strong> embaçad<strong>as</strong> pelo vapor. O sr. Lisbon já tinha voltado e uma luz estava acesa no quarto<br />
do c<strong>as</strong>al.<br />
“A gente leva vocês até a porta”, disse Parkie Denton.<br />
“Não precisa”, Mary respondeu.<br />
“Por que não?”<br />
“Não e pronto.” Ela saiu do carro sem dar um mero aperto de mão.<br />
“A gente se divertiu muito”, disse Therese do banco de trás. Bonnie cochichou no ouvido<br />
de Joe Hill Conley: “Me liga?”.<br />
“Com certeza.”<br />
As port<strong>as</strong> do carro se abriram com um rangido. As menin<strong>as</strong> saíram, se aprumaram e<br />
entraram em c<strong>as</strong>a.<br />
O Tio Tucker tinha acabado de tomar o rumo da geladeira da garagem para pegar outro<br />
pacote com seis lat<strong>as</strong> de cerveja quando o táxi chegou, du<strong>as</strong> hor<strong>as</strong> mais tarde. Vimos Lux sair<br />
e remexer a bolsa atrás da nota de cinco dólares que a sra. Lisbon tinha dado a cada uma d<strong>as</strong><br />
lh<strong>as</strong> antes de partirem, naquela noite. “Sempre tenham o dinheiro do táxi” era o seu lema,<br />
embora aquela tenha sido a primeira vez que ela deixou <strong>as</strong> menin<strong>as</strong> saírem e, <strong>as</strong>sim, a<br />
primeira vez que precisaram dele. Lux nem esperou pelo troco. Saiu às press<strong>as</strong> pelo gramado,<br />
com o vestido erguido, olhando para o chão. A parte de trás do c<strong>as</strong>aco estava suja de branco.<br />
A porta da frente se abriu e o sr. Lisbon saiu na varanda. Estava sem paletó, m<strong>as</strong> continuava<br />
com a gravata cor de laranja. Desceu <strong>as</strong> escad<strong>as</strong> e se encontrou com Lux no meio do<br />
caminho. Ela começou a se desculpar, gesticulando muito. Baixou a cabeça ao ser<br />
interrompida pelo sr. Lisbon e, relutante, <strong>as</strong>sentiu. O Tio Tucker não lembra do momento<br />
exato em que a sra. Lisbon se juntou à cena. M<strong>as</strong> em algum ponto ele tomou consciência da<br />
música que tocava ao fundo e, olhando para a c<strong>as</strong>a, enxergou a sra. Lisbon parada na porta<br />
aberta. Estava com um roupão xadrez e segurava um drinque. A música soava atrás dela,<br />
cheia de órgãos reverberantes e harp<strong>as</strong> angelicais. Como começara a beber ao meio-dia, o<br />
Tio Tucker tinha qu<strong>as</strong>e chegado ao m da caixa de cerveja que consumia diariamente.<br />
Começou a chorar, olhando da garagem, enquanto a música preenchia a rua como o próprio<br />
ar. “Era o tipo de música que tocam quando alguém morre”, explicou.<br />
Era música religiosa, uma compilação dos três discos que a sra. Lisbon gostava de tocar<br />
vári<strong>as</strong> vezes seguid<strong>as</strong> aos domingos. Já tínhamos lido sobre ess<strong>as</strong> músic<strong>as</strong> no diário de Cecilia<br />
(“Domingo de manhã. Mamãe está ouvindo aquela porcaria de novo”), e meses mais tarde,<br />
quando os Lisbon foram embora, encontramos os discos no meio do lixo que eles deixaram<br />
perto do meio-o. Os discos eram — conforme relacionamos no Registro de Evidênci<strong>as</strong><br />
Físic<strong>as</strong> — Songs of Faith, de Tyrone Little and the Believers, Eternal Rapture, do Toledo<br />
Baptist Choir, e Singing Thy Praises, dos Grand Rapids Gospelers. Tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> cap<strong>as</strong> com<br />
nuvens perfurad<strong>as</strong> por raios de luz. Não colocamos os discos para tocar uma única vez. É o