Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
queriam. As menin<strong>as</strong> precisavam de um tempo para si mesm<strong>as</strong>. Uma mãe percebe ess<strong>as</strong><br />
cois<strong>as</strong>. Achei que se c<strong>as</strong>sem em c<strong>as</strong>a el<strong>as</strong> melhorariam mais rápido.” Nossa entrevista com a<br />
sra. Lisbon foi breve. Ela nos encontrou na estação rodoviária da cidadezinha onde mora<br />
atualmente, pois era o único lugar que servia café. Su<strong>as</strong> mãos estavam vermelh<strong>as</strong> e <strong>as</strong><br />
gengiv<strong>as</strong>, retraíd<strong>as</strong>. A tragédia não a havia tornado mais acessível, e na verdade lhe conferia a<br />
qualidade incognoscível de uma pessoa que sofreu mais do que pode ser expressado. Ainda<br />
<strong>as</strong>sim, queríamos falar com ela mais do que com qualquer outra pessoa, pois imaginávamos<br />
que, sendo a mãe d<strong>as</strong> menin<strong>as</strong>, entenderia melhor que os outros por que el<strong>as</strong> tinham se<br />
matado. M<strong>as</strong> ela disse: “Isso é o mais <strong>as</strong>sustador. Eu não entendo. Depois que saem de nós, <strong>as</strong><br />
crianç<strong>as</strong> viram pesso<strong>as</strong> diferentes, el<strong>as</strong> são <strong>as</strong>sim”. Quando perguntamos por que ela nunca<br />
recorreu ao acompanhamento psicológico oferecido pelo dr. Hornicker, a sra. Lisbon cou<br />
irritada. “Aquele médico queria colocar a culpa em nós dois. Ele achava que Ronnie e eu<br />
éramos culpados.” Então um ônibus chegou na rodoviária e, pela porta aberta do Portão 2,<br />
uma lufada de monóxido de carbono soprou sobre o balcão com pilh<strong>as</strong> de rosquinh<strong>as</strong> frit<strong>as</strong>. A<br />
sra. Lisbon disse que precisava ir embora.<br />
Ela tinha feito mais do que retirar <strong>as</strong> menin<strong>as</strong> da escola. No domingo seguinte, ao chegar<br />
em c<strong>as</strong>a depois de um sermão intenso na igreja, ordenou que Lux destruísse os discos de rock.<br />
A sra. Pitzenberger (que por coincidência estava redecorando um cômodo na c<strong>as</strong>a ao lado)<br />
ouviu a discussão acalorada. “Agora!”, a sra. Lisbon repetia enquanto Lux tentava argumentar<br />
e negociar, até explodir em lágrim<strong>as</strong>. Pela janela do corredor do andar de cima, a sra.<br />
Lutzenberger viu Lux caminhar decidida até o quarto e voltar com uma coleção de caixotes<br />
de madeira. Eram caixotes pesados, e Lux os fez deslizar pela escada como se fossem trenós.<br />
“Achei que ela ia deixar <strong>as</strong> caix<strong>as</strong> escorregarem até se estatelarem lá embaixo. M<strong>as</strong> ela sempre<br />
<strong>as</strong> segurava antes que isso acontecesse.” A sra. Lisbon tinha acendido a lareira na sala de estar,<br />
e Lux, agora chorando em silêncio, começou a entregar os discos às cham<strong>as</strong>, um por um.<br />
Nunca camos sabendo quais discos tinham sido condenados naquele auto de fé, m<strong>as</strong> ao que<br />
parece Lux ergueu um álbum após o outro, implorando a misericórdia da sra. Lisbon. Logo o<br />
cheiro cou insuportável e o plástico derreteu sobre o cão da lareira, de modo que a sra.<br />
Lisbon pediu para Lux parar. (Depois jogou fora o resto dos discos com o lixo da semana).<br />
Ainda <strong>as</strong>sim, Will Timber, que tinha saído para comprar um refri de uva, disse que sentiu o<br />
cheiro do plástico queimado durante todo o caminho até a Sr. Z, a loja de fest<strong>as</strong> na<br />
Kercheval.<br />
N<strong>as</strong> seman<strong>as</strong> que se seguiram, mal vimos <strong>as</strong> menin<strong>as</strong>. Lux nunca mais falou com Trip<br />
Fontaine, e Joe Hill Conley não ligou para Bonnie como tinha prometido. A sra. Lisbon levou<br />
<strong>as</strong> menin<strong>as</strong> até a c<strong>as</strong>a da avó para que recebessem conselhos de uma mulher idosa que já<br />
tinha p<strong>as</strong>sado por tudo. Quando telefonamos para ela em Roswell, no Novo México, para<br />
onde tinha se mudado depois de morar por quarenta e três anos na mesma c<strong>as</strong>a térrea, a idosa<br />
(sra. Lema Crawford) não respondeu às pergunt<strong>as</strong> sobre seu envolvimento no c<strong>as</strong>tigo, por