You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
seu salário com a qual se pagarão os deficits do futuro próximo. Não se<br />
anteveria nunca em tal cenário uma quebra da moeda com valor diverso de<br />
cinco vezes menos o seu valor actual.<br />
Talvez haja quem suporte isso… Mas o mais natural é aqui ficarem os<br />
funcionários públicos a devorarem-se uns aos outros. Quem não estiver preso a<br />
este território pela ignorância, sairá daqui, como manda o bom senso. E o<br />
movimento já começou, aliás. Gizam-se agora projectos de repressão do recurso<br />
ao comércio nos territórios vizinhos… Mas qualquer campino está em<br />
condições de explicar os perigos de fechar uma “saída natural”. Esta gente não<br />
conseguiria conduzir uma manada, sem deixar em perigo o êxito da<br />
incumbência e a vida própria. Que loucura lhes terá passado pela cabeça para<br />
imaginarem a viabilidade de dirigirem um Estado? Tais projectos de repressão<br />
além de traduzirem, com toda a verosimilhança, violação do Direito Europeu,<br />
são o modo mais prático de provocar, muito rapidamente, um êxodo maciço…<br />
Entre os que ainda ficaram estão minhotos e transmontanos já a trabalhar na<br />
Galiza ou em Leão. Fica perto e não há motivo para mudar de casa, salvos os<br />
aborrecimentos escusados com a polícia tributária. Porque aí começará toda<br />
uma outra questão. Toda a gente da raia vai fazer compras aos territórios<br />
vizinhos, isentando-se da usura fiscal nas necessidades da vida quotidiana.<br />
Grandes armazéns de Badajoz aceitam mesmo fazer as entregas em Lisboa (!...<br />
São muito simpáticos). Um número espantoso de portugueses comprou casa na<br />
Andaluzia, mas também em Pontevedra, Badajoz e em Cáceres. Sempre<br />
surpreendidos por tais casas custarem um quarto do preço que aqui custariam.<br />
O mercado imobiliário espanhol acusa mesmo a pressão do aumento da<br />
procura. Nenhum advogado consciente deixa de aconselhar os seus<br />
constituintes portugueses a estabelecerem-se comercialmente além fronteiras,<br />
quando o respectivo projecto o permita… Só um louco confiaria nisto.<br />
Nunca esqueci a constatação de um jornalista russo – um sábio – na crise que<br />
lhe flagelou o país no limiar do novo milénio. O “inverno da economia”<br />
libertou a Rússia dos parasitas. A um preço horrível, é verdade. Não se apagará<br />
facilmente dos meus olhos a imagem dos sem-abrigo na entrada do Metro, ali<br />
no fim da Nevski Prospect, mais ou menos em frente do Grande Lavra. Quando<br />
passei por eles estavam vinte e cinco graus negativos. Notei-lhes uma expressão<br />
de surpresa. Um ar de quem espera. Não tinham nada a ver com os sem abrigo<br />
das ruas de Lisboa, nem com o desalojado médio de entre os trinta milhões de<br />
americanos a viverem entre o gueto e o esgoto e quanto a quem a indústria<br />
cinematográfica americana vai difundindo a imagem romanceada com funções<br />
de anestésico. É-me difícil esquecer aqueles vultos. Vi a causa da dor sentida<br />
pelo jornalista a quem tão fria observação se deve. Mas o comentário é exacto. O<br />
Inverno da economia liberta dos parasitas. Não sei se os mata, mas eles<br />
desaparecem. E assim será também aqui.<br />
36