Um avião contorna o pé de jatobá e a nuvem de agrotóxico pousa ...
Um avião contorna o pé de jatobá e a nuvem de agrotóxico pousa ...
Um avião contorna o pé de jatobá e a nuvem de agrotóxico pousa ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
A secretária, mudando <strong>de</strong> assunto, falou das providências que o município<br />
estava tomando para conquistar o “selo ver<strong>de</strong>” <strong>de</strong> certificação ambiental<br />
da soja e lamentou a quebra da lavoura <strong>de</strong>vido aos preços internacionais do<br />
produto.<br />
Foram <strong>de</strong>poimentos muito ricos, cheio <strong>de</strong> <strong>de</strong>talhes que, provavelmente,<br />
eu jamais conseguiria se tivesse feito a opção <strong>de</strong> entrevistá-los individualmente.<br />
As professoras falaram da ONG Oluma e da educação ambiental nas<br />
escolas. Dá ida a campo dos estudantes, da visita à Central <strong>de</strong> Coleta <strong>de</strong> Embalagens<br />
<strong>de</strong> Agrotóxicos, dos questionamentos que faziam para tentar enten<strong>de</strong>r<br />
a realida<strong>de</strong> do agronegócio e da <strong>de</strong>vastação ambiental provocada pela monocultura.<br />
Muitos são filhos <strong>de</strong> fazen<strong>de</strong>iros e vêem seus pais utilizando enormes<br />
quantida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> veneno, explicou a professora Cleuza, enquanto eu saboriava<br />
um pedaço <strong>de</strong> queijo colonial com café.<br />
Osmar procurava fazer milagre para captar imagem e voz <strong>de</strong> todos na<br />
roda que só fazia aumentar. Tínhamos apenas dois microfones, sendo um <strong>de</strong><br />
lapela. Ele posicionou ambos sobre a mesa. Pedi-lhe que tirasse a câmera do<br />
tri<strong>pé</strong>, que fizesse closes e tomadas <strong>de</strong> diversos ângulos dos <strong>de</strong>batedores. Aquilo<br />
já havia se tornado um <strong>de</strong>bate e eu cumpria função <strong>de</strong> mediador. Quando via<br />
que a conversa amainava entrava com uma nova pergunta e eles reagiam.<br />
Quebro o silêncio contando uma história que se passou com um amigo,<br />
Rodolfo Segabinazzi, que cursava o último ano do curso <strong>de</strong> agronomia na<br />
época em que entrei na Escola Superior <strong>de</strong> Agricultura Luiz <strong>de</strong> Queiroz. Ele<br />
me contou que no final da década <strong>de</strong> 60 a revolução ver<strong>de</strong> estava se tornando<br />
moda: sementes híbridas, fertilizantes químicos, <strong>agrotóxico</strong>s, manejo do solo e<br />
rotação entre monoculturas, mecanização pesada, administração profissional<br />
da proprieda<strong>de</strong> – era o capitalismo entrando na nossa agricultura e implantando<br />
a tecnologia <strong>de</strong>senvolvida no Hemisfério Norte, como se nosso agricultor,<br />
nosso clima, nosso solo e nossa biodiversida<strong>de</strong> fossem as mesmas <strong>de</strong> lá. Os<br />
alunos eram ensinados a diagnosticar as doenças das plantas provocadas pela<br />
própria tecnologia utilizada no plantio e que promovia a quebra do equilíbrio<br />
ecológico, o impacto ambiental e a conseqüente proliferação <strong>de</strong> insetos e fungos<br />
vetores das doenças. Eram ensinados a receitar os produtos químicos por<br />
seus nomes comerciais e não pelos princípios ativos para combater as doenças.<br />
Eram treinados para serem ven<strong>de</strong>dores <strong>de</strong> adubos e pesticidas: “Se a doença<br />
é essa receite isso”, dizia o professor, e lá vinha o nome comercial do produto.<br />
Fizeram então uma experiência <strong>de</strong> campo. A turma foi dividida em diversas<br />
equipes – todas usavam o receituário da indústria <strong>de</strong> agroquímicos ao <strong>pé</strong> da le-<br />
99