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Luiz Guilherme Marinoni - Tribunal Regional Federal da 4ª Região

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Anote-se, contudo, que a ideologia <strong>da</strong> imprescindibili<strong>da</strong>de de imposição de limites ao legislativomediante uma lei maior pode ser vista já à época em que os colonizadores <strong>da</strong> América do Norte – que nãotinham representantes no Parlamento inglês – se revoltaram contra os tributos exigidos pelo governo <strong>da</strong>metrópole, mediante a alegação de que qualquer ato do Parlamento, contrário à equi<strong>da</strong>de natural, serianulo. 49 Com a independência <strong>da</strong>s colônias americanas, em 1776, as Cartas foram substituí<strong>da</strong>s pelas novasConstituições, e, como anteriormente os juízes já tinham a consciência e a prática de decretar a nuli<strong>da</strong>de<strong>da</strong>s leis que violassem as Cartas e a legislação do Reino inglês, tornou-se praticamente “natural” controlaras leis que contrariassem as Constituições dos estados que acabavam de adquirir independência. 50Mauro Cappelletti, em seu célebre Il controllo giudiziario di costituzionalità delle leggi nel dirittocomparato, conclui que a doutrina de Coke e, mais especificamente, a submissão do Parlamento aocommon law desapareceram com a Revolução de 1688 e com a instituição do princípio <strong>da</strong> supremacy ofthe parliament. No entanto, esta afirmação não parece correta, particularmente para o efeito queCappelletti tenta extrair desta “transformação” – que, bem vistas as coisas, não ocorreu. Eis o que dizCappelletti: “Tal doutrina [a de Coke] foi abandona<strong>da</strong> na Inglaterra com a Revolução de 1688, quandoentão foi proclama<strong>da</strong> a doutrina contrária – ain<strong>da</strong> hoje respeita<strong>da</strong> naquele país –, <strong>da</strong> supremacia doparlamento. Porém, <strong>da</strong> doutrina de Coke restaram os frutos, ao menos nos Estados Unidos, e estou mereferindo, como é óbvio, aos frutos que hoje são chamados de judicial review e supremacy of thejudiciary” . 51É certo que a doutrina de Coke, no seu particular significado de doutrina que <strong>da</strong>va ao juiz apenas opoder de declarar o common law, foi supera<strong>da</strong> na Inglaterra pela teoria constitutiva – desenvolvi<strong>da</strong>sobretudo por Bentham e Austin. 52 Contudo, com o devido respeito ao mestre italiano, a Revolução de1688 não fez desaparecer a noção de que o Parlamento e a lei são submetidos ao common law. Tambémnão é adequado sustentar que o juiz, a partir desse momento, passou a estar submetido ao legislativo,nem muito menos que o direito <strong>da</strong>s colônias passou a dever respeito unicamente à produção doParlamento.O Parlamento, com a Revolução Gloriosa, venceu longa luta contra o absolutismo do rei. Diante <strong>da</strong>preocupação em conter os arbítrios do monarca, os juízes sempre estiveram ao lado do Parlamento,chegando a com ele se misturar. Assim, aí não houve qualquer necessi<strong>da</strong>de de afirmar a prevalência <strong>da</strong> lei– como produto do Parliament – sobre os magistrados, mas sim a força do direito comum diante do poderreal. Ademais, a Revolução Puritana não objetivou destruir o direito antigo, mas, ao contrário, pautou-sepela afirmação do common law contra o rei.Assim, to<strong>da</strong> e qualquer norma elabora<strong>da</strong> pelo legislativo estaria inseri<strong>da</strong> dentro do common law, nabusca de afirmação dos direitos e liber<strong>da</strong>des do povo inglês contra o rei. 53 A Revolução, bem por isso, nãoteve a pretensão de elevar a lei a uma posição suprema ou a intenção de dotar o Parlamento de um poderabsoluto mediante a produção do direito.Mais do que à lei, foi necessário <strong>da</strong>r destaque ao common law – ou ao direito <strong>da</strong> história e <strong>da</strong>stradições do povo inglês – para conter o poder real. De modo que a ideia de supremacy of the English49 .GROTE, Rainer. Op. cit., p. 3.50.CAPPELLETTI, Mauro. Il controllo giudiziario di costituzionalità..., p. 41 e ss.51.Idem, p. 40.52 .MACCORMICK, Neil. Can stare decisis be abolished?, p. 204.53.ZAGREBELSKY, Gustavo. Il dirito mite – Legge, diritti, giustizia. Torino: Einaudi, 1992. p. 35.

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