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Luiz Guilherme Marinoni - Tribunal Regional Federal da 4ª Região

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acionalista pelo positivismo teve efeitos completamente diversos nos dois sistemas, tendo colaborado –certamente que em termos essencialmente teóricos – para a formação <strong>da</strong>s concepções antagônicas de jugebouche de la loi (juiz boca-de-lei) e de jugde make law (juiz legislador).Lembre-se, para tanto, que a admissão <strong>da</strong> tese de que o juiz cria o direito teve fun<strong>da</strong>mento nadoutrina positivista de Bentham, que não podia enxergar na decisão judicial a declaração de um direitopreexistente fun<strong>da</strong>do na natureza e na razão <strong>da</strong>s coisas, mas apenas a criação do direito.Neste sentido, para distinguir os sistemas, mesmo em suas origens, não basta falar que em um o juizcria o direito e no outro declara a lei, sendo imprescindível compreender que somente no common law ojuiz mereceu confiança e espaço na esfera de poder e que a afirmação de que o “juiz cria o direito”constitui um slogan de uma <strong>da</strong>s vertentes doutrinárias que se apresentaram neste sistema jurídico.Aliás, no que diz respeito a este último ponto, é bom rememorar que, no common law, ain<strong>da</strong> sediscute a respeito <strong>da</strong> natureza <strong>da</strong> jurisdição, se declaratória ou constitutiva. Tal questão foi objeto derecente e importante debate entre Herbert Hart 62 – que sustenta o papel criativo <strong>da</strong> jurisdição – e RonaldDworkin 63 – que o nega. Na ver<strong>da</strong>de, Dworkin é um dos integrantes de um poderoso e crescente núcleode pensamento engajado em negar a natureza positivista do precedente e em propor uma visão“interpretativista” para se compreender o common law, com a consequente reinserção no debate <strong>da</strong> teoriadeclaratória <strong>da</strong> jurisdição, ain<strong>da</strong> que, obviamente, sob uma roupagem contemporânea. 6410. O juiz como “bouche de la loi”Antes <strong>da</strong> Revolução Francesa, os membros do judiciário francês constituíam classe aristocrática nãoapenas sem qualquer compromisso com os valores <strong>da</strong> igual<strong>da</strong>de, <strong>da</strong> fraterni<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de –mantinham laços visíveis e espúrios com outras classes privilegia<strong>da</strong>s, especialmente com a aristocraciafeu<strong>da</strong>l, em cujo nome atuavam sob as togas. Nesta época, os cargos judiciais eram comprados e her<strong>da</strong>dos,o que fazia supor que o cargo de magistrado deveria ser usufruído como uma proprie<strong>da</strong>de particular,capaz de render frutos pessoais. 65Os juízes pré-revolucionários se negavam a aplicar a legislação que era contrária aos interessesdos seus protegidos e interpretavam as novas leis de modo a manter o status quo e a não permitir que asintenções progressistas dos seus elaboradores fossem atingi<strong>da</strong>s. Não havia qualquer isenção para“julgar”.62.HART, Herbert L. A. The concept of law. Oxford: Clarendon Press, 1993 (esp. Formalism and rule-scepticism ePostscrip).63.DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1978 (esp. The model of rules eHard cases); e Law’s empire. Cambridge: Harvard University Press, 1978.64.Ver BANKOWSKI, Zenon; MACCORMICK, Neil; MORAWSKI, Lech; MIGUEL, Alfonso Ruiz. Op. cit., p. 485.65.Lembre-se que Montesquieu, ao elaborar a tese de que não poderia haver liber<strong>da</strong>de caso o “poder de julgar” nãoestivesse separado dos poderes legislativo e executivo, partiu <strong>da</strong> sua própria experiência pessoal, pois conheciamuito bem os juízes <strong>da</strong> sua época. Montesquieu nasceu Charles-Louis de Secon<strong>da</strong>t em uma família demagistrados, tendo her<strong>da</strong>do do seu tio não apenas o cargo de Président à mortier no Parlement de Bordeaux,como o nome “Montesquieu”. O jovem Montesquieu, sem se deixar seduzir pelas facili<strong>da</strong>des <strong>da</strong> sua posiçãosocial, renunciou ao cargo de magistrado e teve a coragem de denunciar as relações espúrias dos juízes com opoder, idealizando a teoria <strong>da</strong> separação dos poderes (ver CAPPELLETTI, Mauro. Repudiando Montesquieu? Aexpansão e a legitimi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> justiça constitucional. Revista <strong>da</strong> Facul<strong>da</strong>de de Direito <strong>da</strong> UFRGS, vol. 20, p.269).

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