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Luiz Guilherme Marinoni - Tribunal Regional Federal da 4ª Região

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destruir o direito já existente, mas, ao contrário, confirmá-lo e fazê-lo valer contra um rei que não orespeitava. 56Portanto, em vez de pretender instituir um novo direito mediante a afirmação <strong>da</strong> superiori<strong>da</strong>de – naver<strong>da</strong>de absolutismo – do Parliament, nos moldes <strong>da</strong> Revolução Francesa, a Revolução Gloriosa instituiuuma ordem em que os poderes do monarca estivessem limitados pelos direitos e liber<strong>da</strong>des do povoinglês.Note-se que a noção de rule of law and not of men não significou apenas o topos aristotélico dogoverno <strong>da</strong>s leis em substituição ao governo dos homens, mas, sobretudo, a luta histórico-concreta que oparlamento inglês travou e ganhou contra o absolutismo. 57O ordenamento <strong>da</strong> Revolução Puritana caracterizou-se pela submissão do poder do monarca, em seuexercício e atuação, a determina<strong>da</strong>s condições, assim como pela existência de critérios reguladores <strong>da</strong>relação entre ele e o Parlamento. Neste ordenamento tem destaque o célebre Bill of Rights, editado noprimeiro ano <strong>da</strong> Revolução, em 1689, ao qual <strong>Guilherme</strong> de Orange foi obrigado a se submeter paraascender ao trono, mediante uma espécie de acordo entre o rei e o Parlamento, visto como representantedo povo. Frise-se que o Bill of Rights, embora tenha, entre seus princípios fun<strong>da</strong>mentais, a proteção <strong>da</strong>pessoa e <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de e determina<strong>da</strong>s garantias processuais e dimensões <strong>da</strong> liber<strong>da</strong>de política, émarcado, acima de tudo, pela submissão do soberano à lei. 58Não obstante a Revolução Inglesa tenha vencido o absolutismo, com ela o Parlamento não assumiu opoder absoluto, como aconteceu na Revolução Francesa. Como anota Gustavo Zagrebelsky, na tradição <strong>da</strong>Europa continental a luta contra o absolutismo significou a pretensão de substituir o rei por outro poderabsoluto, a Assembleia Soberana, ao passo que, na Inglaterra, a batalha contra o absolutismo consistiu emopor, às pretensões do rei, os privilégios e liber<strong>da</strong>des tradicionais dos ingleses, representados e defendidospelo Parlamento. 59Assim, enquanto na França o legislativo se revestiu do absolutismo por meio <strong>da</strong>produção <strong>da</strong> lei, na Inglaterra a lei representou, além de critério de contenção do arbítrio real, um elementoque se inseriu no tradicional e antigo regime do common law.Como a lei era imprescindível para a realização dos escopos <strong>da</strong> Revolução Francesa, e os juízes nãomereciam confiança, a supremacia do parlamento aí foi vista como sujeição do juiz à lei, proibido que foi,inclusive, de interpretá-la para não distorcê-la e, assim, frustrar os objetivos do novo regime. Aocontrário, tendo-se em vista que, na Inglaterra, a lei não objetivava expressar um direito novo, masrepresentava mero elemento introduzido em um direito ancestral (o qual, antes de merecer repulsa, eraancorado na história e nas tradições do povo inglês), e ain<strong>da</strong> que o juiz era visto como “amigo” do poderque se instalara (uma vez que sempre lutara, misturado ao legislador, contra o absolutismo do rei), nãohouve qualquer intenção ou necessi<strong>da</strong>de de submeter o juiz inglês à lei.Além de a lei jamais ter anulado o poder do juiz, os próprios princípios <strong>da</strong> Revolução Inglesa<strong>da</strong>vam-lhe condição para controlar os atos legislativos a partir do common law, já que o Parlamento,embora supremo diante do monarca, era àquele submetido. 60 Mas, na França – como ficará ain<strong>da</strong> mais56.ARGÜELLES, Juan Ramón de Páramo; ROIG, Francisco Javier Ansuátegui. Op. cit., p. 787.57.ZAGREBELSKY, Gustavo. Op. cit., p. 36 e ss.58 .ARGÜELLES, Juan Ramón de Páramo; ROIG, Francisco Javier Ansuátegui. Op. cit., p. 787-788.59.ZAGREBELSKY, Gustavo. Op. cit., p. 37.60.“Na base do acordo constitucional de 1688, o poder legislativo estava investido não em um governanteautocrático, mas em um órgão eleito, o que significava que o processo de law-making permanecera sujeitoao controle dos diferentes grupos e interesses representados no Parlamento. Além disso, as leis positiva<strong>da</strong>s[statutory enactments] tiveram um papel de menor importância no desenvolvimento geral do direito, o qual

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