Volume 1 - Robert Bresson - Via: Ed. Alápis
O Cinema da Universidade de São Paulo (CINUSP “Paulo Emílio”), órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, e o Centro Cultural São Paulo apresentam retrospectiva integral dos longas-metragens de Robert Bresson, cineasta francês entre os mais importantes nomes do cinema. Juntamente à mostra de filmes, editamos este presente catálogo, o primeiro volume da Coleção CINUSP, que visa aprofundar a temática das mostras colaborando para a formação da cinefilia do público jovem.
O Cinema da Universidade de São Paulo (CINUSP “Paulo Emílio”), órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, e o Centro Cultural São Paulo apresentam retrospectiva integral dos longas-metragens de Robert Bresson, cineasta francês entre os mais importantes nomes do cinema. Juntamente à mostra de filmes, editamos este presente catálogo, o primeiro volume da Coleção CINUSP, que visa aprofundar a temática das mostras colaborando para a formação da cinefilia do público jovem.
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inserem o espectador na ação, ainda que lhe neguem qualquer domínio<br />
cognitivo da cena. Nós não vemos nenhuma das personagens em sua<br />
totalidade, e nunca nos é mostrada a posição relativa de qualquer um<br />
dos elementos. Internamente construída por metonímias, a sequência<br />
cria uma tensão dialética sem depender de motivações psicológicas ou<br />
da construção de uma situação dramática familiar.<br />
Esta cena encontra eco mais tarde no filme em outra sequência<br />
onde caçadores atiram em coelhos que fogem correndo. Mais uma vez,<br />
<strong>Bresson</strong> nos lembra de uma cena no filme de Renoir – na metade de A<br />
Regra do Jogo – que descreve um ritual de abate de coelhos que prefigura<br />
o terror nazista. O ponto crucial do filme de <strong>Bresson</strong> é a sugestão de<br />
uma crueldade gratuita e de um voyeurismo. Pode-se argumentar que<br />
os repetidos closes de olhos na sequência de abertura operam como<br />
uma alegoria condensada para a perspectiva do espectador no filme.<br />
Alertando-nos para o nosso papel enquanto testemunhas silenciosas<br />
de uma tragédia na qual também estamos implicados, os olhos na<br />
folhagem nos advertem de que não haverá consciência capaz de se<br />
organizar para nos defender da brutalidade de fragmentos de uma vida<br />
tomada “em seu estado bruto”, sem interpretações simplistas para o<br />
que estamos vendo.<br />
Descrevendo o poder cru e revelador das imagens de <strong>Bresson</strong>,<br />
Iradj Azimi diz: “Um plano de <strong>Bresson</strong>, assim como uma incisão de<br />
Giacometti ou uma palavra de Mallarmé, é um rasgo no nada pela vida.<br />
Um rasgo imenso e irreparável”. A câmera de <strong>Bresson</strong>, assim, rasga as<br />
camadas do hábito, que nos protegem de verdades simples e muitas<br />
vezes dolorosas.<br />
O princípio da metonímia usado tão extensivamente por<br />
<strong>Bresson</strong> é um meio de contrapor-se ao que ele chama de “as potências<br />
falsas da fotografia”, que ele acredita produzirem “um clichê do real”. A<br />
figura retórica da metonímia na linguagem verbal é definida como o<br />
deslocamento de foco ou a substituição de um objeto por outro que é<br />
ligado ao primeiro por uma necessidade lógica ou proximidade física.<br />
<strong>Bresson</strong> muitas vezes usa a figura metonímica da sinédoque, em que a<br />
parte é tomada pelo todo. Um exemplo simples pode ser encontrado<br />
na maneira como ele evita establishing shots – os planos que orientam o<br />
espectador quanto ao contexto geral da cena – passando diretamente<br />
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