Volume 1 - Robert Bresson - Via: Ed. Alápis
O Cinema da Universidade de São Paulo (CINUSP “Paulo Emílio”), órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, e o Centro Cultural São Paulo apresentam retrospectiva integral dos longas-metragens de Robert Bresson, cineasta francês entre os mais importantes nomes do cinema. Juntamente à mostra de filmes, editamos este presente catálogo, o primeiro volume da Coleção CINUSP, que visa aprofundar a temática das mostras colaborando para a formação da cinefilia do público jovem.
O Cinema da Universidade de São Paulo (CINUSP “Paulo Emílio”), órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, e o Centro Cultural São Paulo apresentam retrospectiva integral dos longas-metragens de Robert Bresson, cineasta francês entre os mais importantes nomes do cinema. Juntamente à mostra de filmes, editamos este presente catálogo, o primeiro volume da Coleção CINUSP, que visa aprofundar a temática das mostras colaborando para a formação da cinefilia do público jovem.
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sível, são concretos, corpóreos. <strong>Bresson</strong> transforma fumaça em pedra.<br />
Não haveria divisão teórica entre mundos que nos separaria de um<br />
mundo “mais real”: Joana d’Arc que o diga; Jacques que o diga. <strong>Bresson</strong><br />
coloca o romântico em posição de potência, coloca o abismo não<br />
como queda, mas como ascensão. Uma mistura paradoxal, o espiritual<br />
impregnado na concretude das coisas: transcendência imanente.<br />
Há, portanto, um interesse pela aporia, permitindo um jogo<br />
lúdico e humorado com abertura jamais vista em <strong>Bresson</strong> até então.<br />
Chega a impressionar a ida de Marthe com sua mãe ao cinema. O pastiche<br />
“teatral” (para usar a terminologia bressoniana quando se refere<br />
ao cinema de atores profissionais), o sangue que escorre nas vielas do<br />
filme gangster é de uma ironia explícita que raramente é vista na obra<br />
do cineasta. Mas <strong>Bresson</strong> não mantém apenas esta camada risível de<br />
sentido, pois a ironia também existe quanto à própria situação em que<br />
Marthe se encontra (o homem atingido pelos tiros antes de seu suspiro<br />
final tem forças ainda para olhar a fotografia de sua amada), isso<br />
a revolta, pois se vê refletida na cena patética: uma armadilha, cochicha<br />
para a mãe. Há uma espécie de labirinto no qual as personagens<br />
apaixonadas se perdem, o amor as condena. Nesse sentido Marthe e<br />
Jacques são românticos, ainda que não tenham a força mítica de uma<br />
Joana d’Arc (e fica aqui um paralelo possível, que Quatro noites de<br />
um sonhador seja um salto extemporâneo desse mito para os corpos<br />
jovens do século XX): o mundo lhes arma um complô. Seja a pré-estréia,<br />
sejam as moças, sejam as canções. <strong>Bresson</strong> dá graça a este estado,<br />
mas como tudo é múltiplo e ambíguo, o riso não toma apenas partido<br />
do cômico, mas reitera também que neste estado febril tudo fere. Passamos<br />
do riso à ferida, ou melhor, não passamos, pois ambos estão<br />
integrados na mesma realidade, no reino múltiplo bressoniano que<br />
novamente se revela um só.<br />
O suspiro que passa a ser um romance<br />
Outro estranhamento é a quantidade de músicas que <strong>Bresson</strong><br />
utiliza, e ainda mais, a harmonia com a qual se portam. <strong>Bresson</strong><br />
é aquele que anotara: nada de música de modo algum 4 . Não esta-<br />
4<br />
Notas sobre o cinematógrafo, <strong>Robert</strong> <strong>Bresson</strong> (Iluminuras, São Paulo, 2005).<br />
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