Dezembro2016
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
O que é então esta janela de que vos falo? É um<br />
modelo para descrever a capacidade de pensar o<br />
que está dentro e fora de nós. Um pensar aberto<br />
a ver e mostrar-se ao outro. A possibilidade de<br />
podermos pensar, perceber e representar a nossa<br />
realidade interna, aquilo que sentimos<br />
por alguém, o que esperamos do outro, o<br />
que nos assusta, o que nos satisfaz, os<br />
nossos desejos e o que nos faz sonhar.<br />
Da mesma forma, é importante poder<br />
olhar para fora e ver quem é o outro e, se<br />
nos pode ou quer dar o que precisamos,<br />
mas sobretudo o que queremos dar,<br />
cuidar, apoiar e alimentar. O resultado é<br />
uma alegre e íntima partilha, se o outro<br />
estiver em sintonia connosco. Só assim<br />
podemos encarar o compromisso, a<br />
cumplicidade e o respeito que uma<br />
relação adulta implica. Quando a janela<br />
só faz de espelho, queremos receber<br />
aquilo por que ansiamos, e não<br />
conseguimos ver o outro, depois surgem<br />
surpresas desagradáveis. O retorno do<br />
lado de lá também é essencial, senão<br />
corremos o risco de ficar vazios, tristes,<br />
deixarmos de nos apreciar, não pedindo ou<br />
exigindo aquilo de que precisamos. Na comédia<br />
romântica What Women Want, o ator Mel<br />
Gibson faz o papel de um engatatão que vive sob<br />
a forma desta escolha de amor narcísico, na<br />
busca do prazer sem se importar com os outros,<br />
alimentando-se do reflexo no espelho. Após um<br />
acidente bizarro, o personagem acaba adquirir o<br />
poder de ouvir telepaticamente o que pensam as<br />
mulheres de quem está perto fisicamente, sem<br />
estas saberem. Usa este poder para manipular e<br />
roubar as ideias da sua nova chefe,<br />
protagonizada por Helen Hunt, que tinha ficado<br />
com o lugar que ambicionava. O que o<br />
personagem não esperava é começar a perceber o<br />
lugar do outro, e sobretudo a ver esta e outas<br />
mulheres como ela são, para além do que ele<br />
podia anteriormente saber ou imaginar. É<br />
evidente que a história à boa maneira americana<br />
se desenrola até um happy end, mas o que este<br />
filme ilustra de forma muito divertida, é<br />
justamente a passagem de um amor egoísta para<br />
um amor altruísta. O amor por outra pessoa não<br />
serve apenas para que ela desempenhe um papel<br />
junto de nós, mas é um fim em si mesmo. É dar<br />
sem pensar no que se recebe. Contudo, não<br />
queremos menosprezar a importância de ser<br />
amado de volta, senão seriamos nós os<br />
explorados. Se quer escolher bem o seu amor,<br />
não se procure nele, arrisque descobrir o que é<br />
diferente de si, mas que a queira a si, partilhando<br />
o mesmo caminho. Na vida como no amor<br />
saudável, é na ligação com o diferente que se<br />
fecunda, dando nascimento aos bebés, aos<br />
pensamentos criadores, à novidade e à<br />
esperança, à cultura e à civilização!<br />
Dezembro CONSCIENTE 77