A hermenêutica do sujeito - OUSE SABER!
A hermenêutica do sujeito - OUSE SABER!
A hermenêutica do sujeito - OUSE SABER!
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
50 A HERMEmUTlCA DO SUJEITO<br />
sabe qual é o objeto <strong>do</strong> bom governo e é por isto que deve<br />
ocupar-se consigo mesmo.<br />
Vemos então duas questões surgirem neste momento,<br />
duas questões a serem resolvidas e que estão diretamente<br />
vinculadas uma à outra. A necessidade de ocupar-se consigo<br />
coloca a seguinte questão: qual é pois o eu de que é preciso<br />
cuidar quan<strong>do</strong> se diz que é preciso cuidar de si? Remeto-os<br />
a uma passagem muito importante, que comentarei<br />
mais longamente na próxima vez. O diálogo Alcibíades traz<br />
como subtítulo, que foi porém tardiamente acrescenta<strong>do</strong> -<br />
acho que na época alexandrina, não estou bem certo, verificarei<br />
depois -: da natureza humana". Ora, no desenvolvimento<br />
de toda a última parte <strong>do</strong> texto - desenvolvimento que começa<br />
na passagem que indiquei -, vemos que a questão que<br />
Sócrates coloca e tenta resolver não é: deves ocupar-te contigo;<br />
ora, tu és um homem; portanto, pergunto, o que é um<br />
homem? A questão colocada por Sócrates, muito mais precisa,<br />
muito mais difícil, muito mais interessante, é a seguinte:<br />
deves ocupar-te contigo; mas o que é este si mesmo (autá<br />
tá auto')26, pois que é contigo mesmo que deves ocupar-te?<br />
Questão que, conseqüentemente, não incide sobre a natureza<br />
<strong>do</strong> homem, mas sobre ° que nós hoje - pois a palavra<br />
não está no texto grego - chamaríamos de questão <strong>do</strong> <strong>sujeito</strong>.<br />
O que é este <strong>sujeito</strong>, que ponto é este em cuja direção<br />
deve orientar-se a atividade reflexiva, a atividade refletida,<br />
esta atividade que retoma <strong>do</strong> indivíduo para ele mesmo? O<br />
que é este eu? Esta, a primeira questão.<br />
Segunda questão a ser também resolvida: de que mo<strong>do</strong><br />
o cuida<strong>do</strong> de si, quan<strong>do</strong> o desenvolvemos como convém,<br />
quan<strong>do</strong> o levamos a sério, pode nos conduzir, e conduzir<br />
Alcibíades ao que ele quer, isto é, a conhecer a tékhne de que<br />
precisa para governar os outros, a arte que lhe permitirá<br />
bem governar? Em suma, o que está em jogo em toda a segunda<br />
parte, neste final <strong>do</strong> diálogo, é a necessidade de fornecer<br />
a este /I si mesmo" - na expressão 11 cuidar de si mesmo"<br />
- uma definição capaz de implicar, abrir ou dar acesso<br />
ao saber necessário para um bom governo. O que está em<br />
AULA DE 6 DE JANEIRO DE 1982 51<br />
jogo no diálogo é, pois: qual o eu de que devo ocupar-me a<br />
fim de poder, como convém, ocupar-me com os outros a<br />
quem devo governar? É este círculo [que vai] <strong>do</strong> eu como objeto<br />
de cuida<strong>do</strong> ao saber <strong>do</strong> governo como governo <strong>do</strong>s outros<br />
que, creio, está no cerne deste final de diálogo. Esta a<br />
questão que, afinal, é porta<strong>do</strong>ra da primeira emergência na<br />
filosofia antiga da questão <strong>do</strong> "cuidar de si mesmo".<br />
Bem, eu lhes agradeço, e na próxima semana então começaremos<br />
também às 9h15. Tentarei terminar esta leitura<br />
<strong>do</strong> diálogo.