12 DOS SERINGUEIROS AUTÔNOMOS - Biblioteca da Floresta

sentido de autonomia, desenvolvido nas circunstâncias, é que lhes
tem permitido sobreviver às oscilações do mercado 13 . Como nunca
recusaram o mercado esses seringueiros libertos desenvolveram
práticas que, talvez, nos permitam vislumbrar outras alternativas
paradigmáticas, até porque portam matrizes de racionalidade outras
que, no entanto, experimentaram durante longos períodos essa
relação tensa e contraditória com a lógica econômica hegemônica.
Relembremos que, talvez, nenhuma sociedade tenha vivido tão
intensa e profundamente sob a 'cultura do mercado' do que a
sociedade acreana, sobretudo durante a Territorialidade Seringalista
(1850/70 a 1912­1920). Foi dessa crise, seria melhor dizer contra sua
crise, que emergiu, desde então, esses que tiveram que ser
previdentes, diversificar sua produção, fazer uso múltiplo dos
recursos naturais, revolucionar as relações de gênero, constituir um
espaço doméstico de reprodução, incorporar a matriz de
racionalidade indígeno­cabocla e, por essa via, se tornaram povos da
floresta.
Desde essa época que se diz que a borracha está em crise.
Todavia, a borracha jamais deixou de ser produzida no Acre. E essa
sobrevivência da produção de borracha, sem dúvida, se deveu ao fato
de uma outra lógica, que não a econômico­mercantil, ter passado a
comandar a produção e a reprodução daquelas relações
socioespaciais. Sem dúvida, das matrizes de racionalidade dos
sertanejos nordestinos, dos caboclos, dos indígenas se forjou uma
relação própria com o espaço que, nas circunstâncias das décadas
1970 e 1980, cobrará seu lugar ao sol, que quer ser vista porque quer
ser reconhecida.
12.3 ­ Os Ocupantes ou O Vazio Demográfico Tem Gente
13 Aliás, ali a lógica do mercado para se impor, com seus critérios de rentabilidade, lucratividade,
competitividade terá, sempre, que partir de uma produtividade maior para compensar as
distâncias. Ou, então, ter uma ‘renda de monopólio’ de um produto, como foi a Hevea
brasiliensis numa determinada conjuntura. Não é sem razão que, nas regiões mais afastadas dos
grandes centros de mercado, o garimpo aparece como atividade ‘racional’, economicamente
falando. Ou, então, atividades que fazem uso extensivo da terra que, por ser mais barata,
‘compensa’ a menor produtividade com o seu uso extensivo /e ou predatório. Assim, se impõe a
racionalidade econômica. Para quem está preocupado com o curto prazo é racional, por exemplo,
queimar floresta, pois, como dissera o Lord Keynnes, no futuro estaremos todos mortos’.