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12 DOS SERINGUEIROS AUTÔNOMOS - Biblioteca da Floresta

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O conhecimento que essas populações forjaram dos seus<br />

espaços ao longo do tempo está inscrito nas suas práticas, são saberes<br />

incorporados, é dizer, estão inscritos nos corpos, nos seus hábitos, nas<br />

suas posturas. Seus saberes não são <strong>da</strong> ordem do dizer; são de ordem<br />

prática; são <strong>da</strong> ordem do fazer. Sendo assim, não estão escritos em<br />

documentos 1 . São, to<strong>da</strong>via, saberes em grande parte exteriorizados<br />

em seu espaço construído, materialização do seu fazer e, assim, parte<br />

de seu habitat.<br />

Essas/aquelas populações que diferentes estudiosos vêm<br />

chamando de seringueir os autônomos, e que eles próprios se dizem<br />

seringueir os libertos, são portadoras desse legado histórico­cultural,<br />

dessas matrizes de racionali<strong>da</strong>de diferencia<strong>da</strong>s que, sob novas<br />

circunstâncias, em novas ocasiões tomarão novos sentidos. Um<br />

componente forte dessas matrizes de racionali<strong>da</strong>de é exatamente a<br />

astúcia, 'arte dos fracos' (de Certeau, 1994), de criar nas<br />

circunstâncias, nas ocasiões. Para isso não há regras ou normas<br />

prévias. É <strong>da</strong> sua natureza a imprevisibili<strong>da</strong>de.<br />

Dissemos acima, quando <strong>da</strong> análise <strong>da</strong> Territoriali<strong>da</strong>de dos<br />

Coronéis de Barranco, que a referência espacial dos patr ões era o<br />

seringal e apontamos que a referência dos seringueiros era a<br />

colocação. Esse binômio seringal­colocação encerra uma identi<strong>da</strong>de<br />

contraditória, assim, socialmente territorializa<strong>da</strong>.<br />

O patrão que tem seu locus de poder no barracão dimensiona<br />

espacialmente o que pretende seja seu, enfim seu poder, nessa<br />

uni<strong>da</strong>de de referência que é o seringal em sua totali<strong>da</strong>de o que<br />

envolve várias colocações. Organizar esse espaço implica uma<br />

logística por meio <strong>da</strong> qual realiza seu poder de ordenar, nos dois<br />

sentidos que a expressão permite aqui, o de por as coisas em ordem,<br />

organizar, e o de man<strong>da</strong>r, de <strong>da</strong>r ordens, ordenar.<br />

1 Pode­se supor que essas operações multiformes e fragmetárias, relativas a ocasiões e a detalhes, insinua<strong>da</strong>s<br />

e escondi<strong>da</strong>s nos aparelhos dos quais são os modos de usar, e, portanto, desprovi<strong>da</strong>s de ideologias ou<br />

instituições próprias, obdecem a regras. Em outras palavras, deve haver uma lógica dessas práticas. Isto<br />

significa voltar ao problema, já antigo, do que é uma arte ou ‘maneira de fazer. Dos gregos a Durkheim,<br />

passando por Kant, uma longa tradição tentou precisar as formali<strong>da</strong>des complexas ( e não de todo se formula<br />

essencialmente em ‘artes de fazer’ isto ou aquilo, isto é, em consumos combinatórios e utilitários. Essas<br />

práticas colocam em jogo uma ratio ‘popular’, uma maneira de pensar investi<strong>da</strong> numa maneiro de agir, uma<br />

arte de combinar indissociável de uma arte de utilizar (Certeau, 19945: 42).

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