Homem em casa vira Maria.pmd - Repositório Institucional da UFSC ...
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Foi após o retorno dos funcionários à <strong>em</strong>presa que o impacto dos últimos acontecimentos se<br />
fez sentir, tendo atingido <strong>em</strong> cheio as relações de trabalho dentro <strong>da</strong> <strong>em</strong>presa e, consequent<strong>em</strong>ente,<br />
as relações sociais fora <strong>da</strong> <strong>em</strong>presa. Todos os depoimentos são unânimes ao mencionar esse momen-<br />
to como marcante na vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> <strong>em</strong>presa.<br />
“Olha, foi a greve mais longa que nós tiv<strong>em</strong>os, eu não sei te dizer, precisar, mas foi uma greve<br />
de praticamente um mês, no final, 86, aí no final pessoas fazendo greve de fome, certo? E foi uma coisa<br />
muito marcante (...) E esse confronto foi pode-se dizer que foi um “divisor de águas” dentro <strong>da</strong><br />
<strong>em</strong>presa.” (Entrevista - <strong>Hom<strong>em</strong></strong> aposentado)<br />
“Bom... aí <strong>em</strong> 88, aconteceu uma greve... que aí... (...) Eu sei que ali aconteceu um divisor de<br />
águas muito grande. Essa greve trouxe com ela essa consequência triste. Ali começou a acabar um<br />
pouco... <strong>da</strong>quela amizade, (...) Por que aí começou, sabe? (...) romperam definitivamente. Gente que<br />
era amigo assim, compadre. Pôxa vi<strong>da</strong>. Eu até hoje, tenho um ou dois aí, não vou citar nomes, não<br />
interessa, que nunca mais falaram comigo, que eram meus amigos. Amigos... (...) que lá na Elase<br />
estavam s<strong>em</strong>pre junto, às vezes jogando bola, contando uma pia<strong>da</strong>, tomando uma cerveja, sabe? E que<br />
nunca mais falaram (...) isso deixou sequelas, deixou cicatrizes na gente. Deixou cicatrizes, sabe? Foi<br />
violento.” (Entrevista - <strong>Hom<strong>em</strong></strong> aposentado)<br />
“Só que aí... voltamos... (<strong>da</strong> greve) o pessoal que estava lá fora voltou... a trabalhar e<br />
começou um período... pior do que quando nós estávamos na greve. Por que quando estava uma turma<br />
lá fora e outra dentro, a coisa foi mais ou menos meio a meio, a gente... não se falava, praticamente,<br />
não se via. Mas desde o momento que terminou a greve, passamos a nos ver e a nos falar, e aí como é<br />
que faz?” (Entrevista - <strong>Hom<strong>em</strong></strong> aposentado)<br />
A relação entre os <strong>em</strong>pregados começou a tornar-se insustentável e mudou de vez o quadro de<br />
“grande família” cultivado anteriormente. Quadro cuja fragili<strong>da</strong>de é exposta quando a filósofa <strong>Maria</strong><br />
Apareci<strong>da</strong> Rhein Schirato, que pesquisa as relações trabalho-<strong>em</strong>pregado, <strong>em</strong> entrevista à Revista<br />
Veja, afirma que<br />
“Empresa não é família. Aliás, não conheço nenhuma família que corte 20% dos seus m<strong>em</strong>bros<br />
quando entra <strong>em</strong> crise. Família divide o bife, põe mais água no feijão e não d<strong>em</strong>ite os filhos.”<br />
(Schirato, Revista Veja, 14 de abril, 1999, pág. 13)<br />
Outra conseqüência dessa greve foi o esvaziamento do sindicato e <strong>da</strong> associação dos <strong>em</strong>prega-<br />
dos. Nenhuma outra greve, depois dessa, conseguiu a adesão significativa de funcionários.<br />
Essa greve foi vista por alguns como, de certa forma, prestando um grande serviço aos propó-<br />
sitos do governo. Um depoimento deu conta de que os períodos de estagnação <strong>da</strong> <strong>em</strong>presa e de<br />
fortalecimento do sindicato foram estratégicos para o governo, porque na hora que ele quis, num só<br />
episódio, provocou a “quebra <strong>da</strong>s pernas de todo mundo” (Depoimento - <strong>Hom<strong>em</strong></strong> <strong>em</strong>pregado), <strong>em</strong>prega-<br />
dos e sindicato. Assim foi percebido esse momento, como de ruptura entre os <strong>em</strong>pregados, entre os<br />
<strong>em</strong>pregados e a <strong>em</strong>presa e entre os <strong>em</strong>pregados e o sindicato. O ambiente de trabalho “era péssimo, era<br />
péssimo.” (Entrevista - <strong>Hom<strong>em</strong></strong> aposentado)<br />
No aspecto <strong>em</strong>ocional, a ruptura significou a percepção de que ali não havia mais “família”.<br />
N<strong>em</strong> “mãe” n<strong>em</strong> “irmãos”.<br />
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