19.07.2013 Views

Eremitismo em Portugal na época Moderna : homens e imagens ...

Eremitismo em Portugal na época Moderna : homens e imagens ...

Eremitismo em Portugal na época Moderna : homens e imagens ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

144 José Adriano de Freitas Carvalho<br />

dos séculos modernos longe de desaparecer – o número de habitantes dos<br />

desertos foi s<strong>em</strong>pre um parvus numerus e, apesar das dificuldades, urge contá-lo<br />

melhor – constituiu ainda uma realidade do seu quotidiano, que, como tantas<br />

outras desses t<strong>em</strong>pos – a literatura.., as artes..., as ciências..., as leis..., as<br />

filosofias... – , foi vista pelo caleidoscópio dessa idade de ouro que foi a cultura<br />

dos Antigos – gentios ou cristãos – muito especialmente, no campo cultural que<br />

aqui nos interessa, pelas vidas dos Padres do Ermo... Deixando outros autores,<br />

S. Jerónimo, er<strong>em</strong>ita escrevendo sobre outros er<strong>em</strong>itas – não interessa agora a<br />

questão da autoria das «suas» Vitae patrum –, parece um expoente multiplicador<br />

de vidas e <strong>imagens</strong>, constituindo, umas e outras, outras tantas propostas a imitar.<br />

Imagens de <strong>imagens</strong>, como dir-se-ia sugerir<strong>em</strong> as obras de espiritualidade que,<br />

directa ou indirectamente, as focaram. O que, porém, as une, como um<br />

fundamento, é a lição da oposição radical do er<strong>em</strong>ita ao mundo, ao seu mundo,<br />

evident<strong>em</strong>ente, mas cujos traços do desenho se multiplicam ad infinitum<br />

fazendo-nos esquecer essa lição, quando não tratá-la no <strong>na</strong> moldura dos loci<br />

communes... E essa lição, repetida ad <strong>na</strong>useam, percorre a literatura e arte de<br />

espiritualidade – porque reservar essa qualificação ape<strong>na</strong>s para a literatura? –<br />

desses t<strong>em</strong>pos, sublinhando, <strong>em</strong> apoio mútuo, o ermo quer como um antegozo –<br />

os loca amoe<strong>na</strong> favoreciam-no 303 – quer como uma preparação – os penitentes<br />

dos desertos pintados ou esculpidos mostravam-no – da vida celeste. S.<br />

Jerónimo dixit 304 ... Como tantas outras, uma lição reforçada, evident<strong>em</strong>ente,<br />

depois de Trento, esse concílio que, segundo uma Santa Teresa, orde<strong>na</strong>ra<br />

«reducir a las ordenes los ermitaños» 305 . O aparente desaparecimento do er<strong>em</strong>ita<br />

poderá, assim, resultar quer das leis eclesiásticas – a célebre Constituição<br />

Lubricum (17.11.1568) de Pio V 306 – quer da «repressão» que, ao amparo dessas<br />

leis, os poderes reais, algumas vezes, exerciam sobre os er<strong>em</strong>itas que não se<br />

reduziam a uma ord<strong>em</strong> religiosa aprovada 307 , quer ainda da definição das sua<br />

própria identidade. Eles são, por definição, uma realidade separada e<br />

303<br />

Como será fácil verificar, nos casos que ficaram registados, predomi<strong>na</strong>m, com notável diferença,<br />

os loca amoe<strong>na</strong> frente aos loca sylvestres, s<strong>em</strong> que, por isso, nos esqueçamos de quanto o deserto<br />

áspero e rude pesava <strong>na</strong> proposta pictórica – e, logo, <strong>na</strong>s sua leituras –, como sugere, por ex<strong>em</strong>plo, o<br />

«S. Francisco recebendo as chagas» de Givanni Bellini <strong>em</strong> que o Monte Alverne, <strong>em</strong> contraste com<br />

a realidade, está dado como um rude deserto, como, aliás, assi<strong>na</strong>la Daniel RUSSO, S. Jérôme en<br />

Italie..., ed. cit., 241, ainda que, talvez, conviria matizar tudo quanto o autor diz sobre franciscanos<br />

observantes e jerónimos.<br />

304<br />

S. JERÓNIMO, Cartas..., (ad Heliodorum mo<strong>na</strong>chum, 10), ed. cit., I, 81-82.<br />

305<br />

TERESA DE JESÚS, Fundaciones, 17, 8 in Obras completas..., ed. cit., 542.<br />

306<br />

Ildefonso MORIONES, A<strong>na</strong> de Jesus y la herencia teresia<strong>na</strong>, e. cit., 43 aponta essa Constituição<br />

de Pio V como fundamento da decisão de alguns er<strong>em</strong>itas de El Tardón se decidir<strong>em</strong> «reduzir» ao<br />

Carmelo que Santa Teresa estava fundando por esses dias.<br />

307<br />

Rafael de HARO SERRANO, <strong>na</strong> sua Introducción a Ex<strong>em</strong>plo de Solitarios..., ed. cit., 23 refere a<br />

repressão de Filipe II contra os er<strong>em</strong>itas de Navarra, esses que estão <strong>na</strong> orig<strong>em</strong> das Constituciones..<br />

sobre a reforma dos er<strong>em</strong>itas <strong>na</strong>varros (Ms. 5/785 da B. N. Madrid) a que já fiz<strong>em</strong>os referência.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!