DONATELLO GRIECOHeitor Villa-Lobos contagiou-se, nas Alterosas, com a música popularainda de essência colonial, mas já tão brasileira na tonalidade tropical, tocadapela melancolia dos longuíssimos crepúsculos, na saudade do mar, nas sortesde São João, nas antífonas dos ofícios divinos.Na formação de Villa-Lobos, esses quatro anos são uma etapa decisivae acompanhá-lo-ão por toda a existência. Heitor, familiarizado com a músicaboêmia das noites cariocas, já sabe anotar os sons.1 8 9 9Volta ao Rio de Janeiro. Morre Raul, aos 37 anos. Noêmia, em dificuldadefinanceiras, vê-se obrigada a atividades penosas, lavando e engomando parafora.Em Vila Isabel, na casa-colégio de Alberto Brandão, educador fluminense,de Vassouras, cuja filha Gaby se casaria com o romancista Coelho Netto,Heitor não apenas ouve as conversas de professores e especialistas emetnologia e folclore, como também anota os cantos de trovadores e seresteiros.Daí por diante jamais perderá contato com a música. “Meu primeiro tratadode harmonia foi o mapa do Brasil”, diria Villa-Lobos.Heitor frequentará por alguns meses o curso de humanidades do Mosteirode São Bento.Villa-Lobos conservaria por toda a sua vida a lembrança dessas conversasde “gente grande”, que para ele foram como aulas de folclore, em casa deAlberto Brandão: Couto de Magalhães, Barbosa Rodrigues, Melo MoraisFilho e Sílvio Romero poderiam constituir uma escola superior de estudos deetnografia brasileira.Couto de Magalhães foi como o iniciador dos estudos do folclore noBrasil e seu livro O Selvagem, lançado em 1876, permaneceu esgotado até,1913, sendo a sua última edição 1935: lamentável esquecimento dosresponsáveis pela preservação da memória nacional.Barbosa Rodrigues, botânico dos mais ilustres, também se dedicou àetnografia: sua Poranduba Amazonense, publicada nos Anais da BibliotecaNacional (Rio de Janeiro, 1890) é um monumento que mereceria reediçãopermanente.Melo Morais Filho deixou em seu livro Festas e Tradições Popularesdo Brasil (1901) todo um vasto acervo coligido com exação e alta dignidadeintelectual.14
<strong>ROTEIRO</strong> <strong>DE</strong> <strong>VILLA</strong>-<strong>LOBOS</strong>Quanto a Sílvio Romero, seus Cantos populares do Brasil (1882) eseus Contos populares do Brasil (1883) constituem obra pioneira de fixaçãodefinitiva sobre os aspectos da alma criadora da nossa gente humilde. Custaa crer ainda hoje que a História da Literatura Brasileira de Silvio Romerotenha, após sua primeira edição em 1888, ficado esquecida dos editoresdurante longos anos!Ouvindo as conversas desses mestres, Villa-Lobos não deixaria de, asua maneira, frequentar uma verdadeira escola, onde os ensinamentostransmitidos em forma de palestra se incorporaram para sempre à inteligênciado jovem carioca. E com que emoção não teria ele harmonizado cantos elendas dos livros desses ilustres pesquisadores.*Os primeiros beneditinos chegaram ao Rio de Janeiro em 1560, mas datade 1590 a doação que lhes fizeram os beneméritos fidalgos Manoel de BritoLacerda e seu filho Diogo, do monte em que seria construída, primeiro, a ermidade Nossa Senhora da Conceição, depois Nossa Senhora de Monserrate.A igreja, Abacial, majestosa nas suas dimensões e preciosa nas suasextraordinárias obras de talha dourada, tinha, em 1899, quando o meninoHeitor Villa-Lobos começou a estudar português, francês e latim com osmonges do Santo Padre Bento, o mesmo esplendor barroco que hoje nosmaravilha, com os dois enormes lampadários de prata esculpidos por MestreValentim e a admirável imagem do Salvador de autoria de Frei Ricardo doPilar, talvez o primeiro quadro pintado no Brasil.Esse pequeno universo barroco deve ter deslumbrado o menino Heitor,que na grande nave de ouro participou obrigatoriamente dos ofícios em queo cantochão reboava sob as arcadas e por entre as grades de jacarandá,tudo muito piedosamente enriquecido pelos tocheiros, os retábulos e overdadeiro tesouro que é a Capela do Santíssimo.Heitor, vindo do Catete, subiria ao Mosteiro, onde funcionavam as classesde Humanidades, usando a grande escada de pedra coberta de velhas árvores.Nesse tempo, a “ladeira” que hoje leva à Rua Dom Gerardo ainda era territórioproibido aos alunos: era na ladeira que se ajustavam contas entre os alunosbrigões, fora do alcance da vigilância dos monges.O menino Heitor guardou, assim, desde muito cedo, em sua sensibilidade,os ritmos austeros do cantochão no ambiente barroco do Mosteiro e conservouna memória alguma coisa do latim que, durante toda a sua vida, haveria deutilizar em algumas composições.15
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