Esquadrinhan<strong>do</strong> o céu, a vista atormentadaPela sombria <strong>do</strong>r das quimeras ausentes.O grilo, ao fun<strong>do</strong> de uma frincha solitária,Ven<strong>do</strong>-os passar, uma outra vez canta sua ária;Cibele, que os a<strong>do</strong>ra, o verde faz crescer,Rebenta as fontes e de flor enche o desertoAnte esses que aí vão, deixan<strong>do</strong>-lhes abertoO império familiar das trevas por nascer.O HOMEM E O MARHomem liberto, hás de estar sempre aos pés <strong>do</strong> mar!O mar é teu espelho; a tua alma apreciasNo infinito ir e vir de suas ondas frias,E nem teu ser é menos acre ao se abismar.Apraz-te mergulhar bem fun<strong>do</strong> em tua imagem;Em teus braços a estreitas, e teu coraçãoÀs vezes se distrai na própria pulsaçãoAo rumor dessa queixa indômita e selvagem.Sois to<strong>do</strong>s esses deuses turvos e discretos:Homem, ninguém son<strong>do</strong>u-te as furnas mais estranhas;Ó mar, ninguém tocou-te as íntimas entranhas,Tão ciumento que sois de vossos bens secretos!E todavia há séculos inumeráveisCombatíeis sem nenhum remorso nem piedade,Tamanho amor guardais à morte e à crueldade,Ó meus irmãos, ó gladia<strong>do</strong>res implacáveis!DOM JUAN NOS INFERNOSQuan<strong>do</strong> <strong>do</strong>m Juan desceu ao subterrâneo rioE logo que a Caronte o óbolo pagou,Como Antístenes, um mendigo de olhar frioCom braço vingativo os remos agarrou.Os seios fláci<strong>do</strong>s e as vestes entreabertas,Mulheres se torciam sob um céu nevoento,E, qual rebanho vil de vítimas ofertas,Atrás dele rosnava em atroz lamento.Sganarello a rir a paga reclama,Enquanto, erguen<strong>do</strong> o de<strong>do</strong>, apontava <strong>do</strong>m LuísA cada morto que nas margens deambulavaO filho audaz que lhe ultrajara a fronte gris.Em seu álgi<strong>do</strong> luto, Elvira, casta e esguia,Junto ao pérfi<strong>do</strong> esposo, amante seu de outrora,Parecia exigir-lhe uma última alegriaCujo sabor não recordasse o fel de agora.Ereto na couraça, um homem pétreo e imenso
Golpeava a onda noturna e ao leme as mãos prendia;Mas o tranqüilo herói, por sobre a espada penso,Olhava a água passar e em torno nada via.CASTIGO DO ORGULHONos esplêndi<strong>do</strong>s tempos em que a TeologiaViçava no apogeu da seiva e da energia,Conta-se que um <strong>do</strong>utor, dentre os mais eminentes,Após <strong>do</strong>brar os corações indiferentes,Os arrojou nas mais escuras profundezas;Após franquear às celestiais e altas grandezasCaminhos dele próprio até desconheci<strong>do</strong>s,Só pelas almas puras talvez percorri<strong>do</strong>s,Como quem alto foi demais, cheio de pânico,Gritou, possuí<strong>do</strong> então de um orgulho satânico:"Jesus, ó meu Jesus! Te ergui à etérea altura!Mas se, ao contrário, eu te golpeasse na armadura,Tua vergonha igualaria atua glória,E não serias mais que um feto sem história!"Sua razão de pronto a pó se reduziu.A flama deste sol de negro se tingiu;O caos se lhe instalou então na inteligência,Templo antes vivo, pleno de ordem e opulência,Sob cujos tetos tanto fausto resplendiaE nele floresceram a noite e a agonia,Qual numa furna cuja boca jaz selada.Desde então semelhante aos animais da estrada,Quan<strong>do</strong> ia ao campo sem saber sequer quem era,Sem distinguir entre o verão e a primavera,Imun<strong>do</strong>, ocioso e feio como coisa usada,Fazia riso e a diversão da meninada.A BELEZAEu sou bela, ó mortais! Como um sonho de pedra,E meu seio, onde to<strong>do</strong>s vêm buscar a <strong>do</strong>r,É feito para ao poeta inspirar esse amorMu<strong>do</strong> e eterno que no ermo da matéria medra.No azul, qual uma esfinge, eu reino indecifrada;Conjugo o alvor <strong>do</strong> cisne a um coração de neve;Odeio o movimento e a linha que o descreve,E nunca choro nem jamais sorrio a nada.Os poetas, diante de meus gestos de eloqüência,Aos das estátuas mais altivas semelhantes,Terminarão seus dias sob o pó da ciência;Pois que disponho, para tais dóceis amantes,De um puro espelho que idealiza a realidade:O olhar, meu largo olhar de eterna claridade!
- Page 2 and 3: As Flores do MalCharles BaudelaireA
- Page 4 and 5: Sobre ele pousarei a tíbia e férr
- Page 6 and 7: Exibiam a origem de uma nobre linha
- Page 8 and 9: A MUSA VENALÓ musa de minha alma,
- Page 12 and 13: O IDEALJamais serão essas vinhetas
- Page 14 and 15: Se teu olhar, teu riso, teus pés m
- Page 16 and 17: Obra de algum obi, o Fausto da sava
- Page 18 and 19: Ou grãos que em rítmica cadência
- Page 20 and 21: nessas noites sem fim em que nos fo
- Page 22 and 23: Onde o Destino um dia me esqueceu;O
- Page 24 and 25: TODA ELAO Demônio em meu quarto sa
- Page 26 and 27: Sobre Paris em calma fluía.E junto
- Page 28 and 29: Serei teu ataúde, amável pestilê
- Page 30 and 31: Eu te quero contar, lânguida feiti
- Page 32 and 33: A esta alma que o tormento assola,C
- Page 34 and 35: Bem longe do prazer mundano e do de
- Page 36 and 37: LOUVORES À MINHA FRANCISCAVersos c
- Page 38 and 39: SONETO DE OUTONOO teu olhar me diz,
- Page 40 and 41: Escalo o dorso aos vagalhões entre
- Page 42 and 43: SPLEENPluviôse, contra toda a cida
- Page 44 and 45: Mas eis que as trevas afinal são c
- Page 46 and 47: IUma Idéia, uma Forma, um SerVindo
- Page 48 and 49: Repuxos no jardim chorando entre al
- Page 50 and 51: Jóias que valem bem poucoQue eu ne
- Page 52 and 53: E discutindo com meu espírito lass
- Page 54 and 55: São mistério, a esplender de inve
- Page 56 and 57: Um relâmpago e após a noite! - A
- Page 58 and 59: Deles, a maior parte jamais conhece
- Page 60 and 61:
Cheirais a Morte, ó Esqueletos per
- Page 62 and 63:
A minha alma, melhor que na morna e
- Page 64 and 65:
E a alma grave do corpo imitava a p
- Page 66 and 67:
E para o ódio afogar e embalar o
- Page 68 and 69:
Hoje o espaço é de luzes cheio!Se
- Page 70 and 71:
Seus sentidos doentes de tédio,Tin
- Page 72 and 73:
O vinho aguça o olhar e torna a au
- Page 74 and 75:
Mas logo a bordejar o litoral a les
- Page 76 and 77:
A crápula, a ulular, da guarda e d
- Page 78 and 79:
Tem piedade, Satã, desta longa mis
- Page 80 and 81:
Que como um elixir nos transporta e
- Page 82 and 83:
Íamos a seguir, pelo ritmo da vaga
- Page 84 and 85:
VE após, e após enfim?VI"Cérebro
- Page 86 and 87:
Irias ler-me por engano,Ou me teria
- Page 88 and 89:
Que apenas me amas com pavor,Nos ab
- Page 90 and 91:
Palavra! E sobre mim, num calafrio,
- Page 92 and 93:
Dos distantes confins das montanhas
- Page 94 and 95:
Volúpia, abre-me a tua teia,Toma o
- Page 96 and 97:
Tal como Pafos as estrelas te vener
- Page 98 and 99:
Punha-se à espera de uma doce reco
- Page 100 and 101:
Cumpri vosso destino, almas desorde
- Page 102 and 103:
E do alto do divã, imersa em paz,
- Page 104 and 105:
É qual chuva incessanteDe agudas d
- Page 106 and 107:
ISei que não és, minha querida,O
- Page 108 and 109:
Ele é um satírico, um bufão,Mas
- Page 110 and 111:
"Onde é que vês esse demiurgo da
- Page 112 and 113:
Como lamentarias os teus ócios fra
- Page 114:
UMA TASCA DIVERTIDANA ESTRADA DE BR