13.07.2015 Views

As Flores do Mal - Charles Baudelaire

As Flores do Mal - Charles Baudelaire

As Flores do Mal - Charles Baudelaire

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

E discutin<strong>do</strong> com meu espírito lasso,Pela viela a vibrar <strong>do</strong>s graves carroções.De repente um ancião cujas pobres sacolasImitavam a cor de um céu a tempestear,A cujo aspecto só choveriam esmolas,Se não fosse o rancor que ardia em seu olhar,Surgiu ten<strong>do</strong> no fel suas pupilas molhadas;Enquanto aguça a neve, a das noites mais rudas,A sua barba imensa, esquia como espadas,Projetava-se assim como a barba de Judas.Não era curvo mas alquebra<strong>do</strong>, a sua espinhaDava com sua perna exato ângulo reto,Tanto que seu bastão, que o seu cariz sublinha,Ia-lhe dan<strong>do</strong> o ar, como o passo incorreto,De um mórbi<strong>do</strong> muar, de um judeu de três patas.Metias os membros seus na nevada e no lo<strong>do</strong>,Como quem está a pisar mortos com as sapatas,Lançan<strong>do</strong> ao universo o arreganho <strong>do</strong> apô<strong>do</strong>.Vinha outro: barba, olhar, costas, bastão, molambos,Eram em tu<strong>do</strong> iguais, <strong>do</strong> mesmo inferno oriun<strong>do</strong>s,Centenários os <strong>do</strong>is, visões barrocas ambos,Iam com passo igual a misteriosos mun<strong>do</strong>s.Tinha eu diante <strong>do</strong> olhar um enre<strong>do</strong> poluto,Ou era a humilhação de um acaso perverso?Sete vezes contei, de minuto em minuto,A multiplicação e velho tão diverso.Aquele que se ri dessa minha inquietude,Que não se vê prender de um frêmito fraterno,Pense bem que, apesar desta decrepitude,Estes monstros fatais tinham um ar eterno!Teria posto o olhar num oitavo avantesma,Sem morrer, a este sósia, irônico e fatal,Fênix tremenda, mãe e filha de si mesma?- Mas as costas voltei ao cortejo infernal.Bêba<strong>do</strong> que vê <strong>do</strong>is, assim exaspera<strong>do</strong>,Voltei, fechei a porta e de susto transi<strong>do</strong>,Frio e enfermo, febril o espírito turba<strong>do</strong>,Pelo mistério e pelo absur<strong>do</strong> malferi<strong>do</strong>!Minha razão embalde ansiou suster-se à barra;A borrasca anulou meu empeno ao jogar,E minha alma dançava assim como gabarraSem mastros, por monstruoso e por infin<strong>do</strong> mar.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!