E a alma grave <strong>do</strong> corpo imitava a porfiaDa luta que travava a lâmpada com o dia.Como um rosto a chorar e que à brisa se enxuga,Havia o tremor no ar <strong>do</strong>s objetos na fuga,Lasso era o homem de ler como a mulher de amar.<strong>As</strong> mansardas além pareciam fumar.<strong>As</strong> mulheres <strong>do</strong> amor com seu olhar febrilDormiam a roncar o seu sono imbecil;<strong>As</strong> pobres, arrastan<strong>do</strong> os seios frios, magros,Sopravam seus tições e seus de<strong>do</strong>s amargos.Era a hora em que, no frio e miserável quarto,Se acrescentava a <strong>do</strong>r das mulheres no parto;Um soluço corta<strong>do</strong> e por sangue espumoso,Cantava o galo ao longe, a ferir o ar brumoso;A névoa - um vasto mar - banhava os edifíciosE os homens, a morrer no fun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s hospícios,Davam seu estertor, mas em soluços falhos;Voltavam os rufiões, roí<strong>do</strong>s de trabalhos.A aurora, tiritan<strong>do</strong> em seu vesti<strong>do</strong> aberto,Ia lenta a avançar sobre o Sena deserto,E os olhos esfregan<strong>do</strong>, o sombrio ParisApanha a ferramenta, operário feliz.O VinhoA ALMA DO VINHOCantava a alma <strong>do</strong> vinho à tarde nas botelhas:"Homem, eu ergo a ti, que és deserda<strong>do</strong> e triste,De minha prisão vítrea e de ceras vermelhas,Um canto fraternal que só de luz consiste!Sei de quanto precisa a colina acendidaDe amargura, de suor e <strong>do</strong> sol mais ardentePara que esta alma seja e que eu palpite em vida;Mas eu nunca serei ingrato ou inclemente,Sempre sinto prazer imenso quan<strong>do</strong> desçoUma garganta humana usada de refregas,Sempre um cáli<strong>do</strong> peito é um sepulcro sem preçoEm que eu vivo melhor que nas frias adegas.Ouves <strong>do</strong>minicais refrões bem como a GraçaDa esperança que vibra em meu seio fremente?
Apóia as mãos à mesa, as mangas arregaça,Glorifica-me após e serás mais contente.Acenderei o olhar de tua bem-querida;Ao teu filho darei os músculos e as cores,Serei para este fraco atleta desta vidaÓleo a robustecer bíceps de luta<strong>do</strong>res.Eu tombarei em ti, vegetal ambrósia,Precioso grão que atira o eterno Semea<strong>do</strong>r,Para que nosso amor desemprenhe a Poesia,Brotan<strong>do</strong> para Deus como uma rara flor!"O VINHO DOS TRAPEIROSMuita vez ao rubor de um revérbero e a um vento,Que à chama sempre é um golpe e o cristal um tormento,Bem num velho arrabalde, amargo labirintoDe humanidade a arder em fermentos de instinto,Há o trapeiro que vem moven<strong>do</strong> a fronte inquieta,Nos muros a apoiar-se e como faz um poeta,E sem se incomodar com os guardas descui<strong>do</strong>sos,Abre o seu coração em projetos gloriosos.Ei-lo posto a jurar, ditan<strong>do</strong> lei sublime,Exaltan<strong>do</strong> a virtude, abomina<strong>do</strong> o crime,E sob o firmamento - um pálio de esplen<strong>do</strong>r -Embriagar-se à luz de seu próprio valor.Estes, que a vida em casa enche de desenganos,Roí<strong>do</strong>s pelo trabalho e as tormentas <strong>do</strong>s anos,Derrea<strong>do</strong>s sob montões de detritos hostis,Confuso material que vomita Paria,Voltam, cheios de o<strong>do</strong>r de pipas e barrancos,E seguem-nos os que a vida tornou tão brancos,Bigodes a tombar como velhos pendões;Os arcos triunfais, as flores, os clarõesSe erguem diante <strong>do</strong> olhar, ó solene magia!E na ensurdece<strong>do</strong>ra e luminosa orgiaDo clarim e <strong>do</strong> sol, <strong>do</strong> grito e <strong>do</strong> tambor,Eles trazem a glória ao povo ébrio de amor!E assim é que através desse terrestre solo,O vinho é ouro a rolar, fascinante Pactolo;Pela garganta humana ele canta os seus feitosE reina por seus <strong>do</strong>ns como os reis mais perfeitos.
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Sobre ele pousarei a tíbia e férr
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A MUSA VENALÓ musa de minha alma,
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Esquadrinhando o céu, a vista ator
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O IDEALJamais serão essas vinhetas
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UMA TASCA DIVERTIDANA ESTRADA DE BR