Ou grãos que em rítmica cadência alguém agitaE à joeira deixa novamente.<strong>As</strong> formas fluíam como um sonho além da vista,Um frouxo esboço em agonia,Sobre a tela esquecida, e que conclui o artistaApenas de memória um dia.Por trás das rochas, irrequieta, uma cadelaEm nós fixava o olho zanga<strong>do</strong>,Aguardan<strong>do</strong> o momento de reaver àquelaCarniça abjeta o seu boca<strong>do</strong>.- Pois há de ser como essa coisa apodrecida,Essa me<strong>do</strong>nha corrupção,Estrela de meus olhos, sol da minha vida,Tu, meu anjo e minha paixão!Sim! Tal serás um dia, ó deusa da beleza,Após a bênção derradeira,Quan<strong>do</strong>, sob a erva e as florações da natureza,Tornares afinal à poeira.Então, querida, dize à carne que se arruína,Ao verme que te beija o rosto,Que eu preservarei a forma e a substância divinaDe meu amor já decomposto!DE PROFUNDIS CLAMAVIImploro-te piedade,a Ti, razão de amor,Do fun<strong>do</strong> abismo onde minha alma jaz sepulta.É uma cálida terra em plúmbea névoa oculta,Onde nadam na noite a blasfêmia e o terror;Por seis meses um morno sol dissolve a bruma,E durante outros seis a noite cobre o solo;É um país bem mais nu <strong>do</strong> que o desnu<strong>do</strong> pólo- Nem bestas, nem regatos, nem floresta alguma!Não há no mun<strong>do</strong> horror que comparar se possaÀ luz perversa desse sol que o gelo acossaE à noite imensa que no velho Caos se abriu;Invejo a sorte <strong>do</strong> animal mais vil,Capaz de mergulhar num sono que o enregela,Enquanto o Dédalo <strong>do</strong> tempo se enovela.O VAMPIROTu que, como uma punhalada,Em meu coração penetrasteTu que, qual furiosa manadaDe demônios, ardente, ousaste,De meu espírito humilha<strong>do</strong>,
Fazer teu leito e possessão- Infame à qual estou ata<strong>do</strong>Como o galé ao seu grilhão,Como ao baralho ao joga<strong>do</strong>r,Como à carniça o parasita,Como à garrafa o bebe<strong>do</strong>r- <strong>Mal</strong>dita sejas tu, maldita!Supliquei ao gládio velozQue a liberdade me alcançasse,E ao vento, pérfi<strong>do</strong> algoz,Que a covardia me amparasse.Ai de mim! Com mofa e desdém,Ambos me disseram então:"Digno não és de que ninguémJamais te arranque à escravidão,Imbecil! - se de teu retiroTe libertássemos um dia,Teu beijo ressuscitariaO cadáver de teu vampiro!"Certa noite bem junto a uma horrenda judia,Como ao longo de um morto outro morto estendi<strong>do</strong>,Pus-me a pensar ao pé deste corpo vendi<strong>do</strong>Na beleza infeliz que aos olhos me fugia.Eu lhe evocava a esplêndida altivez nativa,O olhar de intensa luz e de graças arma<strong>do</strong>,O cabelo a servir-lhe de elmo perfuma<strong>do</strong>E cuja súbita lembrança o amor se aviva.Pois com fervor teu nobre corpo eu beijariaE <strong>do</strong>s réus frescos pés às tuas negras trançasAbriria o tesouro das carícias mansas,Se uma noite, ao rolar de uma lágrima esguia,Pudesses, tu, que apenas esse fel destilas,Ofuscar o esplen<strong>do</strong>r de tuas frias pupilas.REMORSO PÓSTUMOQuan<strong>do</strong> fores <strong>do</strong>rmir, ó bela tenebrosa,Em teu negro e marmóreo mausoléu, e nãoTiveres por alcova e refúgio senãoUma cova deserta e uma tumba chuvosa;Quan<strong>do</strong> a pedra, a oprimir tua carne medrosaE teus flancos sensuais de lânguida exaustão,Impedir de querer e arfar teu coração,E teus pés de correr por trilha aventurosa,O túmulo, no qual em sonho me aban<strong>do</strong>no- Porque o túmulo sempre há de entender o poeta -,
- Page 2 and 3: As Flores do MalCharles BaudelaireA
- Page 4 and 5: Sobre ele pousarei a tíbia e férr
- Page 6 and 7: Exibiam a origem de uma nobre linha
- Page 8 and 9: A MUSA VENALÓ musa de minha alma,
- Page 10 and 11: Esquadrinhando o céu, a vista ator
- Page 12 and 13: O IDEALJamais serão essas vinhetas
- Page 14 and 15: Se teu olhar, teu riso, teus pés m
- Page 16 and 17: Obra de algum obi, o Fausto da sava
- Page 20 and 21: nessas noites sem fim em que nos fo
- Page 22 and 23: Onde o Destino um dia me esqueceu;O
- Page 24 and 25: TODA ELAO Demônio em meu quarto sa
- Page 26 and 27: Sobre Paris em calma fluía.E junto
- Page 28 and 29: Serei teu ataúde, amável pestilê
- Page 30 and 31: Eu te quero contar, lânguida feiti
- Page 32 and 33: A esta alma que o tormento assola,C
- Page 34 and 35: Bem longe do prazer mundano e do de
- Page 36 and 37: LOUVORES À MINHA FRANCISCAVersos c
- Page 38 and 39: SONETO DE OUTONOO teu olhar me diz,
- Page 40 and 41: Escalo o dorso aos vagalhões entre
- Page 42 and 43: SPLEENPluviôse, contra toda a cida
- Page 44 and 45: Mas eis que as trevas afinal são c
- Page 46 and 47: IUma Idéia, uma Forma, um SerVindo
- Page 48 and 49: Repuxos no jardim chorando entre al
- Page 50 and 51: Jóias que valem bem poucoQue eu ne
- Page 52 and 53: E discutindo com meu espírito lass
- Page 54 and 55: São mistério, a esplender de inve
- Page 56 and 57: Um relâmpago e após a noite! - A
- Page 58 and 59: Deles, a maior parte jamais conhece
- Page 60 and 61: Cheirais a Morte, ó Esqueletos per
- Page 62 and 63: A minha alma, melhor que na morna e
- Page 64 and 65: E a alma grave do corpo imitava a p
- Page 66 and 67: E para o ódio afogar e embalar o
- Page 68 and 69:
Hoje o espaço é de luzes cheio!Se
- Page 70 and 71:
Seus sentidos doentes de tédio,Tin
- Page 72 and 73:
O vinho aguça o olhar e torna a au
- Page 74 and 75:
Mas logo a bordejar o litoral a les
- Page 76 and 77:
A crápula, a ulular, da guarda e d
- Page 78 and 79:
Tem piedade, Satã, desta longa mis
- Page 80 and 81:
Que como um elixir nos transporta e
- Page 82 and 83:
Íamos a seguir, pelo ritmo da vaga
- Page 84 and 85:
VE após, e após enfim?VI"Cérebro
- Page 86 and 87:
Irias ler-me por engano,Ou me teria
- Page 88 and 89:
Que apenas me amas com pavor,Nos ab
- Page 90 and 91:
Palavra! E sobre mim, num calafrio,
- Page 92 and 93:
Dos distantes confins das montanhas
- Page 94 and 95:
Volúpia, abre-me a tua teia,Toma o
- Page 96 and 97:
Tal como Pafos as estrelas te vener
- Page 98 and 99:
Punha-se à espera de uma doce reco
- Page 100 and 101:
Cumpri vosso destino, almas desorde
- Page 102 and 103:
E do alto do divã, imersa em paz,
- Page 104 and 105:
É qual chuva incessanteDe agudas d
- Page 106 and 107:
ISei que não és, minha querida,O
- Page 108 and 109:
Ele é um satírico, um bufão,Mas
- Page 110 and 111:
"Onde é que vês esse demiurgo da
- Page 112 and 113:
Como lamentarias os teus ócios fra
- Page 114:
UMA TASCA DIVERTIDANA ESTRADA DE BR