13.07.2015 Views

As Flores do Mal - Charles Baudelaire

As Flores do Mal - Charles Baudelaire

As Flores do Mal - Charles Baudelaire

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Como a esqualo a <strong>do</strong>rmir no pélago profun<strong>do</strong>.Odeio o testamento e a tumba me nauseia;Ao invés de implorar uma lágrima ao mun<strong>do</strong>,Prefiro em vida dar aos corvos como ceiaOs trapos que me pendem <strong>do</strong> esqueleto imun<strong>do</strong>.Ó vermes! Vós a que não chegam luz ou ruí<strong>do</strong>,Eis que vos toca um morto alegre e destemi<strong>do</strong>;Filhos da podridão, demiurgos <strong>do</strong> artifício,Vinde pois sem remorso ungir-me os membros tortos,E dizei-me depois se resta algum suplícioA este corpo sem alma e morto dentre os mortos!TONEL DO ÓDIOO Ódio é o tonel das pálidas Denaides frias;Por mais que da Vingança o braço rubro e forteDerrame-lhe às entranhas ermas e sombriasBaldes cheios de sangue e lágrimas da morte,O Diabo lhe abre furos nunca imagina<strong>do</strong>s,Que verteriam séculos de esforço e suor,Mesmo que à vida ela trouxesse os condena<strong>do</strong>sPara o corpo infligir-lhes castigo maior.O Ódio é um ébrio perdi<strong>do</strong> ao fun<strong>do</strong> da taverna,Que sente sua sede emergir <strong>do</strong> licorE ali multiplicar-se qual hidra de Lerna.- Mas quem bebe feliz verá seu vence<strong>do</strong>r,E ao Ódio resta apenas a amarga certezaDe saber que jamais <strong>do</strong>rmirá sob a mesa.O SINO RACHADOÉ <strong>do</strong>ce e amargo, quan<strong>do</strong> a neve cai lá fora,Ouvir, ao pé <strong>do</strong> fogo que crepita e esfuma,Aflorar lentamente as lembranças de outroraAo som <strong>do</strong>s carrilhões que ressoam na bruma.Bendito o sino de garganta vigorosaQue, apesar da velhice, alerta e bem disposto,Fielmente emite sua nota religiosa,Como um velho solda<strong>do</strong> atento no seu posto.Minha alma está rachada, e quan<strong>do</strong>, em agonia,Quer povoar de canções o azul da noite fria,Ocorre muita vez que a voz se lhe enfraqueceComo o espesso estertor de um corpo que se esquece,Junto a um lago de sangue e de humanos destroços,E que sucumbe, inerte, entre imensos esforços.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!