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— Tenho um desfile no Japão daqui a um mês e meio — disse ela, concordando sobre as<br />
obrigações. — É o tipo de coisa que eu vou, fico três semanas e volto, mas isso atrapalha<br />
totalmente o meu fuso horário. Também amo desfilar, amo essa questão incerta de em qual lugar<br />
vou estar e qual será o próximo país a visitar, mas também odeio. Faz sentido?<br />
— Sinto a mesma coisa. Existe sempre a parte que amamos no que fazemos e também a parte<br />
que odiamos. — Fiz uma pausa, tomando um gole do coquetel azul. — <strong>Você</strong> sente que não<br />
pertence a lugar nenhum?<br />
— Para ser bem sincera, no apartamento no qual moro, nem parece que uma garota vive lá.<br />
Não guardo nada pessoal porque sinto que aquilo só serve para quando estou nos Estados Unidos<br />
— desabafou, atenta aos meus olhos. — É <strong>com</strong>o se não tivesse nenhuma parte minha em Miami.<br />
Como se eu tivesse minhas moléculas dispersas. A única pessoa que sente a minha falta quando<br />
estou fora é a Lua.<br />
Eu conhecia um pouco a história da Erin. Seus pais não gostaram muito da ideia de ela ser<br />
modelo e, naquela época, quando eu namorava a Lua, ela já desfilava em alguns lugares e fazia<br />
sessões fotográficas escondida. Sabia disso tudo porque Lua sempre morreu de amores por sua<br />
melhor amiga e é natural uma se tornar o assunto da outra.<br />
— E os seus pais?<br />
— Eles estão morando em Veneza agora. — Ela preferiu não aprofundar o assunto. — E você?<br />
Seu pai sempre foi um querido, não é?<br />
Minha mãe faleceu após um súbito derrame quando eu era apenas um garoto. As memórias<br />
sobre ela são tão escassas quanto lembranças de sonhos antigos. Mas não posso reclamar: meu<br />
velho é um ótimo homem e, desde o dia em que disse que queria mergulhar de cabeça na música,<br />
ele viu o meu talento e alugou um estúdio na cidade por um dia, contraindo dívidas para contratar<br />
músicos para me auxiliarem <strong>com</strong> a criação de canções e <strong>com</strong> o aperfeiçoamento da minha voz.<br />
Quando conheci Zane, ele já tocava guitarra e se dispôs a montar uma banda <strong>com</strong>igo. Yan foi<br />
consequência da amizade antiga entre os dois e isso acabou nos tornando os The M’s. Garotos de<br />
Miami que correram atrás de um sonho: a música.<br />
— Meu velho sempre foi muito querido — eu disse. — Ele está bem. Pescando e cuidando da<br />
loja de materiais.<br />
— Ele ainda tem aquela loja?<br />
— Tem. Está até grande, sabia? Mesmo que ele não aceite um centavo meu para investir.<br />
— Ele é orgulhoso. Um bom homem, <strong>com</strong> certeza.<br />
— Sim, certamente.<br />
— Pessoal, o dever me chama — Zane falou, olhando para uma morena de olhos negros que<br />
estava praticamente salivando por ele. — Encontro vocês daqui a uma hora.<br />
Fiquei boquiaberto porque eu sequer me lembrava que estava na presença deles. Yan e Lua<br />
estavam abraçados e conversando baixinho, totalmente alheios à minha conversa <strong>com</strong> Erin, mas,<br />
ainda sim, era <strong>com</strong>o se estivéssemos a sós.<br />
— Não se esqueça de voltar — disse Erin, ralhando <strong>com</strong> ele.