A dança da mente : Pina Bausch e psicanálise - pucrs
A dança da mente : Pina Bausch e psicanálise - pucrs
A dança da mente : Pina Bausch e psicanálise - pucrs
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
51<br />
Maria Tereza Furtado Travi<br />
sujeito que não detém total conhecimento de si, portador de uma ver<strong>da</strong>de<br />
inacaba<strong>da</strong>. Freud e <strong>Pina</strong> consideravam o ser humano como resultado de<br />
múltiplas experiências e sentimentos, conscientes ou não. Segundo Carla<br />
Lima (2008, p. 41), “o sujeito cartesiano é também produtor de ideias cujo<br />
sentido é inequívoco e seguro...”. Ou seja, é um sujeito de certeza.<br />
A Psicanálise, enquanto saber que postula a existência de um<br />
sujeito do inconsciente, traz-nos a ideia de que não temos total controle<br />
do que pensamos e sentimos. Esse é o sujeito <strong>da</strong> dúvi<strong>da</strong>, em permanente<br />
transformação. E é esse o sujeito convocado por <strong>Bausch</strong>, o qual “na<strong>da</strong> no<br />
lago obscuro de um saber que não se sabe” (LIMA, 2008, p. 72). É nesse<br />
lugar do não saber que <strong>Pina</strong> busca suas inspirações; no lugar do esquecido,<br />
do recalcado, do jogado fora do saber consciente.<br />
Ain<strong>da</strong> sobre o sujeito comum à Psicanálise e à <strong><strong>da</strong>nça</strong>-teatro de<br />
<strong>Bausch</strong>, é importante salientar que o mesmo é considerado como resultado<br />
do meio onde nasce, cresce e vive. Todos nós nascemos já inseridos em<br />
uma ordem simbólica que antecede a nossa chega<strong>da</strong>. Ordem essa que já<br />
cria meios e possibili<strong>da</strong>des para a nossa inserção. Desse modo, o sujeito<br />
nasce e cresce assujeitado ao contexto. Logo, sua formação, seus valores<br />
e experiências terão sempre uma estreita ligação com tudo que o cerca.<br />
Segundo Kazuo Ohno, um dos criadores <strong>da</strong> <strong><strong>da</strong>nça</strong> Butoh, “nós carregamos<br />
os mortos em nossas costas e eles nos guiam” (LIMA, 2008, p. 83). Somos<br />
então um paradoxo, portador do passado e do futuro ao mesmo tempo.<br />
Com base nas características desse sujeito, a <strong><strong>da</strong>nça</strong>-teatro de<br />
<strong>Bausch</strong> é chama<strong>da</strong> de um fazer do meio, pois considera o antes, o durante<br />
e o depois; passado, presente e futuro. A meu ver, é possível dizer que o<br />
mesmo faz a Psicanálise. O paciente é analisado levando em conta todo o<br />
caminho percorrido até então, onde ele está hoje e para onde quer ir.<br />
A <strong><strong>da</strong>nça</strong>, enquanto arte, pode ser um meio de expressão dessas<br />
experiências e sentimentos do sujeito. Laban afirmou que:<br />
o homem se movimenta a fim de satisfazer uma<br />
necessi<strong>da</strong>de. Com sua movimentação tem por objetivo<br />
atingir algo que lhe é valioso. Entretanto, há também<br />
valores intangíveis que inspiram os movimentos<br />
(ALMEIDA, 2009, p. 20).<br />
<strong>Pina</strong>, assim como a Psicanálise, buscava “extrair” do sujeito esses<br />
sentimentos inconscientes, aquelas emoções que residem na falha <strong>da</strong><br />
consciência. Para conseguir tal tarefa árdua e dolorosa, a coreógrafa, como