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STORYTELLER<br />
Cinematic/iStock<br />
Incrível! Fantástico!<br />
Extraordinário!<br />
Para <strong>de</strong>scobrir que nada muda, basta<br />
se dar ao trabalho <strong>de</strong> conhecer a história<br />
LuLa Vieira<br />
Antes <strong>de</strong> mais nada, me permita explicar<br />
que o título <strong>de</strong>ste artigo é <strong>de</strong> um programa<br />
da década <strong>de</strong> 1950 na Rádio Nacional<br />
do Rio <strong>de</strong> Janeiro, escrito por Almirante (a<br />
mais alta patente do rádio), que registrava<br />
as coisas inacreditáveis que o chamado<br />
mundo mo<strong>de</strong>rno propiciava. Coisas, no linguajar<br />
da época, “do arco da velha”, cujo<br />
significado eu conheço, mas não tenho a<br />
menor i<strong>de</strong>ia da origem, assim como “do<br />
cabo <strong>de</strong> esquadra”, que significa a mesma<br />
coisa: sinistro. Que hoje não significa mais<br />
sinistro, mas quer dizer... poooorra! É que<br />
para preparar um material para uma aula<br />
fui consultar velhos números da revista<br />
Propaganda, lançada em 1956. Encontrei<br />
maravilhas.<br />
Exemplo? Uma coluna assinada por<br />
Francisco da Silva Júnior, que ocupava generosas<br />
páginas duplas com as novida<strong>de</strong>s<br />
do mundo da comunicação. Do primeiro<br />
volume da coleção, isto é, dos primeiros<br />
números da revista e, portanto, da primeira<br />
dúzia <strong>de</strong> artigos do colega Francisco Silva<br />
Júnior, colhi algumas novida<strong>de</strong>s realmente<br />
extraordinárias. No número <strong>de</strong> maio <strong>de</strong><br />
1957, a coluna registra a existência <strong>de</strong> um<br />
novo profissional nas agências dos Estados<br />
Unidos, que já possuíam um corpo <strong>de</strong><br />
advogados para prevenir contra <strong>de</strong>mandas<br />
<strong>de</strong> clientes a respeito <strong>de</strong> promessas da<br />
propaganda. São os “peritos em questões<br />
raciais”, que, cobrando algo em torno <strong>de</strong><br />
US$ 100 por dia, oferecem conselhos para<br />
que nos anúncios não surjam cenas <strong>de</strong> preconceitos<br />
explícitos, capazes <strong>de</strong> provocar a<br />
ira <strong>de</strong> minorias. Vejam só. Em junho, há a<br />
reprodução <strong>de</strong> um artigo da British Export<br />
Gazette informando que a Minhoca Escocesa<br />
é consi<strong>de</strong>rada a melhor isca para peixes<br />
no mercado americano. Mercado gigantesco,<br />
pois consome 25 milhões <strong>de</strong> minhocas<br />
por ano. O primeiro lote importado <strong>de</strong>ssas<br />
superminhocas escocesas foi <strong>de</strong> 10 milhões<br />
<strong>de</strong> exemplares. Elas me<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 20 cm a 25<br />
cm e chegam vivas nos EUA em recipientes<br />
especiais e com temperatura controlada.<br />
Já era um início do orgânico que neguinho<br />
hoje acha a maior novida<strong>de</strong>.<br />
E veja como as coisas mudam: num levantamento<br />
do mercado americano <strong>de</strong> propaganda,<br />
estimado em US$ 10 bilhões, em<br />
1955 a maior parcela ficou com anúncios<br />
em jornais. Depois as revistas. Em seguida<br />
veio a mala direta, e os veículos especiais<br />
que distribuem cupons. Na rabeira, o rádio<br />
e a mídia externa. Televisão? Nem se falou<br />
nisso. E agora uma novida<strong>de</strong>: Mr. Robert F.<br />
Boomer, da Missão Econômica Americana,<br />
afirma que as empresas <strong>de</strong> seu país só não<br />
investem mais no Brasil porque a situação<br />
econômica é incerta. Como as coisas mudam,<br />
não é? Mu<strong>de</strong>mos <strong>de</strong> colunista. Domingos<br />
<strong>de</strong> Grossi, outro observador, informa<br />
que o governo do Estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
vai proibir uso <strong>de</strong> carteirinhas <strong>de</strong> fósforo<br />
como publicida<strong>de</strong>. A razão é perfeita: estavam<br />
sendo usadas como troco, <strong>de</strong>svirtuando<br />
sua finalida<strong>de</strong> promocional. Pena que<br />
não conste o nome do parlamentar que teve<br />
a i<strong>de</strong>ia da lei, para <strong>de</strong>vido registro.<br />
Voltemos ao Francisco. O cara é muito<br />
bom! Informa que o lançamento da TV em<br />
cores nos Estados Unidos provocou crise<br />
no varejo americano. Depois <strong>de</strong> muita negociação,<br />
os fabricantes estão aceitando a<br />
<strong>de</strong>volução dos estoques <strong>de</strong> aparelhos monocromáticos.<br />
Em março, a revista informa<br />
que a Suécia proibiu a propaganda <strong>de</strong> bebida<br />
alcoólica em cartazes, tabuletas, outdoors,<br />
rádio e televisão. E os governadores<br />
dos estados <strong>de</strong> Nebrasca e Iowa reuniram<br />
os pecuaristas <strong>de</strong> seus territórios para dar<br />
publicida<strong>de</strong> ao consumo <strong>de</strong> carne bovina,<br />
que está <strong>de</strong>caindo nos EUA. Ainda na revista<br />
<strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1956, uma gran<strong>de</strong> reportagem<br />
sobre a história do Dia das Mães, cuja<br />
origem é americana, <strong>de</strong> 1907, e chegou no<br />
Brasil em 1948.<br />
A matéria serve como um <strong>de</strong>sabafo para<br />
os irmãos Fernando e Rogério Severino,<br />
que, trabalhando na Standard Propaganda,<br />
criadora <strong>de</strong> uma campanha para popularizar<br />
o Dia das Mães no Brasil, foram<br />
acusados <strong>de</strong> estarem fazendo uma grossa<br />
picaretagem, ou seja, transformar em consumo<br />
o mais puro dos amores. Já que falei<br />
em carne, <strong>de</strong>staco um anúncio da Revista<br />
Gran<strong>de</strong> Hotel, dirigido aos frigoríficos do<br />
Brasil, afirmando que ela, a Gran<strong>de</strong> Hotel,<br />
é o melhor veículo para ven<strong>de</strong>r produtos<br />
enlatados. Simplesmente porque é o veículo<br />
que fala às “verda<strong>de</strong>iras donas <strong>de</strong> casa”.<br />
Para <strong>de</strong>scobrir que nada muda, basta se dar<br />
ao trabalho <strong>de</strong> conhecer a história. Novos<br />
tempos... bah!<br />
Lula Vieira é publicitário, diretor da<br />
Mesa Consultoria <strong>de</strong> Comunicação,<br />
radialista, escritor, editor e professor<br />
lulavieira@grupomesa.com.br<br />
46 <strong>17</strong> <strong>de</strong> <strong>julho</strong> <strong>de</strong> 20<strong>17</strong> - jornal propmark