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AdventO
Dia 6
Viver – essa difícil alegria. Viver é jogo, é risco. Quem joga pode ganhar ou perder. O
começo da sabedoria consiste em aceitarmos que perder também faz parte do jogo. Quando
isso acontece, ganhamos alguma coisa extremamente preciosa: ganhamos nossa possibilidade
de ganhar. Se sei perder, sei ganhar. Se não sei perder, não ganho nada, e terei
sempre as mãos vazias. Quem não sabe perder acumula ferrugem nos olhos e se torna
cego – cego de rancor. Quando a gente chega a aceitar, com verdadeira e profunda humildade,
as regras do jogo existencial, viver se torna mais que bom – se torna fascinante.
Viver bem é consumir-se, é queimar os carvões do tempo que nos constitui. Somos
feitos de tempo, e isto significa: somos passagem, movimento sem trégua, finitude. A
cota de eternidade que nos cabe está encravada no tempo. É preciso garimpá-lo, com
incessante coragem, para que o gosto do seu ouro possa fulgir em nosso lábio. Se assim
acontecer, somos alegres e bons, e a vida tem sentido.
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A coisa mais importante do mundo é a possibilidade de ser-com-o-outro, na calma,
cálida e intensa mutualidade do amor. O Outro é o que importa, antes e acima de tudo.
Por mediação dele, na medida em que recebo sua graça, conquisto para mim a graça
de existir. É esta a fonte da verdadeira generosidade e do autêntico entusiasmo – Deus
comigo. O amor ao Outro me leva à intuição do todo e me compele à luta pela justiça e
pela transformação do mundo.
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Dai-me, Senhor, o lábio puro,
E a mão mais pura do que o lábio.
Dai-me, Senhor, a pupila da pomba,
E o pé mais sábio do que esta pupila.
Pois com o lábio roçarei a pele do mundo,
E com a mão me sentirei parente da pedra,
E com a pupila verei a dança das palmas ao vento,
E com o pé saberei o vasto rumor dos caminhos.
Hélio Pellegrino (1924-1988). Lucidez embriagada. São Paulo: Planeta, 2004. p. 44-47.
Grupo Marista 37