30.07.2020 Views

Colecão 2020

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Natal

Dia 41

Penso que, fundamentalmente, o religioso e o espiritual não se confundem.

Eles certamente podem, num indivíduo, num grupo, se conciliar por

um tempo. Mas o religioso, como sabemos, pode associar-se a tudo, ao fetichismo,

ao ritual, à credulidade, e por vezes misturar-se a eles, ao fanatismo

também, e pode, então, sufocar o espiritual. [...]

Aquilo que pertence ao domínio do espiritual é sempre livre, sutil, imperceptível.

Isso é consciente? Não creio. O que temos em nós de espiritual

nunca pode ser dito, tampouco sabido. Pode coexistir com comportamentos

fracos, delinquentes ou marginais, ou estar adaptado a um conformismo

ambiente. [...] O que é espiritual não é testável – nenhum calibre, nenhum

medidor, nenhuma tabela pode confirmar sua presença.

Conheci seres espirituais. A experiência que se pode ter com eles é íntima.

As palavras para relatá-la podem nada evocar de espiritual para quem

as ouve. Tudo depende da experiência íntima de quem fala e de quem escuta.

O homem espiritual, por sua presença, por suas proposições, por suas

atenções, difunde uma alegria serena nos que dele se aproximam. O espiritual

em uma pessoa é notado por uma qualidade de alegria; é fácil que os

outros não o percebam, que afastem essa aparente fragilidade ou não lhe

deem importância. O homem espiritual pode suscitar incompreensão, ou

até mesmo hostilidade – ele está engajado em sua própria estrada.

Um ser espiritual irradia o amor em que vive e não busca doutrinar,

convencer. Não é nada mais que um outro. Faz o que tem de fazer. É ele

mesmo quase sem se dar conta. Sentimos seus efeitos, mas não podemos

captar nada, nem por suas palavras nem por seu aspecto físico. Pode-se

falar dele, de seu comportamento, mas o que emana de sua pessoa é inexplicável,

pertence ao que há de mais vivo, de mais estimulante. Ele é surpreendente,

até mesmo “chocante”, mas esse choque é revelador de uma

outra coisa que não pode ser explicada – ele está com Deus.

Françoise Dolto (1908-1988). A fé à luz da psicanálise. Entrevista dada a Gérard Sévérin. Campinas-

SP: Verus, 2010. p. 39-40.

c

Grupo Marista 93

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!