O CORPO EO CUIDAR NO FEMININO Maria Fernanda - Repositório ...
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Capítulo III<br />
Construção feminina da noção do corpo e das experiências da gravidez<br />
domínio do homem, dizia respeito à actividade fora do lar. Era ao homem que<br />
competia assegurar o sustento do lar. Era o chefe da "família", detinha o poder<br />
económico. A esfera privada era domínio da mulher. Estava nas suas funções o<br />
cuidar dos filhos, assegurar a sua formação e educação. O seu trabalho limitava-<br />
-se ao doméstico: o arranjo e cuidado dos filhos, do marido e da casa. O único<br />
poder que tinha era o poder doméstico. Nem todas as mulheres conseguiam<br />
cumprir a função de educação e instruir os seus filhos, porque elas mesmas não<br />
foram suficientemente instruídas. O aparecimento da escola, nomeadamente as<br />
escolas femininas, veio de alguma forma substituir a acção que anteriormente<br />
estava entregue às mulheres.<br />
Apesar da mulher ter trabalhado desde sempre na célula familiar, o seu<br />
ingresso no mundo do trabalho tem vindo a afectar preponderantemente a vida<br />
familiar, com rupturas a nível dos comportamentos e práticas sociais<br />
intrafamiliares. A mulher parece não estar disposta a assumir o papel de<br />
submissão decalcado nas mães e avós, recusando, na perspectiva de Rodrigues e<br />
Oliveira (1993:434), uma reprodução do modelo familiar tradicional.<br />
Assim na sociedade moderna, a auto-realização individual tem extrema<br />
importância, onde a carreira e a felicidade dos membros individuais da família<br />
triunfam sobre a continuação da linhagem da mesma. Em contraste, com a<br />
rigorosa segregação de papéis laborais no lar e fora do lar desempenhados pelos<br />
sexos na sociedade tradicional 56 assiste-se a um esbater de fronteiras neste<br />
âmbito, no chamado mundo moderno. Hoje os papéis misturam-se.<br />
Os pais de Sara trabalham, desempenham a mesma profissão - professor,<br />
parecem constituir uma "família simétrica" que "reparte" tarefas:<br />
"Quem tratava de mim era o meu pai, dáva-me banho, depois ela foi trabalhar, foi fazer<br />
o estágio..."<br />
"O meu pai fazia umas coisas para casa, de costura. A minha mãe nunca gostou desse<br />
tipo de trabalhos".<br />
(HiVi:7)<br />
"O meu pai está ligado à arte, fazia coisas manuais, móveis". (HiVi:9)<br />
Para o casal tradicional, os papéis desempenhados pelos sexos eram absolutos e a comunidade<br />
castigava com o ridículo os que tentavam infringi-los. O marido era escarnecido e apelidado de "maricas"<br />
não só pelos seus congéneres, como era alvo de "mofa" pelas próprias mulheres, tal era a influência do<br />
"habitus".<br />
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