As Maluquices do Imperador _NOVA_ - Unama
As Maluquices do Imperador _NOVA_ - Unama
As Maluquices do Imperador _NOVA_ - Unama
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
www.nead.unama.br<br />
No velho Paço, dentro daquele ambiente lúgubre sob o crepitar mortiço <strong>do</strong>s<br />
candelabros de prata, morre o funda<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Império <strong>do</strong> Brasil. Morre, no mesmo<br />
quarto onde nasceu, aquele que desagrilhôo a Terra de Santa Cruz.<br />
Que é que matou D. Pedro I? Tanta coisa...<br />
O moço Bragança repusera a filha no trono de Portugal. Foi a grande epopéia<br />
de sua vida. Foi a sua página belamente heróica. Vitória magnífica, vitória que<br />
custara jorros de sangue, esse triunfo, no entanto, empalidecera logo: os<br />
portugueses tiveram para com D. Pedro IV a mais áspera das ingratidões. Senhor <strong>do</strong><br />
trono, ten<strong>do</strong> já esmaga<strong>do</strong> os seus inimigos, o primeiro ato de D. Pedro assinalou-se<br />
por uma nobreza marcante. Sua Majestade, com largueza magnânima, man<strong>do</strong>u<br />
lavrar <strong>do</strong>is decretos que o nobilitam: concedeu anistia ampla a to<strong>do</strong>s os venci<strong>do</strong>s;<br />
suspendeu o odioso seqüestro, que então se praticava, <strong>do</strong>s bens particulares <strong>do</strong>s<br />
inimigos. Esta generosidade <strong>do</strong> soberano, que diz tão alto <strong>do</strong> seu espírito, irritou os<br />
liberais fanáticos. Os partidários de D. Pedro magoaram-se com tão largo perdão.<br />
Queriam to<strong>do</strong>s a pulverização <strong>do</strong>s miguelistas, vinganças atrozes, desforras de<br />
saciar. O ato <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r acirrou despeitos fun<strong>do</strong>s. E os constitucionais (quase<br />
nem se acredita!) levantaram-se em massa contra o seu grande herói.<br />
Foi no Teatro de S. Carlos. D. Pedro, apesar de <strong>do</strong>ente, timbrara em assistir<br />
ao espetáculo de gala. Torrenciosa multidão de exaspera<strong>do</strong>s atulhava o Rocio. A<br />
carruagem real, tirada a quatro, varou por aquela onda formigante. Nisto, em meio<br />
da turba, irrompeu uma assuada tremenda... Era a vaia! Uma vaia estrondejante,<br />
arrasa<strong>do</strong>ra. Sob os gritos, debaixo de assobios, as vidraças <strong>do</strong> coche espatifaram-se<br />
de súbito: a multidão apedrejava o seu í<strong>do</strong>lo! D. Pedro sentiu nos cochins da<br />
carruagem, aquela saraivada de pedras e de lama que a população arremetia com<br />
estrépito. O Duque de Bragança indignou-se! Mas não era homem para recuar. D.<br />
Pedro nunca recuou na vida. E gritou para o cocheiro:<br />
— Toque!<br />
O cocheiro tocou. Os cavalos romperam fogosamente pela massa. D. Pedro<br />
saltou no teatro. Entrou impavidamente. Mas quan<strong>do</strong>, no camarim real, Sua<br />
Majestade, páli<strong>do</strong> e ofegante, apareceu diante daquela assistência bravia, irrompeu<br />
de todas as bocas, novamente, assusta<strong>do</strong>ramente, uma vaia mais cruel, mais<br />
fragorosa. D. Pedro, os olhos chispantes, não pôde se conter. E gago de cólera:<br />
— Canalhas!<br />
A multidão, ouvin<strong>do</strong> o apo<strong>do</strong>, prorrompeu em uivos. E foi, pelo teatro<br />
abarrota<strong>do</strong>, uma atoarda só:<br />
— Fora! Fora!<br />
Sobre o camarim real, por acinte, chovem patacos, moedinhas de prata,<br />
vinténs, to<strong>do</strong> o achincalhamento. D. Pedro, de pé, extremamente páli<strong>do</strong>, treme... E eis<br />
que, num momento, o Impera<strong>do</strong>r sente qualquer coisa de estranho, qualquer coisa de<br />
quente subir-lhe a garganta. Leva rapidamente o lenço à boca. E o povo, que o pateia,<br />
vê, com assombro, um jacto vermelho borbotar na boca <strong>do</strong> Impera<strong>do</strong>r... É uma<br />
* * *<br />
103