As Maluquices do Imperador _NOVA_ - Unama
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Diziam os coevos, até (aonde vai a verdade disso?) que D. Pedro, no furor<br />
sangrento que então o <strong>do</strong>minou, mandara cortar a cabeça <strong>do</strong> cadáver de Ratcliff.<br />
Incumbira-se da monstruosidade o Dr. Francisco Júlio Xavier. E o Impera<strong>do</strong>r, por uma<br />
galantaria fúnebre, mandara o horren<strong>do</strong> mimo à sua Mãe, a Rainha D. Carlota<br />
Joaquina, a fim de saciar-lhe o ódio que tinha ao liberal de 1820. "Esquiros",<br />
pseudônimo <strong>do</strong> Dr. Alfre<strong>do</strong> Moreira Pinto, ilustre biógrafo <strong>do</strong> condena<strong>do</strong>, diz<br />
textualmente: "Seria, porém, o seu corpo entregue à sepultura como os de seus <strong>do</strong>is<br />
companheiros? Não! Infâmia! Ratcliff havia copia<strong>do</strong> em Portugal o decreto de expulsão<br />
da Rainha D. Carlota. E D. Pedro I salgou a cabeça de Ratcliff e remeteu-a à sua Mãe!"<br />
Melo Morais Pai recolheu a mesma tradição e estampou-a sem me<strong>do</strong>, ao<br />
tempo de Pedro II, no seu "Brasil Histórico". É lenda? É verdade? Teria D. Pedro a<br />
coragem dessa barbaridade?<br />
A CEIA DO IMPERADOR<br />
A atriz Lu<strong>do</strong>vina, nessa noite, dava um espetáculo de gala no Teatro S. João.<br />
Era como uma coroa <strong>do</strong>s grandes regozijos públicos <strong>do</strong> dia. O Rio de Janeiro, de<br />
fato, fervilhara de contentamento. <strong>As</strong> fortalezas embandeiraram-se. Foguetes<br />
estrondaram no ar. Charangas por toda parte. Um alvoroço! No Paço de S.<br />
Cristóvão, inquieto e radiante, D. Pedro embriagara-se de felicidade. Fora-lhe o dia<br />
uma apoteose. A grande vitória <strong>do</strong> seu reina<strong>do</strong>. O Paço borborinhara de diplomatas<br />
e de cortesãos. Choveram lisonjas e cumprimentos. E agora, antes <strong>do</strong> espetáculo,<br />
naquele instante de tréguas, o Impera<strong>do</strong>r decidira-se a terminar as suas alegrias<br />
com uma noite foliona. Depois de tanta luta, de tantas negociações diplomáticas, o<br />
coração borboleteante daquele moço pedia um desafogo boêmio. E o Impera<strong>do</strong>r,<br />
abancan<strong>do</strong>-se à secretária negra, tracejou um bilhetinho às pressas. <strong>As</strong>sim:<br />
"Senhora Lu<strong>do</strong>vina:<br />
Esta noite, depois <strong>do</strong> teatro, trate de me esperar. Quero cear com Vmcê. Vou<br />
sozinho.<br />
Impera<strong>do</strong>r".<br />
Borrifou areia no papel e ergueu-se palpitante. Sua Majestade estava<br />
contentíssimo. Que é que aconteceu? Uma notícia alviçareira: nessa manhã,<br />
chegan<strong>do</strong> de Lisboa, uma corveta inglesa trouxera de Portugal o decreto por que D.<br />
João VI reconhecera a Independência <strong>do</strong> Brasil. Não podia haver acontecimento<br />
mais jubiloso. Era um final sereno ao drama brasileiro. E D. Pedro sentia largamente<br />
a felicidade da hora. E na sua felicidade sentia um acutilante anseio por dar largas<br />
àquele gênio estúrdio e <strong>do</strong>udivanas. Sua Majestade bateu palmas. O Chalaça<br />
apareceu. E D. Pedro, entregan<strong>do</strong> o bilhete ao vali<strong>do</strong>:<br />
— Leia!<br />
O Chalaça correu os olhos pelo papel. E com espanto:<br />
— Vossa Majestade vai cear com a Lu<strong>do</strong>vina?<br />
— Vou!<br />
— Eis um perigo, Majestade, tornou o Chalaça, precavi<strong>do</strong>. Eis um perigo! A<br />
Lu<strong>do</strong>vina é casada. É casada e séria. O mari<strong>do</strong> — o Soares da Costa — um homem<br />
de maus bofes. Vossa Majestade se arrisca...<br />
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