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Baixe o PDF do Livro! - Mensagens com Amor

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Sempre que entrevejo uma idéia, uma significação oculta em qualquer objeto,<br />

fico a tal ponto absorto, que sou capaz de passar uma semana sem <strong>com</strong>er. Aqui, há<br />

anos, estan<strong>do</strong> senta<strong>do</strong> à porta de casa, a meditar no célebre axioma <strong>do</strong> Dr.<br />

Pangloss — que os narizes fizeram — se para os óculos, e que é por isso que<br />

usamos óculos, sucedeu cair — me a vista no chão, exatamente no lugar em que<br />

estava uma ferradura velha. Que haveria naquele sapato de cavalo, tão <strong>com</strong>i<strong>do</strong> de<br />

dias e de ferrugem<br />

Pensei muito, — não posso dizer se uma ou duas horas, — até que um clarão<br />

súbito espancou as trevas <strong>do</strong> meu espírito. A figura é velha, mas não tenho tempo<br />

de procurar outra. Cresci diante de Pangloss. O grande filósofo, achan<strong>do</strong> a razão<br />

<strong>do</strong>s narizes, não advertiu que, ainda sem eles, podíamos trazer óculos. Bastava um<br />

pequeno aparelho de barbantes, que fosse por cima das orelhas até à nuca. Outro<br />

era o caso da ferradura. Só o duro casco <strong>do</strong> animal podia destinar-se à ferradura,<br />

uma vez que não há meio de fazê-la aderir sem pregos. Aqui a finalidade era<br />

evidente. De conclusão em conclusão, cheguei às ave-marias, tinham-me já<br />

chama<strong>do</strong> para jantar três vezes; <strong>com</strong>i mal, digeri mal, e acordei <strong>do</strong>ente. Mas tinha<br />

descoberto alguma cousa.<br />

Fica assim explicada a minha longa meditação diante da torre e <strong>do</strong> templo, e<br />

o mais que me aconteceu. Cruzei os braços nas costas, <strong>com</strong> a bengala entre as<br />

mãos, apoian<strong>do</strong>-me nela. Algumas pessoas que iam passan<strong>do</strong>, ao darem <strong>com</strong>igo,<br />

paravam também e buscavam descobrir por si o que é que chamava assim a<br />

atenção de um homem tão grave. Foram-se deixan<strong>do</strong> estar; outras vieram também e<br />

foram fican<strong>do</strong>, até formarem um grupo numeroso, que observava tenazmente<br />

alguma cousa digníssima da atenção <strong>do</strong>s homens. É assim que eu admiro muita<br />

música; basta ver o Artur Napoleão para<strong>do</strong>.<br />

Nem por isso interrompi as reflexões que ia fazen<strong>do</strong>. Sim, aquela junção da<br />

torre e <strong>do</strong> templo não era sòmente uma opinião da irmandade.<br />

Não tenho aqui papel para notar to<strong>do</strong>s os fenômenos históricos, políticos e<br />

sociais que me pareceram explicar o edifício <strong>do</strong> Largo <strong>do</strong> Macha<strong>do</strong>; mas, ainda que<br />

o tivesse de sobra, calar-me-ia pela incerteza em que ainda estou acerca das<br />

minhas conclusões. Dous exemplos estremes bastam para justificação da dúvida. A<br />

nossa independência política, que os poetas e ora<strong>do</strong>res, até 1864, chamavam grito<br />

de Ipiranga, não se pode negar que era um belo templo grego. O trata<strong>do</strong> que veio<br />

depois, <strong>com</strong> algumas de suas cláusulas, e o seu impera<strong>do</strong>r honorário, além <strong>do</strong><br />

efetivo, poderá ser <strong>com</strong>para<strong>do</strong> à torre da matriz da Glória Não ouso afirmá-lo. O<br />

mesmo digo <strong>do</strong> quiosque. O quiosque, apesar da origem chinesa, pode ser<br />

<strong>com</strong>para<strong>do</strong> a um; templo grego, copia<strong>do</strong> de Paris; mas o charuto, o bom café barato<br />

e o bilhete de loteria que ali se vendem, serão acaso equivalentes daquela torre<br />

Não sei; nem também sei se os foguetes que ali estouram, quan<strong>do</strong> anda a roda e<br />

eles tiram prêmios, representam os repiques de sinos em dias de festa. Há<br />

hesitações grandes e nobres, minha pobre alma as conhece.<br />

Pelo que respeita especialmente ao caso da matriz da Glória, concor<strong>do</strong> que<br />

ele exprima a reação <strong>do</strong> sentimento local contra uma inovação apenas elegante.<br />

Nós mamamos ao som <strong>do</strong>s sinos e somos desmama<strong>do</strong>s <strong>com</strong> eles; uma igreja sem<br />

sino é, por assim dizer, uma boca sem fala. Daí nasceu a torre da Glória. A questão<br />

não é achar esta explicação, é <strong>com</strong>pletá-la.<br />

Não me tragam aqui o mestre Spencer <strong>com</strong> os seus aforismos sociológicos.<br />

Quan<strong>do</strong> ele diz que "o esta<strong>do</strong> social é o resulta<strong>do</strong> de todas as ambições, de to<strong>do</strong>s os<br />

interesses pessoais, de to<strong>do</strong>s os me<strong>do</strong>s, venerações, indignações, simpatias, etc.<br />

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