14.11.2012 Views

João Luís Nabo - Index of - Universidade de Évora

João Luís Nabo - Index of - Universidade de Évora

João Luís Nabo - Index of - Universidade de Évora

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

eferindo não haver qualquer possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> distinguir a origem das diferentes vozes que se<br />

entrecruzam num texto. Ao não aceitar a literatura centrada na pessoa do autor, nos seus gostos, nas<br />

suas experiências e paixões, Barthes justifica-se afirmando que o texto não <strong>de</strong>ve ficar limitado pela<br />

tirania do autor e do seu ponto <strong>de</strong> vista. Lançando um violento ataque aos processos <strong>de</strong> crítica literária<br />

centrada no escritor como origem da obra, Barthes reforça a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a explicação da obra não<br />

<strong>de</strong>ve ser procurada em quem a produziu, porque o autor, no caso específico da produção literária,<br />

<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> existir no momento em que começa a escrita: “l’auteur entre dans sa propre mort, l’écriture<br />

commence.” 9 A morte do autor dá origem ao escritor mo<strong>de</strong>rno (scriptor) que nasce no mesmo<br />

momento em que surge o texto. Se, para Barthes, não há autor que pronuncie a palavra, então a voz da<br />

frase não po<strong>de</strong> ser localizada, isto é, po<strong>de</strong> ser lida, mas não se lhe po<strong>de</strong> atribuir uma origem. Então,<br />

para Barthes o verda<strong>de</strong>iro locus da escrita é o da leitura, concluindo este crítico que “la naissance du<br />

lecteur doit se payer <strong>de</strong> la mort <strong>de</strong> l’Auteur.” 10 Em 1967, Jacques Derrida tinha lançado o conceito a<br />

que chamou a “ausência do escritor”. Para este filós<strong>of</strong>o francês, associado ao pós-mo<strong>de</strong>rnismo,<br />

“escrever é retirar-se” 11 . Então, como pergunta Kierkegaard, se “nos nossos dias, em que a sabedoria,<br />

fonte oculta <strong>de</strong> todos os nossos males, consiste em informar-se da mensagem e não do mensageiro,<br />

que é feito do escritor?” 12<br />

Num discurso que permite continuar o <strong>de</strong>bate iniciado pela teoria da morte do autor, <strong>de</strong><br />

Barthes, Michel Foucault, no ensaio O que é um autor? (1979), fala da função do autor, que se<br />

encontra estritamente ligada a um “indivíduo real, po<strong>de</strong>ndo dar lugar a vários ‘eus’ em simultâneo” 13 .<br />

Ao invés <strong>de</strong> anular o autor, Foucault <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> o papel <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados autores, entendidos não só<br />

como produtores das suas obras, mas também como agentes <strong>de</strong> uma atitu<strong>de</strong> “transdiscursiva” 14 , ao<br />

terem produzido, para além das suas próprias obras, “a possibilida<strong>de</strong> e a regra <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> outros<br />

textos” 15 , produzidos por outros autores. Se, com a morte do autor, Barthes vem contrariar um dos<br />

objectivos da nossa investigação – provar a existência <strong>de</strong> um autor cada vez mais vivo e auto-reflexivo<br />

na obra <strong>de</strong> Bret Easton Ellis - a teoria <strong>de</strong> Foucault apresenta-nos já uma possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ligação ao<br />

conceito <strong>de</strong> auto-referencialida<strong>de</strong>, temática que apr<strong>of</strong>undaremos no capítulo a ela <strong>de</strong>dicado.<br />

Procurando provar a existência <strong>de</strong> um paralelismo entre a vida e a obra dos escritores, Javier<br />

Marías escreveu um conjunto <strong>de</strong> pequenas histórias em Written Lives (2006), utilizando escritores<br />

célebres como protagonistas. Este autor espanhol acrescenta mesmo que o perfil dos artistas ficará, <strong>de</strong><br />

certa forma, incompleto, se não for possível juntar à sua vida uma imagem que represente o próprio<br />

9 Ibi<strong>de</strong>m, p. 63.<br />

10 Ibi<strong>de</strong>m, p. 69.<br />

11 Jacques Derrida, A Escritura e a Diferença, p. 61.<br />

12 Søren Kierkegaard, Ponto <strong>de</strong> Vista Explicativo da Minha Obra como Escritor, p. 51.<br />

13 Michel Foucault, O que é um autor?, pp. 56-57.<br />

14 Ibi<strong>de</strong>m, p. 57.<br />

15 Ibi<strong>de</strong>m, p. 58.<br />

13

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!