João LuÃs Nabo - Index of - Universidade de Évora
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Fazendo parte <strong>de</strong> um extenso grupo <strong>de</strong> obras contemporâneas com características comuns, quer<br />
em termos formais quer <strong>de</strong> temática, Lunar Park é uma ficção reflexiva sobre a própria ficção 820 e<br />
assume um estatuto pós-mo<strong>de</strong>rnista na linha <strong>de</strong> obras <strong>de</strong> outros escritores norte-americanos, como<br />
Joan Didion, Stephen King, Don DeLillo, Kurt Vonnegut e Paul Auster. Estes autores consi<strong>de</strong>ram ser<br />
seu objectivo fundamental mostrar através das suas obras o lado negro <strong>de</strong> uma América que, embora<br />
prometendo o paraíso, acaba muitas vezes por <strong>of</strong>erecer um inferno na terra 821 . Fomos, assim, ao<br />
encontro da importância que a consciência colectiva norte-americana tem para com os<br />
comportamentos <strong>de</strong>sviantes dos cidadãos, consequência da sua insanida<strong>de</strong> mental. Essas atitu<strong>de</strong>s, que<br />
<strong>de</strong>safiam as normas sociais e da moral, são condicionadas pelo sentimento <strong>de</strong> culpa, concretizado<br />
através do regresso do reprimido, e que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as teorias <strong>de</strong> Freud, tem contribuido para uma nova<br />
perspectiva daquele mesmo complexo <strong>de</strong> culpa presente nas obras <strong>de</strong> algum modo ligadas ao Gótico<br />
Americano.<br />
A chegada dos Founding Fathers à América, e as consequências religiosas e políticas que daí<br />
advieram, têm produzido na Literatura Norte-Americana interessantes manifestações da perseguição<br />
que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Hawthorne e Poe, a própria História Americana tem imposto a todas as gerações <strong>de</strong><br />
escritores e artistas em geral. A Literatura Gótica Norte-Americana centrou, assim, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os seus<br />
primórdios, o seu interesse nos efeitos psicológicos causados pela dificulda<strong>de</strong> em enfrentar tais novos<br />
terrores, tentando o escritor, através das suas criações, dar expressão aos seus sentimentos <strong>de</strong> medo e<br />
preocupação: “The New American Gothic is said to <strong>de</strong>al in landscapes <strong>of</strong> the mind, settings which are<br />
distorted by the pressure <strong>of</strong> the principal characters’ psychological obsessions.” 822 Representada em<br />
Bateman, personagem repleta <strong>de</strong> fragilida<strong>de</strong>s mas assumindo ser capaz dos actos mais monstruosos, a<br />
banalida<strong>de</strong> do Mal 823 é hoje tão comum em Nova Iorque como o foi nos cenários puritanos da Nova<br />
Inglaterra <strong>de</strong> Nathaniel Hawthorne. O impulso <strong>de</strong>sta personagem para actos con<strong>de</strong>náveis, pela<br />
socieda<strong>de</strong> e pela consciência, remete-nos para a perversida<strong>de</strong> manifestada pelas personagens <strong>de</strong> Poe,<br />
incapazes <strong>de</strong> controlar a sua atracção pelo abismo. Nessa era obscura e <strong>de</strong> terror, as personagens,<br />
perseguidas pela culpabilida<strong>de</strong> e assoladas por um histerismo místico, moviam-se em espaços on<strong>de</strong><br />
forças <strong>de</strong>moníacas as arrastavam irreversivelmente para a perdição. Esta inevitabilida<strong>de</strong> alimenta o<br />
<strong>de</strong>sejo perverso dos autores <strong>de</strong> <strong>de</strong>socultar as mais obscuras facetas da Nação Americana, procurando<br />
gerir os seus infindáveis paradoxos, <strong>de</strong> que são vítimas seres solitários, vulneráveis e divididos, em<br />
incessante luta com os seus fantasmas.<br />
820 Malcom Bradbury, The Mo<strong>de</strong>rn American Novel, p. 259<br />
821 Richard Sam Dimmagio, The tradition <strong>of</strong> the American Gothic Novel, p. 61<br />
822 David Punter, The Literature <strong>of</strong> Terror, p. 3.<br />
823 Hannah Arendt, apud Tom Waters, “Interesting Motherfuckers”, acedido a 25/04/08, em:<br />
http://forbisthemighty.com/acidlogic/im_bret_easton_ellis.htm.<br />
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