João LuÃs Nabo - Index of - Universidade de Évora
João LuÃs Nabo - Index of - Universidade de Évora
João LuÃs Nabo - Index of - Universidade de Évora
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
elação com a família e com a comunida<strong>de</strong>. Daí que Botting sublinhe o papel fundamental <strong>de</strong><br />
Hawthorne na Literatura Gótica Americana referindo que, menos preocupado com a criminalida<strong>de</strong> e<br />
com a psicopatologia individual, o autor parte para o terror presente na família e na socieda<strong>de</strong>, tal<br />
como fez em The Scarlet Letter: “The spectre <strong>of</strong> Puritan intolerance and witchcraft trials hangs over<br />
the community that con<strong>de</strong>mns a young woman, Hester, to wear a large ‘A’ as a mark <strong>of</strong> her<br />
adultery.” 314<br />
Neste romance, o comportamento duplo é claro no reverendo Dimmesdale, o pastor da<br />
comunida<strong>de</strong> puritana, on<strong>de</strong> vive também Hester Prynne. O amante escon<strong>de</strong> <strong>de</strong> todos o seu<br />
relacionamento com Hester, <strong>de</strong>ixando-a exposta perante os outros, que a con<strong>de</strong>nam pelo pecado <strong>de</strong><br />
ambos. Essa duplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comportamentos é notória na impossibilida<strong>de</strong> que Dimmesdale manifesta<br />
<strong>de</strong> gerir os conflitos que o atormentam, provocados pela incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assumir publicamente a<br />
relação pecaminosa com uma mulher casada e <strong>de</strong> quem vem a ter uma filha. O sentimento <strong>de</strong> culpa<br />
afasta-o do caminho da re<strong>de</strong>nção e a mentira sobrepõe-se à verda<strong>de</strong>, porque a cobardia é superior à<br />
coragem. De acordo com Maria Antónia Lima, a personagem protagoniza um comportamento<br />
tipicamente puritano, resultado <strong>de</strong> um conflito “entre soul e self, que gerou uma inquietação e<br />
<strong>de</strong>sespero constantes na psique do indivíduo.” 315 Ao contrário do amante, e <strong>de</strong>safiando o quotidiano<br />
daquela comunida<strong>de</strong>, Hester manteve uma única atitu<strong>de</strong>: a <strong>de</strong> nunca omitir a sua condição <strong>de</strong> adúltera,<br />
bem presente na letra escarlate que a comunida<strong>de</strong> puritana a forçou a ostentar ao peito. Citado por<br />
Richard Chase, D. H. Lawrence acredita que, quando Hawthorne se encontrava a escrever The Scarlet<br />
Letter, estaria a produzir, muito possivelmente <strong>de</strong> forma inconsciente, uma espécie <strong>de</strong> pr<strong>of</strong>ecia “about<br />
the great cultural change involved in the shift from the Old World to the New.” 316 Em Studies in<br />
Classic American Literature (1971), Lawrence manifesta o seu fascínio perante o paradoxo presente<br />
no próprio escritor. Tal como a América puritana, também Hawthorne é <strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />
dupla, sendo um “ blue-eyed darling (…) who knew disagreeable things in his inner soul” 317 ,<br />
assemelhando-se às personagens das suas histórias, perseguidas por indizíveis terrores <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />
religiosa, ligados às pressões sociais persecutórias e castradoras.<br />
A crítica aos comportamentos da socieda<strong>de</strong> do seu tempo está igualmente presente em “The<br />
Minister’s Black Veil” (1837). Embora não apresente a religião Puritana como causa directa <strong>de</strong>sse<br />
comportamento, o autor procura conduzir o leitor a uma reflexão sobre os perigos que ela possa<br />
representar e, especialmente, sobre os motivos que levam os membros <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> a mostrar<br />
uma vivência na qual, paradoxalmente, escon<strong>de</strong>m vícios privados e exibem públicas virtu<strong>de</strong>s. O<br />
enredo manifesta já uma intenção <strong>de</strong> Hawthorne em alertar o leitor para os segredos que cada membro<br />
314 Fred Botting, Gothic, p. 117.<br />
315 Maria Antónia Lima,Terror na Literatura Norte-Americana, Vol. I, p. 104.<br />
316 Apud Richard Chase, The American Novel and Its Tradition, p. 75.<br />
317 D. H. Lawrence, Studies in Classic American Literature, p. 89.<br />
76