João LuÃs Nabo - Index of - Universidade de Évora
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personagem-escritor, conjugação que melhor <strong>de</strong>fine essa auto-referencialida<strong>de</strong>. Tendo origem na<br />
mente do protagonista, este Duplo endógeno, <strong>de</strong> “características positivas” 801 , segundo a perspectiva<br />
<strong>de</strong> Carla Cunha, funciona como sua consciência e é um meio <strong>de</strong> proce<strong>de</strong>r ao que Nathalie Abi-Ezzi<br />
consi<strong>de</strong>ra ser “the externalisation <strong>of</strong> the inner life.” 802 Assim, este novo Duplo vai tentar protegê-lo dos<br />
seus excessos, na tradição <strong>de</strong> “William Wilson” <strong>de</strong> Poe, e ajudá-lo a compreen<strong>de</strong>r as transformações<br />
que se estão a operar na sua vida, e nos objectos do seu quotidiano, com relevo para a casa, espaço que<br />
é também um Duplo da mente <strong>de</strong> “Ellis”: “The writer whispered to me: the house is turning into the<br />
one you grew up in.” 803 A personagem-escritor está constantemente presente na parte final da obra,<br />
acompanhando a <strong>de</strong>gradação da mente do protagonista, altura em que o seu diálogo com “Ellis” se<br />
torna cada vez mais intenso.<br />
As intervenções <strong>de</strong>sta nova personagem começam por ser assertivas, manifestando alguma<br />
compreensão pelo estado cansado <strong>de</strong> “Ellis”, claramente à beira <strong>de</strong> um colapso. No entanto, essa<br />
relação s<strong>of</strong>re uma alteração quando, tal como em “William Wilson”, se dá um total domínio da<br />
personagem-escritor sobre “Ellis”, como se este estivesse a fugir ao pré-estabelecido e tivesse havido<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> introduzir na história alguém que, <strong>de</strong> forma carismática, colaborasse na recuperação da<br />
or<strong>de</strong>m na narrativa. Tal intenção po<strong>de</strong> ser observada neste pequeno excerto, on<strong>de</strong> a<br />
personagem-escritor assume a responsabilida<strong>de</strong> da narrativa: “Look how black the sky is, the writer<br />
said. I ma<strong>de</strong> it that way.” 804 Como conclui Christine Thomas: “He acts at times as a sort <strong>of</strong> ‘blind<br />
gui<strong>de</strong>,’ forcing Ellis the character to notice elements <strong>of</strong> his creation.” 805 Passou, a partir <strong>de</strong> então, a<br />
existir uma entida<strong>de</strong> única, construída a partir <strong>de</strong>stes dois alter-egos <strong>de</strong> Bret Easton Ellis, tendo as<br />
i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> um continuida<strong>de</strong> nas i<strong>de</strong>ias do outro, não se sabendo claramente quem diz o quê. Exemplo<br />
disso é a parte final do capítulo vinte e nove, em que se dá a fusão <strong>de</strong> três Duplos <strong>de</strong> Ellis: “Ellis”,<br />
Clayton e a personagem-escritor, como po<strong>de</strong>mos concluir <strong>de</strong>sta explicação dada por um “Ellis” à beira<br />
<strong>de</strong> um colapso: “Because Clayton was – and had always been – someone I had known. He was<br />
somebody who had always known me. He was somebody who had always known us. Because Clayton<br />
and I were always the same person.” 806 Po<strong>de</strong>mos, assim, chegar a uma conclusão: se “Ellis” e Clayton<br />
foram sempre a mesma pessoa, <strong>de</strong>duzimos que, com a utilização do pronome pessoal forma <strong>de</strong><br />
complemento, us, referente a “Ellis” e à personagem-escritor, está criado o espaço <strong>de</strong> fusão dos três<br />
801 Carla Cunha, “E-Dicionário <strong>de</strong> Termos Literários”, coord. <strong>de</strong> Carlos Ceia, acedido em 20/10/07, em<br />
http://www.fcsh.unl.pt/edtl.<br />
802 Nathalie Abi-Ezzi, The Double in the Fiction <strong>of</strong> R. L. Stevenson, Wilkie Collins and Daphne du Maurier, p. 21.<br />
803 Bret Easton Ellis, Lunar Park, p. 206.<br />
804 Ibi<strong>de</strong>m, p. 216.<br />
805<br />
Christine Thomas, “Ellis writes himself into suburbs”, acedido em 25/04/08, em: http://www.sfgate.com/cgibin/article.cgi?f=/chronicle/reviews/books/LUNAR_PARK.DTL.<br />
806 Bret Easton Ellis, Lunar Park, p. 295.<br />
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